Em dezembro de 2002 quando representava a Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PT e setores do Movimento Negro no Governo de Transição, recebi um grupo de mulheres e homens da Coordenação Nacional de Entidades Quilombolas (CONAQ).

Naquele momento os quilombolas saudavam o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e apresentavam as principais recomendações para o Governo Federal.

Entre as recomendações estava muito bem delineada a luta histórica pela regularização das terras, pelo respeito à cultura e organização, pela necessidade de ampliação das politicas publicas, e acima de tudo a necessidade de revogação do decreto que orientava a politica de quilombos no Brasil.

Dito e feito, após a criação da Secretaria Especial de Politicas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) já na condição de ministra acompanhei junto aos quilombolas a elaboração e o desenvolvimento do Decreto Federal 4887 de 20 de novembro de 2003 (que regulamenta o processo de titulação das terras), e, também do Programa Brasil Quilombola.

No caminho que se seguiu, houve por parte do Governo Federal o direcionamento das politicas públicas, mais de 3.500 comunidades quilombolas foram reconhecidas e centenas foram certificadas. É obvio que os resultados precisam ser ampliados e continuados, pois ainda falta muito para o atendimento ao conjunto das demandas históricas.

Mas, no contraponto dessa construção, há oito anos o partido Democratas (DEM) moveu uma ação contra as comunidades quilombolas, ao alegar a inconstitucionalidade do decreto. A qualquer custo o DEM junto com a bancada ruralista e latifundiária pretende que o Supremo Tribunal Federal aprove a Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 3.239. Essa é mais uma investida contra a luta ancestral das comunidades quilombolas e indígenas, no que se refere às conquistas de suas terras.

É importante que saibamos que se for aprovada a proposição do DEM, teremos um enorme retrocesso para a luta histórica dos quilombos e também para o acumulo adquirido pelo Governo Federal desde a Constituição de 1988.

Devemos reafirmar que a CONAQ no IV Encontro Nacional das Comunidades Quilombolas, em 2011, anunciou que os quilombolas não aceitam “nenhum direito a menos”. O IV Encontro Nacional deliberou sobre a necessidade de ampliação do diálogo entre as várias organizações visando à continuidade da luta para a garantia do acesso a justiça e as políticas públicas para os quilombolas. Os temas tratados nesse encontro foram: territorialidade e regularização fundiária; segurança; religiosidade; saúde; educação; certificação e políticas culturais (cultura e tradição); comunicação; e, desenvolvimento e preservação ambiental de territórios quilombolas.

Por tudo isso, organizações e comunidades quilombolas de todo o país juntamente as parcerias e apoiadores estão organizando uma grande mobilização em Brasília, nesse dia 18 de abril de 2012.

É hora de nos colocarmos a serviço de dar mais um passo para desfazer a falácia do ideário da “democracia racial”, decantada em décadas anteriores como o caminho para o Brasil. Devemos abraçar com mais força e fazer valer a proposição de que “não há democracia com a existência de racismo e machismo”.
Portanto, para darmos mais um passo para a construção da tão almejada democracia, devemos demonstrar com todas as letras e em alto e bom som a nossa defesa dos direitos e das terras quilombolas. Essa luta histórica é nossa, dos negros e dos brasileiros que querem um Brasil com igualdade!

*Matilde Ribeiro é ex-ministra da Igualdade Racial.