Se estivesse presente nesses tempos bicudos, o genial negro gato continuaria fazendo arte e levando amor e música a todos. A obra do poeta inquieto, nascido no morro de São Carlos, permanece viva

 

Meu nome é ébano, venho te felicitar sua atitude; espero de te encontrar com mais saúde… Eu grito ébano, o couro que me cobre a carne não tem planos, a sombra da neurose te persegue há quantos anos? No Rio de Janeiro estão te sacando, no Centro da Cidade vão te avermelhando”. 

Foi a partir do vigor desse canto negro, que surgiu no cenário artístico e musical o jovem Luiz Carlos dos Santos, morador do morro de São Carlos, no Rio de Janeiro. Filho do compositor e músico Oswaldo Melodia, nascido no Morro de São Carlos, no bairro do Estácio, no Rio, em 7 de janeiro de 1951, veio a herdar do pai, além do gosto pelo samba, o apelido. 

Amigo do artista plástico Hélio Oiticica (1937-1980), do poeta e produtor musical Wally Salomão (1943-2003 e do também poeta e tropicalista Torquato Neto (1944-1972), Luiz Melodia foi apresentado por ambos a Gal Costa, que trabalhava na feitura de um no show, dirigido por Wally, e fascinada pela música “Pérola Negra, a incorporou a seu repertório.

Foi, no entanto a partir de sua apresentação no Festival Abertura, da Rede Globo, em 1975, onde concorreu com a canção “Ébano” interpretada pelo autor e que conseguiu chegar às finais, que Melodia começou a ter sua figura conhecida do grande público.

“Se alguém quer matar-me de amor, que me mate no Estácio. Bem no compasso, bem junto ao passo, como passista da Escola de Samba do Largo Estácio… Estácio acalma os sentidos dos erros que eu faço. Trago não traço, faço não caço o amor da morena maldita domingo no espaço. Fico manso amanso a dor Holliday é um dia de paz. Solto o ódio, mato o amor, Holliday eu já não penso mais”.

Gravada por Maria Bethania, “Estácio, Holly Estácio” virou um sucesso estrondoso nas rádios de todo o país. Catapultado ao cenário como uma das grandes revelações da MPB dos efervescentes anos de 1970, Melodia gravou seu primeiro álbum “Pérola Negra”, em 1973, e iniciou a trajetória de um dos mais prolíficos autores da então nova geração musical, sem, no entanto, conseguir se desvencilhar do rótulo de “maldito”.

Reconhecidamente uma das vozes mais marcantes da Música Popular Brasileira, Melodia correu o país de ponta a ponta em shows memoráveis.  Eclético, foi um mestre no rock, no blues, e no samba. Sua versatilidade musical transbordou o território levando-o a se apresentar em diversos países: Suíça, onde fez apresentação retumbante no famoso de Festival de Montreux, apresentando-se para um grande público, além da França.

Engajado nas causas populares, participou de várias apresentações apoiando o MST e a luta pela Anistia. Fez diversas shows nas campanhas presidenciais de Lula, de quem se dizia eleitor. Em 2015, foi agraciado no 26º Prêmio da Música Brasileira na categoria Melhor Cantor de MPB.

O grande e inesquecível Luiz Melodia nos deixou em 2017, aos 66 anos. Recentemente, foi lançado o documentário “Todas as Melodias”, dirigido pelo cineasta Marcos Abujamra, que traça em paralelo a imagens de Melodia em shows e nas origens no Morro de São Carlos, com shows pelos palcos brasileiros e turnê internacional, entremeados com depoimentos de sua companheira de 40 anos de estrada, Jane Reis, e de artistas, como Jards Macalé e Zezé Motta.

O documentário foi apresentado pelo Canal Curta e continua disponível para todos que querem assistir. Luiz Melodia vale a pena. Sempre valerá!