A urgência do Marco Civil da Internet
Por José Guimarães
As recentes denúncias de espionagem contra o Brasil pelos Estados Unidos, conforme documentos mostrados pelo ex-analista da Agência Nacional de Segurança (NSA) Edward Snowden, tornaram ainda mais urgente a aprovação de um marco regulatório para a Internet no Brasil. Sua aprovação não resolverá o problema da espionagem, mas é um passo importante para proteger a privacidade da sociedade da cyberespionagem, bem como para promover a inovação e o desenvolvimento social e econômico do Brasil, e impulsionar uma Internet mais igualitária e justa.
O marco será uma lei de princípios e regras gerais. É uma espécie de Constituição do setor, garantindo direitos aos usuários e deveres das empresas que exploramos serviços de Internet no País. Passou a ser conhecido como Marco Civil da Internet, em contraponto a um outro projeto que fora apelidado de AI-5 Digital, porque, se aprovado como proposto, criminalizaria atos corriqueiros na Web, como o simples desbloqueio de um celular. Civil, portanto, em oposição a criminal.
O Marco Civil nasceu da sociedade, construído de forma colaborativa, democrática e aberta. O Ministério da Justiça, em parceria com o Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas, esboçou a primeira minuta, com base no decálogo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), órgão multiparticipativo responsável pela governança da Internet em nosso país. Na Câmara dos Deputados foi colocado novamente em consulta pública no portal e-Democracia e recebeu mais de 45 mil visitas e mais de 2 mil comentários.
Sete audiências públicas foram realizadas e mais de 60 especialistas foram ouvidos pelo relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ). Possui cinco pilares: a) neutralidade da rede – proibição de tratar os dados que trafegam na Internet de forma discriminatória. Exemplo: priorizar acesso ao site de um jornal, em detrimento do concorrente. Tornar a conexão do Skype mais lenta, e assim por diante; b) privacidade online; c) liberdade de expressão; d) inimputabilidade da rede – assim como o carteiro não é responsável pelo conteúdo de uma carta que implique algum dano à honra do destinatário, o provedor de aplicações, como os sites de conteúdo, não podem ser responsabilizados por danos cometidos por conteúdo colocado no ar por terceiros, a não ser que não cumpra ordem judicial que solicite a retirada do conteúdo do ar.
E, por fim, trata da guarda de registros, para investigações relacionadas a atos ilícitos. É uma cartilha de regras gerais. Direitos autorais, crimes cibernéticos e a proteção mais detalhada a dados pessoais, todos ficam para leis específicas. Pessoas de renome apóiam o Marco Civil. Como o físico britânico Sir TimBerners-Lee, considerado o pai da Internet, que disseque seremos referência mundial caso aprovemos o Marco Civil da Internet.
O professor da Columbia University e ex-assessor da Federal Trade Commission – a Agência Nacional de Telecomunicações dos EUA – e que cunhou o termo “neutralidade da rede”, Tim Wu, também apoia a iniciativa. Temos um projeto maduro. Amplamente discutido pela sociedade e no Legislativo. O Brasil clama por uma Internet aberta, democrática, inclusiva, descentralizada e distribuída. Acesso à Internet é um direito humano. Este é um projeto de Estado, não de governo. Foi feito pela sociedade, para a sociedade. É de interesse nacional.
José Guimarães é advogado, deputado federal (PT-CE) e líder do partido na Câmara.
Artigo publicado originalmente no jornal Brasil Econômico, edição do dia 25 de outubro de 2013