O governo Bolsonaro definitivamente não tem nenhum compromisso com a democracia e com os valores que esse regime político representa, tais como: a liberdade, a pluralidade, o contraditório e o respeito à autonomia das instituições republicanas. Bolsonaro volta a agredir a autonomia das universidades e dos institutos federais com a edição da Medida Provisória 979/2020, que permite ao ministro da Educação nomear verdadeiros interventores como reitores, ainda que temporariamente.

A MP suspende a realização de eleições com listas tríplices para a escolha de dirigentes das instituições federais de ensino durante o período da emergência de saúde pública decorrente da pandemia da covid-19. Ainda, de acordo com a medida, caberá ao reitor indicado pelo ministro designar os dirigentes dos campi e os diretores de unidades temporários.

É evidente que medidas prudenciais, como o uso de máscaras e o distanciamento social, devem ser adotadas em tempos de pandemia para resguardar a vida e a saúde de todos. Entretanto, isso não significa que a pandemia possa ser utilizada como pretexto para que o governo burle preceitos consagrados pela nossa Constituição, como a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades.

A participação da comunidade universitária no processo de escolha de reitores poderia ser assegurada com o uso de novas tecnologias, como plataformas virtuais, que têm sido utilizadas, por exemplo, no Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal para manutenção de suas atividades. Ademais, caso a adoção desse tipo de solução não tivesse sido possível, o governo deveria considerar a prorrogação temporária dos mandatos dos reitores democraticamente eleitos e não a imposição de interventores federais sem qualquer representatividade em nossas universidades.

É nosso dever a defesa de princípios seculares e internacionalmente reconhecidos, como o da autonomia universitária e da liberdade de cátedra, que são essenciais ao estado democrático de direito. Por isso, tenho certeza de que mais essa tentativa de intervenção impositiva do governo Bolsonaro em nossas universidades será derrotada, se não pelo Supremo Tribunal Federal, pelo próprio Congresso Nacional.

São medidas autoritárias como essa MP que fazem crescer, cada vez mais, a indignação contra o governo e a formação de amplo movimento pelo impeachment de Bolsonaro. Não há dúvidas que estamos apenas no começo de um processo social que deve se transformar, após a pandemia, em grandes manifestações de rua no Brasil, que farão o país voltar a respirar liberdade e os bons ares de democracia.

Aloizio Mercadante é ex-ministro da Educação e presidente da Fundação Perseu Abramo.

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