O Pauta Brasil do dia 8 de outubro discutiu o tema “bicentenário da Independência, uma história inacabada” e, para isso, recebeu a historiadora Claudia Wasermann, professora titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Gilberto Maringoni, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC); e o historiador Lincoln Penna, professor aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A mediação foi de Vivian Farias, vice-presidenta da Fundação Perseu Abramo.

Claudia Wasermann iniciou sua participação no debate lembrando que “falar de independência é falar de um passado que não passou”, que os traumas gerados pela colonização não foram eliminados na independência e que esses traumas têm sido omitidos nos festejos oficiais.

Segundo ela, a existência de fortes identidades regionais, a inexistência de uma identidade nacional, a presença de caudilhos e ausência de um mercado interno unificado foram fatores de instabilidade no projeto nacional em todos os países americanos que se emanciparam do domínio europeu entre 1810 e 1825, dentre eles no Brasil.

Para a historiadora, as independências alteraram pouco a estrutura social no continente, mas alteraram profundamente os laços de dependência, que saíram do controle de Portugal e Espanha e passaram ao imperialismo inglês e depois estadunidense, o que perpetuou a posição dos países da América Latina como periferia do sistema capitalista.

Lincoln Penna lembrou que a comemoração oficial do bicentenário começou com uma tentativa frustrada de golpe e ruptura democrática. Um golpe com o objetivo de fazer o país retroceder e reabrir as poucas feridas cicatrizadas do período colonial.

Segundo ele, discutir o bicentenário da independência no sentido de ressignificá-lo é fundamental, sobretudo em um momento como o atual. “Que independência nós queremos?”, se perguntou. Para reforçar a possibilidade de ressignificação, o historiador estabeleceu um paralelo com o ano de 1922, que teve fundamental importância na formulação símbolos e de um projeto nacional moderno.

Penna reforçou também que a independência do colonialismo levou a uma nova forma de dependência, em um mundo subjulgado pelo colonialismo e pelo imperialismo inglês durante um século.

Gilberto Maringoni iniciou sua intervenção discutindo o caráter de inacabado da independência brasileira, que, ao mesmo tempo que é inacabado como processo histórico, no sentido de que a história nunca acaba, é acabado enquanto modelo de independência na periferia do capitalismo. “Nós tivemos uma abolição sem cidadania, uma república sem democracia e uma independência sem soberania, mas será que o padrão de independência é ter soberania?”. Segundo ele, esse vácuo de soberania é fundamental para que siga existindo uma relação desigual entre países, um centro e uma periferia.

O professor reforçou que as independências dos países latino-americanos foram construídas quase todas no mesmo contexto, de domínio e expansão do capitalismo inglês, por um lado, e de insatisfação dos donos de terra e desejo das elites locais de ocuparem postos de poder, entes reservados aos ibéricos, por outro. Para ele, a especificidade do caso brasileiro é que esse processo de independência foi encabeçado por um monarca absolutista.

Segundo ele, uma soberania de fato só é possível com soberania econômica, o que só se estabelece com a conformação de um mercado interno. No Brasil, só com o projeto varguista, a partir da década de 1930, isso começou a surgir, processo freado por um golpe imperialista em 1964, como aconteceu também em 2016. “Nós temos um desafio para quando tirarmos Bolsonaro do poder: reconstituir o mercado interno, que significa indústria, direitos, cidadania”.

Assista ao programa na íntegra:

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