O confronto era inevitável, desde o primeiro momento.

Por Ricardo Kotscho*

Zero hora do dia 1º de abril de 1980: após meses de discussão nas portas de fábricas e nos sindicatos, começa no ABC a mais longa e importante greve operária do Brasil pós-64. Nos dias que antecederam a assembléia decisiva de 30 de março, um domingo, ministros mantiveram demoradas reuniões com empresários para definir a estratégia do Estado e do Capital para enfrentar o novo movimento reivindicatório dos operários do ABC. Nada do que os trabalhadores pediam em sua campanha salarial (15 por cento de aumento salarial por produtividade, garantia de emprego, delegado sindical, etc) seria aceito. Então viriam a greve, que logo seria decretada ilegal, a intervenção, a destituição e a prisão dos líderes operários. No já histórico Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, Luís Ignácio da Silva, o Lula, e aquela multidão de metalúrgicos sabiam de tudo isso ao estufarem o peito para cantar o Hino Nacional e o da Independência, agitando orgulhosamente suas bandeirinhas de papel ao decretar a greve – como a lembrar que ali estava o Brasil, o Brasil das vítimas da ditadura e das multinacionais, o Brasil operário, mais do que nunca disposto a lutar. O confronto era inevitável, desde o primeiro momento – um confronto desigual: de um lado, o governo, os empresários nacionais e estrangeiros e todo o aparato policial-militar de sustentação do regime; de outro, os operários que tomaram consciência do seu papel e da sua força, armados de razão e coragem na sua luta por uma vida mais digna.

Zero hora do dia 1º de abril de 1980: as máquinas, as fábricas começaram a ficar desertas. Exatamente 16 anos após o golpe militar, os operários do ABC começaram a reescrever a História do Brasil. Foram 40 dias em que os 200 mil metalúrgicos do ABC se transformaram nos personagens mais importantes da vida brasileira.

* Trecho extraído do livro A Greve do ABC

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