Levantamentos recentes mostram que jovens de famílias com maior renda estudaram, em média, 50% mais horas do que alunos de renda baixa, além de terem feito em melhores condições, na medida em que podiam acompanhar suas aulas sem precisar compartilhar aparelhos eletrônicos, como ocorreu com os mais pobres. O saldo dessa diferença será o aumento da desigualdade na formação cidadã e na preparação para o mercado de trabalho.

Em termos de capacidades básicas, por exemplo, estima-se que o percentual de crianças de até 10 anos com dificuldades de leitura salte de metade para 70% no Brasil, indicando um caminho temeroso para nosso país.

O mercado de trabalho, por sua vez, também indica um quadro de agravamento das desigualdades entre o final de 2019 e o segundo trimestre de 2021, segundo os dados da PNAD Contínua divulgados pelo IBGE.  Enquanto os homens brancos mantiveram sua participação no mercado de trabalho estável, com crescimento de 0,2% no número de pessoas integrantes da PEA, os homens negros reduziram sua entrada em 6,3%.

Algo similar ocorreu entre as mulheres. O número de brancas integrantes da população economicamente ativa foi reduzido em 1,6%, enquanto para as negras essa queda foi de 6,4%. Isso considerando um país marcado pelo racismo, no qual 705 mil homens brancos ganham mais renda do que todas as mulheres negras, que totalizam 32 milhões de pessoas, e o 1% mais rico do país detém nada menos do que um quarto da renda nacional, uma das maiores concentrações do mundo.

A pandemia tornou o combate à desigualdade ainda mais urgente e necessário no Brasil e no mundo. A doença que atingiu o país em um cenário de alto desemprego e desigualdade crescente contribui para a ampliação destas disparidades em múltiplas dimensões. Do ensino ao mercado de trabalho, da maior letalidade entre a população negra e periférica à maior sobrecarga de trabalho de cuidado sobre as mulheres, a doença trazida pelos ricos e brancos fez agravar os abismos sociais.

A saída do mercado de trabalho deve-se à falta de perspectivas diante de um cenário econômico deprimido e deprimente. É diante dessa realidade que se destaca a importância dos programas de transferência de renda como foi o Auxílio Emergencial.

Conquistada pelo esforço da oposição no Congresso ao contrapor as primeiras propostas do governo, essa política foi responsável por fazer o país atingir o menor nível de extrema pobreza — equivalente a algo próximo de R$160 por mês — que se tem registro. Deixamos de ter 14 milhões de pessoas vivendo nessas condições antes da pandemia para 5 milhões em junho de 2020.

Contudo, desde o final de 2020, o país passou por seguidas interrupções do pagamento e sua redução pela metade na extensão do programa. A descontinuidade no pagamento do benefício é resultado direto da opção política do presidente Jair Bolsonaro.

Na sequência, o governo se empenhou em acabar com o Bolsa Família para que pudesse imprimir sua própria marca em um dos programas de transferência de renda mais estudados e premiados do mundo e um dos responsáveis pela enorme redução da desigualdade que o país viveu nos governos do PT.

Como era de se esperar, a emenda saiu bastante pior que o soneto, e o Auxílio Brasil tem um desenho com uma série de objetivos e instrumentos potencialmente conflitantes. Em especial, o caráter provisório do auxílio, que deverá ser revisto anualmente, e o desmonte promovido do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que ano passado registrou o menor orçamento nos últimos 10 anos.

Tais fatos geram diversas incertezas sobre a efetividade do programa. Fica nítido que sem uma ação coordenada do Estado que estimule a atividade econômica e garanta renda e oportunidades, as desigualdades agravadas pela pandemia seguirão ecoando ao longo de 2022 de maneira cada vez mais grave.

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