A professora Eleonora Menicucci de Oliveira, pró-reitora de extensão da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) deu esta entrevista ao portal da FPA durante o seminário A Mulher e a mídia, realizado nos dias 2, 3 e 4 de dezembro de 2010, no Rio de Janeiro.

Portal FPA – Para os militantes que tiveram a mesma experiência que a presidente eleita, de combate à ditadura, qual é o significado da eleição de Dilma Rousseff?

Eleonora Menicucci de Oliveira –
Tenho muito orgulho de ter sido presa durante a ditadura e quem foi preso político e lutou contra a ditadura adquiriu uma experiência inenarrável, de solidariedade, de tolerância zero com a injustiça social, com a tortura, com a violência, com o desrespeito. E também uma escuta abertíssima para ouvir a outra pessoa e o que a outra tem a dizer. Esta é uma história que já contada antes, mas eu estive presa com minha filha de um ano, e ela foi torturada na minha frente. Quando fui presa, a Dilma já estava lá há um ano, eu a conhecia em Belo Horizonte e a reencontrei – uma pessoa muito afável, amiga, muito sarcástica, alegre, que não dorme, é plugada. Acho que é por isso que damos muito certo.  Não gosto de mitificar minha amizade com a Dilma, mas todos nós somos seres humanos, temos a nossos amores, nossos afetos. Uma coisa que não compactuamos, e sou muito firme nisso, é ser conivente com a informação obtida pela tortura, pela ditadura. Isso que a Folha de S.Paulo tem feito de tentar acessar o processo da Dilma é uma das maiores violências. Tem que ter muita serenidade para não empastelar a FSP. Tem que abrir e dizer que foi obtido sob tortura, então não tem validade, não tem credibilidade.

A gente nunca imaginou que uma de nós poderia chegar onde ela chegou. E principalmente uma mulher. A eleição de Dilma como presidente, para nós da geração que vivemos a tortura e que somos resilientes na sociedade brasileira, o significado maior é que  o Brasil votou contra a tortura e a violência. Não teve medo de votar. Pra minha geração é muito lindo, muito gratificante. E do ponto de vista das  mulheres tem o significado de emancipação social e de cidadania das mulheres fantásticas, porque ela teve dois maridos, ela hoje está sozinha, tem uma filha e um neto. Não fez carreira pendurada num homem. Fez a carreira política no projeto político social do presidente Lula. Ela foi sujeito nesse projeto. E eu, por tudo que conheço dela, e pelo carinho e respeito que tenho a ela, tenho convicção de que o governo dela ficará marcado na história desse país.

Portal FPA – Se o candidato fosse um homem, ele teria recebido o mesmo tratamento que Dilma Rousseff no  processo eleitoral – divulgação da ficha falsa, o câncer, se ela seria capaz de governar, se não seria Lula a governar?

Eleonora Menicucci de Oliveira –
Acho que não.  Não vamos muito longe: o José Alencar, ele quando assumiu a vice, já tinha um câncer. Está até hoje, sobrevivendo, resistindo. O (Dilson) Funaro, quando assumiu o Ministério da Fazenda (no governo Sarney), a grande questão era que ele tinha um câncer linfático e que ele poderia morrer e parou-se aí. No caso de Dilma: "ela é mulher", "é sozinha", "quem seria o primeiro damo", "o câncer", "estava engordando demais por causa da cortisona". Tudo isso são sintomas muito fortes de um futuro muito duro para ela. Ela não terá trégua em nenhum momento. O que mais incomodou ao candidato adversário dela foi disputar com uma mulher que tinha a mesma história que ele, e ela não renegava o passado. Ele sim. Então, isso era inadmissível para ele.  Uma coisa foi perder para um operário, sem instrução formal, sem cultura, outra coisa é perder para uma mulher. A governabilidade não será fácil.

Portal FPA – Em relação aos meios de comunicação, basta discutir regulação?
Eleonora Menicucci de Oliveira – Eu não acho que a sociedade tem claro essa discussão da regulação. A sociedade age assim: "a imprensa está aí pra falar de tudo, é o papel dela; preciso saber quem é a Dilma, o que ela faz".  Mas o que interessa a vida privada dela para ser uma boa presidente?  Os operadores que trabalham diretamente com a mídia, vão chamar a regulação de controle de estado, assim como já falaram de Chavez.  Acho que ainda falta muito dos operadores do lado dos movimentos sociais explicar que regulação é uma coisa e o controle do conteúdo é outra coisa. Algo que mais presamos é a liberdade de expressão. Falar, macular a vida privada, não é liberdade de expressão. Acho que hoje a grande mídia precisa aprender a lidar com essa nova mídia, que são as redes sociais, que são de uma velocidade enorme e tem grande atuação.