No Chile, a direita não aceita os avanços

Em minoria na Constituinte, conservadores rejeitam os direitos sociais aprovados para a nova Carta, que substitui aquela imposta pela ditadura Pinochet

 

O processo político do Chile continua a ensinar como a velha direita não aceita avanços, mesmo quando é a democracia que aponta os rumos, com a maioria ditando o caminho para a Nação. A direita sinalizou que não vai aceitar o novo texto constitucional que está emergindo da Assembléia Constituinte. O texto final está ainda em fase de ajuste e a proposta será apresentada oficialmente em 4 de julho.

A nova Carta Magna do Chile substitui a Constituição pinochetista e inclui direitos sociais como saúde pública e universal, educação gratuita e de qualidade e melhores aposentadorias para os trabalhadores. Pois os principais partidos da tradicional direita chilena anunciaram que vão rejeitar no plebiscito de 4 de setembro a nova Carta. 

A Renovacão Nacional (RN), a União Democrática Independente (UDI) e a Evópoli, que formaram a coalizão com a qual o direitista Sebastián Piñera governou em seu segundo mandato (2018-2022), definiram suas posições em diferentes congressos realizados no último sábado. Durante semanas, a direita chilena ecoou a bandeira rejeição ao texto produzido por por cidadãos independentes.

A Assembléia Constituinte é integrada por 154 cidadãos em sua maioria independentes e progressistas. Entre os direitos incluídos na Carta Política do Chile está saúde pública e universal, educação gratuita e de qualidade, melhores pensões, acesso à habitação e à água. A direita, que conquistou apenas 37 cadeiras nas eleições, alega que se trata de uma norma “radical” e “exclusiva”, discutida sem consenso. 

Se aprovada no referendo, obrigatório para maiores de 18 anos, a nova Carta substituiria a atual, herdada do regime de Augusto Pinochet (1973-1990) e considerada por muitos a origem das grandes desigualdades no país devido ao corte neoliberal e de privações de direitos civis. 

O Chile iniciou o processo constitucional como forma política de desmantelar a onda de protestos massivos que começaram em 2019 e deixaram 30 pessoas mortas e milhares feridas. Em um plebiscito histórico em outubro de 2020, quase 80% dos chilenos foram a favor da mudança do texto e em maio do ano seguinte os eleitores foram eleitos nas urnas.

 

Reeleição

O plenário da Constituinte aprovou na quinta-feira, 2, por ampla maioria a norma que impede a reeleição do presidente, Gabriel Boric, para um segundo mandato imediato, uma vez que o atual termina em 2026.

Por 124 votos a favor, nenhum contra e três abstenções, os constituintes aceitaram o artigo que estabelece que “o presidente da República eleito para o período 2022-2026 não poderá concorrer à reeleição para o período seguinte e continuará no cargo com as atribuições constitucionais para as quais foi eleito”.

Uma decisão que o próprio presidente avaliou positivamente minutos depois no Twitter, onde escreveu: “Muito bom. É o que corresponde”.

A reeleição do presidente da República é um dos artigos que mais gera polêmica na sociedade chilena, uma vez que não está contemplada na Constituição vigente, redigida durante a ditadura militar.

Já no projeto de Constituição que está sendo preparado para ser submetido a referendo popular no próximo mês de setembro consta que o chefe de Estado “pode ser reeleito, imediatamente ou mais tarde, apenas uma vez”.

Uma vez que Boric foi eleito para o período de transição entre as duas Constituições, os constituintes decidiram aprovar uma “norma transitória” que garante que, caso o novo texto seja aprovado, o novo “artigo passará a vigorar com seu sucessor no cargo”.

Por outro lado, o plenário da convenção rejeitou a norma transitória que sugeria elevar para dois terços o quórum necessário para que o atual Congresso faça modificações na nova Constituição.

A proposta, que previa que “durante a atual legislatura, os projetos de reforma constitucional serão aprovados com o voto favorável de dois terços dos deputados e deputadas e senadores em exercício”, somou apenas 71 votos a favor, longe dos 103 necessários para ser inscrita na minuta do novo texto constitucional.

A iniciativa deve agora retornar à Comissão de Normas Transitórias para que esta possa reformulá-la e devolvê-la ao plenário para apreciação. Essa reforma gerou rejeição nas fileiras socialistas e no entorno de Boric, que defende que “não deve haver quóruns específicos para uma legislatura em particular”. •