A nova onda da pandemia da Covid, provocada pela variante ômicron, está se espalhando rapidamente pelo país sem que o governo federal tenha tomado qualquer providência para reforçar o Sistema Único de Saúde. Na quarta-feira, 19, o Brasil registrou 204.854 novos casos confirmados de coronavírus nas últimas 24 horas, quebrando o recorde anterior pelo segundo dia consecutivo. O país já registrou 23,8 milhões de casos desde o início da pandemia, enquanto o número oficial de mortos superou a marca de 623 mil.

Ex-ministros da Saúde que estiveram com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na terça-feira, 18, defendem urgência na vacinação de crianças, principal público hoje sem cobertura da vacinação. No total, 67 milhões de brasileiros ainda estão suscetíveis, incluindo as crianças não vacinadas, mas também adultos que só tomaram uma única dose. É o equivalente a toda população da Argentina, Chile e Uruguai.

Segundo dados do consórcio de imprensa, o Brasil bateu novo recorde na média móvel de casos de Covid: 100,3 mil. Houve um um aumento de 487% em relação ao cálculo de duas semanas atrás. Na sexta-feira, 21, os presidentes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Paulo Jerônimo, e do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro, Alexandre Telles, protocolaram pedido de impeachment do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, no gabinete do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A ABI e o sindicato apontam que Queiroga tem sido negligente diante da pandemia da Covid-19, especialmente na demora em viabilizar a vacinação de crianças contra a doença. Além disso, acusam-no ser negacionista com a ciência e “submisso” aos ditames do presidente Jair Bolsonaro, que veio a público dizer ser contra a imunização infantil.

Bolsonaro ainda disse que a ômicron é “bem-vinda”, mesmo diante dos recordes de contágio. A nova onda está devastando o mercado de trabalho nacional, já enfraquecido pela precarização generalizada e pelo desemprego crônico, que supera a marca de 14 milhões de pessoas. A ômicron está obrigando ao fechamento das portas de lojas, o cancelamento de vôos, a suspensão das linhas de produção e impondo um “fique em casa” compulsório em meio à escassez de testes e ao apagão de dados do Ministério da Saúde.

Os números coroam o “conjunto da obra” bolsonarista, que inclui a cruzada contra a vacina, a campanha contra as medidas de isolamento social, o uso político do Ministério da Saúde e o argumento comprovadamente mentiroso de que o “fique em casa” destruiu a economia nacional. Até quinta-feira, 20, mais de 5,5 mil lojas de shoppings por todo o país tiveram de fechar as portas devido ao afastamento de funcionários por covid-19 ou gripe. Outros mais de 5 mil estabelecimentos operam em horário reduzido.

 

Vacinação, já

No encontro com Lula, seis ex-ministros da Saúde — Humberto Costa (2003/2005), Saraiva Felipe (2005/2006), José Agenor Álvares da Silva (2006/2007), José Gomes Temporão (2007/2010), Alexandre Padilha (2011/2014) e Arthur Chioro (2014/2015) — foram unânimes ao defender a adoção de uma política efetiva de vacinação no Brasil que inclua as crianças com menos de 5 anos, que são maioria entre internados nos países mais atingidos pela ômicron.

Para os ex-ministros, é preciso reconstruir a gestão do Ministério da Saúde, destruída no governo Bolsonaro. Eles criticaram o governo federal pela demora no início da vacinação de crianças, quando o mundo já sabia que os menores eram mais vulneráveis à nova variante. Segundo o ex-ministro Arthur Chioro é fundamental conscientizar a população sobre a importância da vacinação para crianças e adolescentes.

“Muitos pais, mães, avós, olham para o período anterior da pandemia, no qual as crianças não foram de fato contaminadas nem na velocidade nem na extensão que estão sendo agora”, afirma. “Essa variante afeta fundamentalmente e de maneira diferenciada menores de 18 anos, isso não era uma característica que estava presente nas variantes anteriores. É criminosa a postura do ministro da Saúde em retardar a vacinação de crianças”.

Para presidente da Fundação Perseu Abramo, Aloizio Mercadante, as crianças estão sendo duramente atingidas e o governo Bolsonaro é responsável. “Se a gente olhar o que está acontecendo nos outros países, o público mais vulnerável são as crianças. Se nós não anteciparmos o processo de vacinação, nós vamos expor nossas crianças desnecessariamente”, justifica. A presidente do PT, Gleisi Hoffman, diz que Bolsonaro é aliado do vírus. “O tempo inteiro ele foi aquele que incentivou a proliferação da Covid-19, foi contra a vacinação e desdenhou da dor da população”, denuncia.

Além da vacinação, o grupo de ex-ministro reunidos na Fundação Perseu Abramo defendeu uma política massiva de distribuição de máscaras, ampliação da testagem, investigação da doença, fortalecimento do SUS e investimento em pesquisa envolvendo institutos, universidades, uma política de comunicação, com informação segura e transparente e um conjunto de medidas como reconstrução da política do complexo econômico-industrial da saúde.

A falta dessa política tem gerado problemas, como falta de máscaras, de testes, de oxigênio e respiradores, assim como medicamentos para indução do processo de intubação. “É uma vergonha, mas desde 2016, com o golpe, foram destruindo nossa política do complexo econômico industrial da saúde”.

A variante ômicron, que é predominante hoje, apresenta-se quase como uma nova doença, uma espécie de Covid 2.0, cujas características são carga viral muito alta, potencial infeccioso maior, período de incubação mais curto, período de transmissão menor, sintomas parecidos com doenças virais infecciosas agudas e que afeta fundamentalmente e de maneira diferenciada menores de 18 anos.

“É um fenômeno que não tínhamos com relação a outras variantes, ainda que ela produza apenas 1% de casos com maior gravidade”, disse o ex-ministro Arthur Chioro, acrescentado que 90% dos óbitos ou de casos de UTI são de pessoas não vacinadas ou apenas com uma dose da vacina.

“O que nos preocupa é o fato da desigualdade da oferta de vacinação na escala planetária. Os países de baixa renda têm apenas 9,5% da população recebeu pelo menos uma dose, que cria um ambiente de vulnerabilidade para produção de novas variantes”, explica.

Mercadante anunciou que a Fundação Perseu Abramo está montando um grupo de trabalho para discutir políticas de fortalecimento da indústria da saúde, enfraquecida depois do Golpe de 2016 que derrubou a ex-presidenta Dilma Rousseff. Para ele, o Brasil tem uma oportunidade nessa área porque a demanda é grande nos Estados Unidos e na Europa.

“Já estamos desenhando uma proposta de como o Brasil pode ocupar essa janela e reduzir a dependência”, afirma. De acordo com Mercadante, o Brasil tem deficit comercial de US$ 16 bilhões nessa área. “Vamos precisar de mais pesquisa, ciência, tecnologia e educação”.

Além da reconstrução da gestão do Ministério da Saúde, o grupo defende a reconstrução da gestão interfederativa do SUS e o fortalecimento do sistema para dar respostas para casos de Covid, assim como de transtornos mentais agravados pela pandemia, além do conjunto de problemas que ficaram represados, como as cirurgias eletivas e tratamento de câncer, por causa da pandemia.

No encontro com Lula, os ex-ministros de Saúde apontaram a necessidade da reconstrução de um Centro Nacional de Controle de Doenças e Emergência Sanitária que lide com o monitoramento das novas doenças e de genoma e apoie os governos municipais e estaduais, além do Ministério da Saúde, na definição de protocolos de saúde.

Também estavam presentes no encontro com Lula dois ex-integrantes da Anvisa — Dirceu Barbano e Ivo Buareski — além de dois ex-integrantes da Agência Nacional de Saúde (ANS), Fausto Pereira dos Santos e André Longo, atual secretário de Saúde de Pernambuco. Também participou Eliane Cruz, do Setorial de Saúde do PT. • Da Redação, com Instituto Lula e Agência PT