O Brasil à deriva
O desgoverno Bolsonaro segue ladeira abaixo, perdendo mais um dos pilares de sustentação. É público e notório que Bolsonaro nunca teve compromisso partidário, jamais discutiu ou se empenhou em construir um projeto estratégico para o país, sempre agrediu e menosprezou a democracia e montou o governo aglutinando alguns núcleos sem qualquer compromisso programático, que depois de dois anos e meio de desgoverno estão esfacelados e envergonhados.
O núcleo obscurantista, terraplanista e olavista apresentou ao país aquele que é considerado por muitos especialistas o pior ministro da Educação da história. Também é responsável pelo completo isolamento internacional e pela desmoralização da nossa diplomacia. Apesar disso, este núcleo ainda resiste na figura recolhida da ministra Damares, mas se encontra totalmente acuado pelas investigações do inquérito das fake news, relatado pelo ministro Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal.
O núcleo lavajatista, importante cabo eleitoral do bolsonarismo e que teve como principal representante o ex-juiz Sérgio Moro, já se encontra afastado do governo. A suspeição e a parcialidade de Moro, reconhecidas pela Suprema Corte, somadas às mensagens da Vaza Jato, que expuseram as entranhas e as ilegalidades da manipulação judicial que condenou Lula, feriram de morte sua credibilidade perante a opinião pública.
Os militares, mais um dos pilares de sustentação de Bolsonaro, permanecem no governo ocupando mais de 7 mil cargos. Entretanto, depois do vexame do desfile intimidatório em favor do voto impresso, do fiasco dos atos golpistas do último 7 de setembro e da tragédia que foi a gestão Pazuello no Ministério da Saúde, há um claro recuo das Forças Armadas, que tentam reduzir a exposição para conter o desgaste institucional.
A bola da vez é o núcleo neoliberal. O superministro da Economia, que acumulou as funções dos ministérios da Fazenda, da Previdência e Trabalho, da Indústria e Comércio e do Planejamento, Orçamento e Gestão, entrega os piores indicadores econômicos em décadas. Levantamento da OCDE com 42 países apontou que o Brasil é o 3º pior em desemprego, com mais de 20 milhões de desempregados, e a 4ª pior inflação, um acumulado e 10,25%. O FMI projeta um crescimento de 4,9% para a economia mundial em 2022, enquanto o Brasil apresenta pífios 1,5%, sendo que alguns analistas estimam que fiquemos ainda abaixo disso.
Além disso, o furo ao teto de gastos, um dos grande bastião da ortodoxia fiscal defendida por Guedes, explode da pior forma possível, com a substituição de um programa de êxito reconhecido internacionalmente, que é o Bolsa Família, por um puxadinho, uma completa irresponsabilidade gerencial do posto Ipiranga, que assiste ao desmonte de sua equipe, com o pedido de demissão de quatro secretários. O rombo será de R$ 110 bilhões, com uma pedalada gigantesca dos precatórios, jogando para o futuro governo uma bomba fiscal de efeito retardado, mas assegurando recursos significativos para seguir o fisiologismo parlamentar e paliativos no enfrentamento da crise. Para piorar, Guedes terá ainda que ir ao Congresso Nacional explicar o inexplicável, isso é: os US$ 9,5 milhões em um paraíso fiscal.
Nesse cenário gravíssimo, de deterioração da economia e de explosão da fome e da miséria, resta a Bolsonaro um núcleo familiar deteriorado e pressionado por escândalos, como os casos das rachadinhas e do financiamento ilegal das fake news.
A base fisiológica de sustentação do governo segue confortavelmente alimentado pelas emendas impositivas para impedir que o presidente responda pelos nove graves crimes, dentre eles crimes de responsabilidade, imputados a ele pela CPI da Covid.
Assim, chegaremos nas eleições de 2022 com o Brasil à deriva, completamente devastado por um novo retumbante fracasso do neoliberalismo. Por isso, precisamos olhar para os caminhos apontados por importantes nações que abandonam o neoliberalismo, como, por exemplo, o Plano Biden nos Estados Unidos e o Nova Geração na União Europeia.
Sobretudo, precisamos acompanhar as experiências da Ásia, onde o estado tem desempenhado o papel estratégico de indutor do crescimento e de coordenador da retomada da pós-pandemia. Esse parece ser o caminho para a reconstrução do Brasil. Até lá, é difícil imaginar como atravessar e qual será a herança histórica de mais um ano dessa tragédia, que é ter Bolsonaro como desgoverno.