Pactos e estratégias para as eleições de 2014: um balanço de outubro. Leia a análise do cientista político Antonio Lassance, no boletim semanal.

 

 

Pactos e estratégias para as eleições de 2014: um balanço de outubro

A um ano das eleições de 2014, o governo da presidenta Dilma mostrou o acerto de sua estratégia, assentada muito claramente nos cinco pactos anunciados como resposta às jornadas de junho – as manifestações que sacudiram o país e incendiaram as capitais. No entanto, se o saldo positivo servir de pretexto para um excesso de confiança, 2014 pode vir acompanhado de surpresas desagradáveis.
Os pactos sinalizaram a agenda prioritária sobre a qual o governo tem concentrado suas energias e sua articulação política. Eles ainda demandam intensa coordenação política com o Congresso, na medida em que dependem de aprovação legislativa; maior cooperação federativa, pois sua implementação envolve a atuação de governadores e prefeitos; e uma comunicação mais ágil e direta da própria presidenta e de seus ministros, pois as batalhas de formação da opinião pública são diárias e decisivas para as chances dessas agendas serem garantidas ou frustradas. O quarto aspecto central para 2014, a negociação com os partidos, é crucial para a montagem dos palanques estaduais, mas depende do governo apenas em parte. Sua maior responsabilidade está nas mãos do próprio partido.
Dos cinco pactos, o da saúde, em torno do programa “Mais Médicos”, é o que avançou mais rapidamente. Em outubro, o governo Dilma ganhou todas as batalhas que ameaçavam a plena implementação do programa. Nesta última semana do mês, uma megaoperação com jatos da FAB, a maior já feita no país, levará 2.167 médicos contratados e formados na segunda fase do programa para se juntarem aos 1.499 profissionais já distribuídos aos municípios, na primeira fase. A dose cavalar de atenção básica será ainda maior em 2014, mas os médicos que chegarão até o fim de outubro já serão suficientes para cravar a presença federal nos municípios mais distantes do País. A batalha congressual está finda. A da cooperação federativa está selada, mas agora se abre a discussão sobre as condições dos hospitais e postos de saúdes nas localidades. A batalha da comunicação está apenas no início.
A educação tem sido um foco constante da atenção da presidenta, que tem promovido sobretudo o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). As lacunas, porém, ainda são grandes. Os royalties do pré-sal começam a entrar no financiamento do sistema no ano que vem, mas ainda em volumes modestos. O Plano Nacional de Educação permanece em discussão no Congresso e com divergências sérias. Os governadores e prefeitos relutam em cumprir o piso salarial, tornando evidente que as políticas de valorização da carreira dos profissionais da educação estão longe de serem uma diretriz do federalismo brasileiro. Finalmente, o Ensino Médio continua como um gargalo.
O PAC 2 deu fôlego às obras de mobilidade urbana, mas o endividamento dos estados e das capitais, em alguns casos, e, principalmente, o desmantelamento das estruturas estaduais e municipais de planejamento tornaram os resultados irritantemente lentos, na percepção dos cidadãos, e quase sempre acompanhadas do problema do sobrepreço. O novo teto de endividamento tornará possível novos empreendimentos, e o novo regime de licitações vai acelerar as obras. Mas não se pode obscurecer algo que é um vício, e não uma virtude: em grande medida, os projetos básicos estão terceirizados às empreiteiras.
O pacto em torno do controle da inflação e dos gastos públicos se mostra o mais fácil de ser cumprido. O grande risco macroeconômico não se localiza nesse aspecto, e sim no patamar de crescimento da economia projetado para 2014. Esse é o verdadeiro calcanhar de Aquiles e grande desafio a ser enfrentado a esse respeito.
De todos, o pacto mais frágil e complexo é o da reforma política. Sobretudo o PMDB da Câmara empenhou-se para sabotar a proposta de plebiscito. A microrreforma eleitoral, oriunda do Senado, tem sido objeto de desavenças entre os partidos da base. Mesmo a proposta de voto aberto, que muitos julgavam consensual, se arrasta. É o único pacto que, por enquanto, não apresenta luz no fim do túnel, a não ser que o governo se esforce por vincular a reforma ministerial a ser feita, até o final do ano, ao compromisso dos partidos da base de aprovarem ou a proposta de plebiscito ou o projeto de iniciativa popular das eleições limpas.
O balanço do mês é, em linhas gerais, extremamente positivo. O governo sai reforçado em sua perspectiva de reeleição, se não forem cometidos grandes erros adiante. Há apenas três coisas que podem criar grandes dificuldades. A frustração com a falta de reforma política e a desmoralização da política, que a oposição partidária e midiática promovem frequentemente, podem levar a uma grande abstenção e a uma proporção nunca vistas de votos brancos e nulos nas próximas eleições. Os problemas relacionados ao cadastramento biométrico pode deixar um grande contingente de eleitores sem condições de votar. Menos de 40% dos 16 milhões de eleitores previstos de se recadastrarem já o fizeram, até o momento.
O terceiro problema é o excesso de confiança, que pode levar a um relaxamento das prioridades e a um abandono principalmente dos compromissos com a reforma política. Afinal, esse é um assunto que incomoda alguns dos aliados importantes que o PT pretende ver a seu lado nos palanques de 2014. Se assim for, preparemo-nos para encarar 2014 como uma caixinha de surpresas.

Análise: Antonio Lassance, Doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília
www.fpabramo.org.br
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