As mobilizações iniciadas no Chile um ano atrás e que duraram até o advento da pandemia de Covid-19, em março deste ano, valeram a pena. Tendo como agenda principal a reivindicação de que o Estado assuma seu papel de fomentar políticas públicas nas áreas da educação, saúde e previdência social totalmente privatizadas pela Constituição vigente, que é de 1980, período da ditadura de Augusto Pinochet, logrou a convocação de um plebiscito para o povo decidir se queria ou não uma nova Constituição e o formato da Assembleia Nacional Constituinte.

O plebiscito foi postergado várias vezes devido à pandemia, mas finalmente realizou-se no dia 25 de outubro, e o resultado dificilmente poderia ter sido mais contundente: 78% dos eleitores votaram “Sim” por uma nova Constituição e apenas 22% rejeitaram a proposta. Além disso, foi decidido que a Assembleia será exclusiva e com paridade de gênero. Haverá também uma quota para representantes de povos indígenas, ainda por definir. Assim, os encarregados de redigir a nova Constituição serão eleitos em abril de 2021 somente com essa tarefa. Não necessitam de filiação partidária e seus mandatos serão extintos quando a nova Constituição estiver aprovada.

Entretanto, ainda há questões em aberto. Por exemplo, será necessário o voto de dois terços dos constituintes para aprová-la, mas não está claro se isso será um quórum para cada parágrafo ou para o conteúdo integral.

De qualquer maneira, depois desse processo, o Chile não será mais o mesmo. A força das manifestações do ano passado deverão garantir novas conquistas e poderá enfrentar o atual paradoxo de um país, que tem uma economia avançada, mas uma das mais injustas distribuições de renda da América do Sul, junto com o Brasil.

Kjeld Jakobsen é consultor da Fundação Perseu Abramo. O texto não reflete necessariamente a posição da instituição.

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