Após o Golpe de 2016, a política de preços de combustíveis praticada pela Petrobrás virou arma contra o povo brasileiro. Em 2015, no último ano de Dilma no poder, o vasilhame de 13 kg custava, em média, R$ 46. Apesar do mi-mi-mi do presidente, agora o preço passou a ser de  artigo de luxo: R$ 160, no Mato Grosso

 

 

A vida do povo brasileiro só piora desde que Jair Bolsonaro assumiu a Presidência da República em 2019. Seus três anos à frente do poder se tornaram uma arma contra a economia popular e os interesses da maioria da população. Na última semana, depois de assistir impávido à Petrobrás anunciar um megarreajuste de 18,8% no litro de gasolina, mais 25% no diesel e 16,1% no botijão de gás, Bolsonaro sentiu que a empresa exagerou. E a rejeição ao seu governo aumentou.

Na quarta-feira, 16, ele acusou a empresa de “cometer crime contra a população” ao aumentar o preço dos combustíveis. E admitiu que pediu à empresa para abaixar os valores e sinalizou que não irá manter o atual presidente da Petrobrás, o general Joaquim Silva e Luna. “Existe essa possibilidade [de trocar o presidente da estatal]. Todo mundo no governo, ministros, secretários, diretores de empresas, presidentes de estatais podem ser substituídos se não estiverem fazendo o trabalho a contento”, declarou.

O coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, reagiu e responsabilizou diretamente Bolsonaro pelo que classifica de “assalto ao bolso dos brasileiros”. “Ô, cara pálida, quem foi que colocou o presidente da Petrobrás? Quem foi que indicou a maioria do Conselho de Administração da Petrobrás? Quem indicou a maioria dos diretores executivos hoje da Petrobrás? A culpa, Bolsonaro, é sua. Assuma sua responsabilidade como presidente da República, como pessoa que representa a União, que é a acionista controladora da Petrobras”, cobrou.

Na Bahia, Bolsonaro ainda acusou a empresa de não colaborar com o governo e que a direção transformou-se numa “Petrobras Futebol Clube, onde o clubinho lá de dentro só pensa neles, jamais pensa no Brasil”. O argumento é cínico e o presidente, um mitômano. Desde que assumiu o poder, Bolsonaro aprofundou a política de preços instituída por Michel Temer ainda em 2016, que coloca o preço dos combustíveis no Brasil ao sabor dos humores do mercado internacional.

“É inadmissível que o Brasil, que tem autossuficiência de petróleo, que tem refinarias, tenha o preço de paridade de importação como política de preços de combustível aqui”, critica o presidente da FUP. “Não tem por que a gente atrelar os nossos derivados de petróleo ao preço do barril de petróleo no mercado internacional, a variações do dólar e a custos de importação porque está tudo aqui: o petróleo é produzido aqui”.

Os reajustes promovidos há uma semana pela Petrobrás sequer embutem a alta do petróleo gerada pela crise no leste europeu, com a guerra deflagrada pela Rússia por conta da proximidade da Ucrânia com a Otan e os Estados Unidos. Mas é o povo quem está sentindo a falta de compromisso de Bolsonaro com o país. Bacelar lembrou que que o custo de produção do barril de petróleo no Brasil fica em torno de US$ 40. Não há motivos, portanto, para que o preço do barril internacional, que está na casa dos US$ 113, influencie os preços cobrados no Brasil.

Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP), atualizados na sexta, 18, o botijão de 13 quilos, item essencial para preparação de alimentos das famílias, já chega a custar R$ 160. Na média, o gás é vendido a R$ 112,54, uma alta de 35% em relação ao valor praticado há um ano, quando o botijão era vendido por, em média, R$ 83,11.

O botijão mais caro é em Mato Grosso: por R$ 160. Na região Sul, o valor chegou a R$ 155. No Norte, R$ 150. Já nas regiões Sudeste e Nordeste, o gás de cozinha já é vendido a R$ 144,99 e R$ 135, respectivamente. No último ano de Dilma no Palácio do Planalto, em 2015, o gás de cozinha chegou a R$ 45,92, equivalente na época a 5,83% do salário mínimo. Hoje, o valor está acima de 11%.

Uma realidade bem distante do que foi prometido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, no primeiro ano do governo, quando ele afirmava que o país passaria por um “choque da energia barata”. Em diversas ocasiões, Guedes afirmou que o preço do botijão de gás poderia cair para R$ 35, considerando o valor médio à época. Isso representava em 2019 metade do preço, já que o botijão custava em média R$ 70. A chance da promessa se realizar agora é zero.

Ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o professor Maurício Tolmasquim, diz que o preço pode subir ainda mais. “Se o preço do petróleo subir lá fora, ou se houver algum problema de câmbio, pode impactar o gás liquefeito de petróleo”, observa. Vamos ver o preço subindo e descendo algumas vezes, pelo menos enquanto durar essa situação mais conflituosa”.

Tolmasquim ressalta que o acesso ao gás de cozinha vai além do uso de um combustível, pois se trata de um insumo de necessidade básica, que interfere diretamente na segurança alimentar das famílias. “Tão importante quanto ter o alimento é poder cozinhar. Usar combustíveis improvisados, como lenha, álcool e outros, em substituição a gás, coloca em risco a saúde das pessoas, da população, sobretudo da população mais pobre”, alerta.

De fato, a disparada dos preços afeta, sobretudo, as famílias mais pobres. Quando há aumento do gás de forma descontrolada, como está acontecendo agora, é algo que impacta diretamente as famílias. Elas passam a deixar de ter acesso a algo, algum tipo de alimento, para comprar gás. E começam a utilizar outros meios de combustíveis, que não são adequados, incluindo álcool e lenha.

Mas o drama do aumento dos combustíveis tem um efeito ainda pior: espalhar-se por toda a economia. Pesquisa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que a inflação é mais cruel para os pobres. Embora a inflação tenha aumentado para todas as faixas de renda em fevereiro, quando se olha para o IPCA acumulado dos últimos 12 meses, percebe-se que os mais pobres são os que mais sofrem com a escalada de preços. Para as famílias de renda muito baixa, a inflação anual já está à beira dos 11%.

Para os pobres, é o preço dos alimentos que mais impacta no orçamento. E é por isso que a inflação para eles tem sido maior. Comer se transformou em atividade de luxo nos tempos de Bolsonaro. Segundo o Ipea, no mês passado houve aumentos em produtos como feijão (9,4%), farinha de trigo (2,8%), biscoito (2,3%), macarrão (1,1%), café (2,5%), leite (1%) e pão (1%). Alimentos in natura também ficaram mais caros, especialmente batata (23,5%), cenoura (55,4%) e repolho (25,7%).

Outro levantamento que mostra a piora nas condições de vida do brasileiro foi produzido pelo Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas. As famílias excluídas do Auxílio Emergencial, sem emprego e atordoadas com a inflação, estão afundadas em dívidas. Segundo sondagem do Ibre-FGV, uma em cada três famílias brasileiras tem dívidas em atraso.

A inadimplência atinge especialmente os lares mais pobres, com renda até R$ 2.100. Chega a 58% nessa faixa. Uma particularidade da inadimplência atual é o aumento das contas básicas como água, luz e telefone. Segundo dados da Serasa, as contas básicas já representavam 23,9% das dívidas em dezembro de 2021, comparado a 20,4% no mesmo mês de 2020. •

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