Todo cronista que se preza tem de algum dia escrever uma crônica sobre a falta de assunto para escrever sua crônica. Como eu me prezo, a minha é esta.

 

Na verdade o que é um tema de crônica? Não sei. Sei que quando procuro um, não me importa tanto o tema, mas aquilo que de novo eu possa dizer sobre o tema. Mesmo que embora muitas vezes não o diga, ou não o encontre.

Todo cronista que se preza tem de algum dia escrever uma crônica sobre a falta de assunto para escrever sua crônica. Como eu me prezo, a minha é esta.

 

Na verdade o que é um tema de crônica? Não sei. Sei que quando procuro um, não me importa tanto o tema, mas aquilo que de novo eu possa dizer sobre o tema. Mesmo que embora muitas vezes não o diga, ou não o encontre.

Quem dá o tema? Não sei. Sei que às vezes é o próprio cronista, às vezes é o jornal, ou o caráter do jornal, ou a natureza dos leitores a que o jornal se destina. Nem sempre.

Quando surge o tema? Não sei, também. Mas esse é um dos pontos importantes da questão. Alguns temas surgiram, já há uns cinco ou dez anos atrás. Outros surgem quando você põe o papel na máquina de escrever. Outros quando o secretário chega e diz: “Como é, sai ou não sai essa crônica?

O tema geralmente não surge num momento só, surge em dois ou três momentos “psicológicos” que podem estar próximos ou distantes no Tempo. Há um primeiro momento em que você descobre aquilo que de novo você tem a dizer sobre o tema. O resto do tema, e da crônica, pode ou não vir imediatamente em seguida. Às vezes não vem: o tema fica informulado, incriado, em estado latente, esperando Godot. De repente, não mais que de repente, ele toma vida e se cria num processo autogenético parecido com o do Gênio da lâmpada de Aladim: você destampa a cumbuca e é aquele fumaceira toda.

Outros vezes ele malogra no ato do nascimento. É então que você diz: “Não, este tema ainda não está bom para mim”. O que é um erro: você deveria dizer: “Não, eu é que ainda não estou bom para este tema”.

Às vezes eles voltam tempos depois e você consegue fazer a crônica. Outras vezes voltam ao entardecer,e, outras vezes, não voltam nunca mais.

Acontece também que às vezes você consegue formular o começo da crônica com um tema, mas não consegue continuar. Eu tenho dois ou três temas que – sei – jamais vou conseguir fazer deles uma crônica. Já tenho o título, já tenho o começo, mas o resto não vem e eu acabo desistindo. Um se chama “Aracnídeo” e começa assim: “Ariadne era loira e esbelta, esguia como uma enguia e enredava os olhares na teia do seu olhar”. Outra é sobre uma rua que se chama da Jandaia e que parece da Gandaia. Por parecer da Gandaia é que eu quis fazer dela uma crônica, mas não consegui.Todavia, como eu prometi fazer essa crônica, talvez um dia ela saia. Já estive lá duas ou três vezes, andando a rua de baixo para cima e de cima para baixo. Uma dona de casa me olhou desconfiada, um senhor que estava chegando me olhou hostil, umas crianças que estavam brincando na calçada me olharam, mas seus olhos não me acusavam de nada. Mas disso também não passei. Porque, não sei.

E é por não saber tantas coisas que às vezes não tenho tema para uma crônica.

 

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