Na pandemia, o Brasil navega sem instrumentos
Precisamos instalar uma CPI para apurar o apagão de dados do Ministério da Saúde, que deixou no escuro o controle da pandemia da Covid. É um escândalo que isso ocorra justamente quando o Brasil enfrenta a nova onda do vírus, com a variante Ômicron
Um aplicativo desenvolvido e usado na China foi fundamental no controle e combate ao coronavírus. Baseado nos dados de geolocalização das operadoras, ele analisa os movimentos do usuário nos 14 dias anteriores para identificar se ele esteve em uma área de risco, ou se esbarrou com algum infectado.
Desde a identificação dos primeiros casos do vírus em Wuhan, a China utiliza a ciência de dados e tecnologias da informação em saúde como principais instrumentos contra a propagação da doença. O resultado é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como o exemplo mais bem-sucedido no mundo.
Apesar da defasagem tecnológica do Brasil em relação ao gigante asiático, o Sistema Único de Saúde (SUS) avança na ciência de dados desde a criação do Departamento de Informática do SUS, o Datasus, que nasceu junto com a Fundação Nacional de Saúde, em 1991. É ele que coordena o fundamental esforço nacional de combate à pandemia pelo monitoramento, integrando o sistema de notificação de casos de Covid (e-SUS Notifica), o Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização (SI-PNI) e o ConecteSUS, que tem entre funções a emissão do Certificado Nacional de Vacinação.
E foi justamente estes instrumentos que sofreram um ataque hacker em 10 de dezembro de 2021, que derrubou sites, aplicativos e sistemas de informação do Ministério da Saúde. E o país passou a ser submetido às inconsistências de dados sobre internações, vacinação e todos indicadores que constavam nos sistemas, criando dificuldades para secretarias de saúde registrarem seus dados.
O apagão de dados causou no governo federal uma inépcia do sistema de saúde e deixou o enfrentamento da mais letal pandemia no escuro. Justamente durante a propagação da nova onda do vírus, com a variante Ômicron e sua alta capacidade de contaminação. Carentes de análises científicas, trocamos a computação de dados por evidências do aumento de casos de síndrome respiratória, “comprovadas” pelas cenas de unidades básicas de saúde lotadas e do número de amigos, conhecidos e parentes infectados.
A ausência de dados oficiais sobre a propagação do vírus tem que ser investigada e o melhor instrumento é uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que teve sua criação proposta pela bancada de deputados federais do Partido dos Trabalhadores e ficou conhecida como CPI do Apagão de Dados.
É imprescindível identificar os responsáveis pelo crime e qual o papel do governo federal no que vem ocorrendo. Sabendo que Bolsonaro sempre atacou os instrumentos de transparência nas informações públicas, e diante da ausência de números oficiais da pandemia, é no mínimo providencial aos seus interesses.
Com os órgãos de controle e apuração da União em estado de subserviência, cúmplices dos crimes de responsabilidade praticados em série pelo presidente da República, só a autonomia e independência do Congresso, através de uma CPI, pode trazer respostas para o Brasil e o mundo. Foi graças a este instrumento legislativo que descobrimos o que estava por trás da negação e atraso na vacinação e na aposta do governo federal pela imunidade de rebanho e o uso de remédios ineficazes, crimes que foram competentemente elucidados pela CPI realizada no Senado.