Como todos sabem, a crise econômica européia está dizimando a juventude e a velhice num só pacote, pois a reversão de antigos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários hoje é a "segurança" de ser um pária quando idoso. A construção da "geração sem direitos" está à pleno vapor.

Como todos sabem, a crise econômica européia está dizimando a juventude e a velhice num só pacote, pois a reversão de antigos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários hoje é a "segurança" de ser um pária quando idoso. A construção da "geração sem direitos" está à pleno vapor.

No Reino Unido, o desemprego juvenil superou a barreira do milhão de pessoas, a matrícula universitária custará em torno de 16 mil dólares e a ajuda estudantil secundária desapareceu, pois uma das medidas de austeridade da coalizão conservadora foi a triplicação do valor das matrículas universitárias e a eliminação da ajuda a estudantes secundário, passando de 3.290 libras (8,9 mil reais) até o valor máximo de nove mil libras anuais (24 mil reais) a partir do ciclo acadêmico 2012-13. Além disso, mantém o plano, anunciado no início de novembro passado, de cortar em até 40% o orçamento para a educação superior.

Um fenômeno novo é que os estudantes estão recorrendo à prostituição para financiar uma carreira que ofereça a remota possibilidade de melhorar sua perspectiva de trabalho: 25% das “strippers” e “lap-dancers” da "City" são estudantes, 16% das universitárias estão dispostas a se prostituir para pagar seus estudos e 11% cogitam trabalhar em agências de acompanhantes. Qualquer semelhança com países pobres da África, Caribe, ex-repúblicas soviéticas imediatamente após à dissoloução da URSS, não é mera coincidência. Esses países desenvolvidos estão promovendo geracionalmente, com os choques sucessivos de ultra-liberalismo para solucionar as crises neoliberais, uma transição rumo ao antigo "terceiro mundo". Por sinal, em dezembro, a Inglaterra perdeu para o Brasil a 6ª colocação no ranking da economia global. Nada mais sintomático.

Esses jovens são um "ônus demográfico" porque, pela lógica do modelo ainda vigente no além-mar europeu, seria melhor não haver essa geração para se tornar adulta e idosa, a requerer direitos sociais e mais previdência no futuro, já que, em que pese sua idade produtiva e sua altíssima qualificação técnica e interlectual, para nada serve diante do quadro de quase estagnação econômica. Aliás, essa geração, já ganhou outros conceitos, como o da ONG Barbados, que a classificou de “futuros pobres”.

Enquanto isso, David Cameron fala de desintegração moral da sociedade por causa dos saques promovidos por jovens inconformados com a situação, que muitos analistas já chamaram de Vândalos deslocados de questões materiais e ideológicas (como no Brasil, um artigo da senadora Marta Suplicy). E a grande solução do primeiro-ministro foi prometer uma investigação dos fatos, mas a política socioeconômica do governo não variou nem um milímetro. O plano de austeridade promove uma redução de 140 bilhões de dólares no orçamento 2011-2015 e os programas juvenis destruídos pelos cortes e não receberam nenhuma nova fonte de receita.

Por outro lado, nos informa a Carta Maior em reportagem recente sobre este assunto, "David Lammy, deputado trabalhista por Tottenham, o bairro onde iniciaram os incidentes" declarou que "não há uma consciência social ou política sobre a gravidade e urgência do tema".

Ora, e qual a alternativa apresentada pelo Labour Party, que foi puro neoliberalismo mitigado, com sua "terceira via", num período não muito distante?

O caso está longe de ser patrimônio do Reino Unido. Na Irlanda, os jovens simplesmente estão migrando para outros países em busca de empregos e o país pode perder até 5% de sua população,a não ser que se sagre vitoriosa a palavra de ordem dos protestos estudantis de "Educação sim, imigração não!". Em Portugal, Itália, Grécia, Alemanha e Espanha, são quase 40%, 50% da população desempregada, o dobro da média de desempregos regulares.

A situação no "Velho Continente" é tão grave que não é de se espantar que, em 5 anos, a noção que os portugueses têm sobre a pobreza mudou de alvo. São vistos como pobres hoje os jovens à procura do primeiro emprego, juntamente aos que têm trabalhos precários e aqueles que ganham baixos salários (cuja maioria tem menos de 30 anos). Essa é a principal conclusão do Estudo Sobre a Percepção da Pobreza em Portugal, que a Rede Européia Anti-Pobreza apresentou ontem em conjunto com a Amnistia Internacional/Portugal (AIP) e o Socius – Centro de Investigação em Sociologia Econômica e das Organizações do ISEG e UTL.

Por outro lado, relatório da Organização Internacional do Trabalho, divulgado em 25/01/2011, revela que a tendência mundial é de, pela primeira vez, o Brasil apresenta uma taxa de desemprego abaixo da dos países ricos e abaixo da média mundial. A OIT diz que "a situação é particularmente dura com os jovens", porém, pela dinâmica de cada país na crise mundial, "um jovem em busca de emprego encontrará uma oportunidade mais facilmente no Brasil do que nas grandes cidades europeias ou americanas" e que "há mais jovens desempregados nos Estados Unidos e na Europa que no Brasil". Prova não apenas do acerto da nossa política econômica e social, mas de como ela beneficia os jovens de baixa renda, a juventude trabalhadora.

Diante disso, cabe questionar qual política internacionalista as juventudes organizadas, de centro-esquerda da América Latina poderiam estabelecer com os jovens europeus  dos grandes partidos de massa e de esquerda daquele continente, especialmente os filiados à IUSY (a juventude da "Internacional Socialista")?

Só se for, partindo das experiências e novas propostas do Sul, disputar, convencer e ajudar as novas gerações socialistas, trabalhistas e social-democratas de lá a fazerem diferente da atual geração de seus dirigentes nas lutas do presente e nas transições geracionais democráticas e partidárias, com uma agenda refundadora do que o reformismo tinha de melhor, pois de direitos civis a Europa, pelo menos a Ocidental, já beira a excelência ou está perto disso, apesar da xenofobia e do racismo puxando a roda da história para trás nesta seara, complementado o trabalho de desmonte do Walfare State desenvolvido pela centro-direita. Entretanto, o fio desligado entre os partidos de esquerda de massas e os jovens é aquele do estudo, emprego decente e estável, salários, seguridade social e novos e maiores canais de participação social.

Sem ter por onde fazer sua voz ser escutada, sem poder pagar os estudos por estar desempregada e com futuro incerto, principalmente na "terceira idade", questões como aborto, casamento homoafetivo ou "economia verde" só terão, cada vez mais eco, em cúpulas juvenis burocratizadas.

Velhas causas para novos atores, qual o problema se tudo o que foi desfeito é exigido nas ruas (a abstenção é altíssima) que seja refeito? Claro. Com uma pitada de rejeição ao imperialismo e ao neocolonialismo, que deviam ser as expressões, nesses próprios centros do capitalismo, da pregação anti-xenófoba e racista dos jovens "cor-de-rosa".

Leopoldo Vieira é membro da Direção Nacional da Juventude do PT.