Mercadante: ‘Vacina está longe de chegar ao povo brasileiro’
Em entrevista ao programa DCM Ao Meio-Dia desta terça-feira (19/1), o ex-ministro e presidente da Fundação Perseu Abramo, Aloizio Mercadante, fez uma análise detalhada sobre a situação da vacina contra a Covid-19 no Brasil. Segundo Mercadante, há um abismo entre o início da vacinação e o povo vir a ter acesso à vacina. “Nós estamos diante de um cenário da pandemia grave, retornando ainda mais agressiva, e estamos sem governo, sem planejamento, sem calendário. E a vacina, que é a única forma de evitar o distanciamento social, está longe de chegar”, afirmou. “A fila vai ser longa e o tempo de espera também extenso, portanto, não há expectativa otimista em relação à vacina para o povo brasileiro”, disse. O ex-ministro explicou que as 6 milhões de doses autorizadas pela Anvisa não são suficientes para vacinar sequer metade dos profissionais de saúde do Brasil. “O que a Anvisa autorizou, 4 milhões da CoronaVac e 2 milhões da AstraZeneca, que são 6 milhões de doses, como são duas doses, serão para 3 milhões de pessoas, não chega à metade dos profissionais de saúde. Então, metade dos profissionais da saúde não têm ainda direito à vacina”, explicou. Em sua análise, o ex-ministro apontou que o Brasil tem 2,7% da população mundial, mas tem mais de 9% das pessoas contaminadas e mais de 10% das mortes. “Ou seja, nós temos quatro vezes mais mortes por Covid do que a média mundial e mais de três vezes a contaminação do que a média mundial”, explicitou. Falta de vacinas e de planejamento Para o ex-ministro, pelo tamanho da população brasileira, pela importância da economia e pelo nível de contaminação havia um grande interesse dos laboratórios e das empresas que produzem vacina em fazerem parecerias com o Brasil. “Agora, como nós temos um governo negacionista, que sempre negou a gravidade da crise, que obstruiu todas as iniciativa da medicina, inclusive a vacina, porque eles nunca acreditaram na vacina e fizeram até manifestações contra a imunização, o Brasil não fez nenhuma parceria nem os convênios indispensáveis para poder ter um acesso acelerado às vacinas”, pontou. Para exemplificar o despreparo do governo Bolsonaro, Mercadante relembrou o acordo da Organização Mundial da Saúde e com a Opas, segundo o qual o Brasil poderia ter acesso privilegiado para atender metade da sua população, cerca de 212 milhões de vacinas, uma vez que são duas doses por pessoa. “Com muita pressão, o general, que se diz especialista em logística e tem mostrado que nem isso faz com competência, nós tivemos 44 milhões de doses, assinado o acordo”, lamentou. CoronaVac Mercadante relembrou a obstrução do governo Bolsonaro à CoronaVac, vacina chinesa contra a Covid-19. “O Governo Federal não apoiou, o presidente subestimou a vacina chinesa, agrediu e objetivamente nós não temos os insumos para produzir as vacinas chinesas”, disse. O ex-ministro apontou ainda que a China não liberou o insumo, o IFA, para poder produzir a vacina no Brasil. “Então, se forem liberados todos os insumos para que o Butantan produza – e o Butantan tem uma capacidade anunciada de produzir 1 milhão de doses por dia, o governo do PT fez muito investimento na Farmanguinhos da FioCruz e no Instituto Butantan – nós precisaríamos de 424 dias para vacinar a população, já que são duas doses, ou seja, nós precisaríamos de um ano e meio, se for a vacina chinesa e se os insumos chegarem, o que não está assegurado”, prosseguiu. AstraZeneca Sobre a vacina da AstraZeneca, Mercadante disse que a situação é ainda mais complexa. “A Índia é um país com mais de 1,3 bilhão de pessoas que está começando a vacinação, e o seus parceiros do entorno são prioridade, inclusive pela contaminação da população”, afirmou. “Então, também eles correram atrás agora de forma humilhante de 2 milhões de doses para tentar entrar nessa vacinação originária, porque objetivamente, para a vacina da FioCruz com a Oxford e a AstraZeneca, não foram liberados os insumos para o envasamento. Não se produziu até agora nenhuma vacina. Além disso, eles não compraram as injeções”, explicou. Sputnik Mercadante relembrou que o consórcio do Nordeste pactuou 50 milhões de vacinas da Sputnik com a Rússia, mas a Anvisa não liberou. “A Sputnik está fazendo uma parceria com Oxford/AstraZeneca, então eles vão testar essa nova vacina, mas alegam que os dados não foram encaminhados, não houve testagem no Brasil e a Anvisa não liberou”, argumentou. Balanço geral “Então, você tem 50 milhões de vacinas Sputnik paradas, tem direito a 44 milhões de vacinas da Opas e da Organização Mundial da Saúde, não há previsão de quando as vacinas indianas poderão vir nem do volume. E não temos capacidade de produção, menos de um ano e meio, se for a vacina chinesa”, avaliou. “Portanto, nós não abrimos os leques, algumas vacinas chegaram a ser ofertadas, a Pfizer ofereceu 70 milhões de doses e o Brasil descartou, é verdade que a logística é difícil em razão da temperatura de armazenamento, mas objetivamente não temos um programa de vacinação”, lamentou. O ex-ministro avaliou que a luta pela vacina vai gerar um movimento cada vez mais forte, a população vai ficar cada vez mais incomodada, principalmente porque a nova cepa do vírus também ataca a juventude e o índice de mortalidade é muito alto. “Nós estamos realmente em um quadro dramático, mesmo com todos os alertas que fizemos de que haveria uma segunda onda, de que o Brasil precisava fazer a vacina, que tinha que liberar recursos, que tinha que dar prioridade”, relembrou. Por fim, Mercadante explicitou o isolamento político internacional de Bolsonaro, que agrediu a China, o presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, a União Europeia e o presidente da Argentina, Alberto Fernández. “Então, o Brasil está completamente isolado, não fez as parcerias necessárias, não houve planejamento, não houve coordenação e é isso: essa tragédia. Por tudo isso, a melhor vacina para o Brasil é o impeachment de Bolsonaro”, finalizou.