O movimento negro tem um projeto transformador para o país
O Pauta Brasil desta sexta-feira, 19 de novembro, véspera do Dia da Consciência Negra, debateu as transformações promovidas a partir da ação incansável do movimento negro no país, processos de acúmulo com conquistas muitas vezes parciais, no campo prático e no das ideias. Participaram do debate Makota Celinha Gonçalves, Roberto Borges, Renato Ferreira e Selma Dealdina.
O professor Roberto Borges, titular do Departamento de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Relações Étnico-Raciais do CEFET/RJ, coordenou e iniciou o debate afirmando que o movimento negro tem um projeto de transformação para o país que tem sido posto em prática embora seja invisibilizado, silenciado e apagado pelo racismo e pelas relações de poder que o racismo institui. Enfatiza que se trata de um projeto de inclusão.
A jornalista Makota Celinha Gonçalves, empreendedora social da Rede Ashoka e coordenadora nacional do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira, fala do ponto de vista de sua “construção social que são os terreiros” e se define orgulhosamente como uma “macumbeira de esquerda”. Afirma que no terreiro se aprende a viver a coletividade, a sorosidade e a respeitar o outro. “Vive-se um projeto que não exclui. Se não tivéssemos um projeto político transformador, não estaríamos aqui para contar essa história”. Segundo Makota, quando se trata das tradições de matriz africana, é preciso se ressignificar todos os dias para sobreviver ao racismo religioso, pois a sociedade não reconhece o direito às práticas afro-religiosas. “Queremos um projeto laico, queremos a real e necessária imparcialidade do Estado com relação à religiosidade”. Lembra ainda que igrejas cristãs participaram do golpe de 2016 e diz: “Não ameaçamos a democracia, respeitamos o outro. Vivemos a democracia”.
Para a assistente social, Selma Dealdina, quilombola do Angelim III, Território do Sapê do Norte (ES), secretária administrativa da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e organizadora do livro Mulheres Quilombolas Territórios de Existências Negras Femininas, é impossível contar a história do Brasil sem mencionar a importância de negros e negras na construção do país, embora contem essa história sem ter negros e negras como protagonistas. Conta que no município capixaba de São João da Barra, embora 70% da população seja negra, a minoria branca é que domina comércio, empregos, na política etc. Lembra que não estudamos na escola sobre os quilombos, por exemplo. “Há uma visão equivocada que os quilombos acabaram, quando pensaram que destruíram Palmares, que nunca foi destruído… Palmares é um Estado e o Estado negro está no corpo de negros e negras, vivendo a ancestralidade, a defesa de seus territórios…”. Menciona que se o censo quilombola saísse do papel poderia confirmar a existência 6630 quilombos no Brasil, o que totaliza 14 milhões de pessoas, mas o país não reconhece, não titulam seus territórios e fecham suas escolas.
O advogado Renato Ferreira, doutorando em Sociologia e Direito na Universidade Federal Fluminense, especialista e professor de Relações Raciais, Direitos Humanos, Políticas Públicas e gestão para a diversidade, afirma que para o Brasil ser um Estado democrático de Direito é preciso acabar com o racismo. Refletindo sobre a trajetória de luta dos negros desde os navios negreiros, o professor diz que, se for feita uma análise crítica justa, a conclusão é que não existe no Brasil um movimento que tenha contribuído tanto para a democracia do país quanto o movimento negro. “Não há uma teoria crítica de Brasil que seja mais generosa do que a que o movimento produziu… de busca não pela igualdade, em busca de respeito pela sua diversidade”, completa. Renato lembra ainda que nunca houve no país universalidade para as pessoas negras. “O nosso discurso precisa se transformar em política, pois a política é que muda a vida das pessoas”, diz. Ilustra sua afirmação mencionando a bem-sucedida e irreversível política de cotas raciais para universidade.
O debate segue ainda com os participantes falando sobre o papel das pessoas brancas no combate ao racismo, as desigualdades, antirracismo seletivo, o racismo estrutural.
Assista a íntegra do programa abaixo.
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