Enquanto o Facebook enfrenta denúncias graves no Congresso dos Estados Unidos, com denúncias de práticas abusivas e viciantes de adolescentes e jovens, o CEO Mark Zuckerberg brinca de realidade virtual e prepara mudança de nome

 

O quarto dia do mês de outubro não sairá tão facilmente da memória daqueles que vivem neste segundo ano da pandemia. Em todas as retrospectivas, estará marcado como o dia em que Whatsapp, Instagram, Facebook e o Facebook Messenger, todas empresas de comunicação ligadas a Mark Zuckerberg, pararam de funcionar por longas sete horas. Bilhões de pessoas no mundo inteiro ficaram impedidas de trabalhar, estudar, fazer comércio ou simplesmente “falar” com seus familiares ou amigos.

Nesta semana, vazou na imprensa especializada em tecnologia, no site The Verge, que o Facebook prepara um reposicionamento da marca com mudança de nome, a ser anunciado em 28 de outubro, para o salto tecnológico da plataforma para o “metaverso”, um espaço digital baseado na realidade virtual.

Como se não bastasse estar imerso na internet durante as longas e excessivas horas de trabalho, em seu momento de lazer, o sujeito coloca um óculos de realidade virtual para encontrar os amigos num bar.  É mais ou menos o que milhões de pessoas no mundo já fazem jogando games associados a chats privados em plataformas como Discord ou Twitch. A manobra política, menos evidente, é livrar o Facebook do estigma de mídia social espalhadora de fake news e fincar o pé na ultrabilionária indústria de entretenimento, hoje reino do Youtube, empresas de streaming de vídeo e de jogos.

O Facebook, na verdade, já é o metaverso por onde, diariamente, circulam terabytes de dados pessoais, que vão desde geolocalização, dados financeiros, preferências políticas, inclinações religiosas, hábitos de consumo até o nome do cachorro ou a quantas a vida amorosa. O “negócio” de Zuckerberg não é conectar as pessoas, nem servir de espaço para debate “público”, muito menos fazer às vezes de meio de comunicação alternativo e independente. O que interessa são os bancos de dados compilados quando o Facebook deixou de ser uma rede fechada de relacionamento entre universitários para se tornar sinônimo de “rede social”.

Logo em seguida ao apagão de 4 de outubro, o Facebook passou a enfrentar questionamentos no Congresso dos EUA. Uma ex-funcionária de Zuckerberg vazou para o Wall Street Journal um arquivo com investigações internas que detalham como o Facebook, mesmo sabendo que seus sites são prejudiciais para a saúde mental de crianças e adolescentes, persiste na prática.

Em depoimento aos congressistas, Frances Haugen contou como os algoritmos são manipulados de forma que crianças e adolescentes sejam continuamente estimulados a saltar de um aplicativo para o outro, muitas vezes expostos a conteúdos violentos e inadequados. O apelo por transparência provocou declaração inédita do vice-presidente do Facebook: a empresa estaria “aberta” à ideia de permitir que órgãos reguladores tenham acesso aos algoritmos usados.

Aqui está o pulo do gato de Zuckerberg. Com o crescimento do Facebook e seu uso intensivo por empresas, partidos políticos e meios de comunicação de todos os tamanhos, a rede social passou a ter enorme poder sobre todos os conteúdos aos quais seus bilhões de usuários estão expostos. Isso significa que o conceito de “bolha” é um comportamento comunicacional determinado por linhas de código de programação. Cada curtida e até o tempo que cada um de nós se dedica à leitura de uma postagem ou assistindo a um vídeo consegue ser medido, analisado e vendido para quem se interesse.

No limite, quer dizer que toda a vida virtual do usuário pertence a quem tem dinheiro para comprar seus dados e, assim, vender o que for, de um vestido ou filme a uma notícia falseada, uma mentira deslavada ou uma narrativa política. A isso se chama de “microtargetting” — a possibilidade de uma mensagem publicitária, inclusive de campanhas políticas e eleitorais, chegar em grupos muito específicos e mobilizar uma reação de aderência ou de repulsa.

No âmbito da política brasileira, sabemos no que deu isso em 2018: uma eleição cuja estratégia de marketing político foi determinada desde os EUA por Steve Bannon, infundiu terrores diversos — o comunismo, a dissolução da família, a distribuição de mamadeiras fálicas pelo PT — por meio de fake news. Daí a eleição de Jair Bolsonaro como o mito salvador da pátria.

O gabinete do ódio que comandou a estratégia aqui usou e abusou de pelo duas das redes sociais dos domínios de Zuckerberg: o Facebook e o WhatsApp. Melhor começar o ano eleitoral de 2022 prestando bastante atenção no que Mark Zuckerberg está fazendo.

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