O Covid-19 chegou ao Brasil e Paulo Guedes segue na insistência quanto às “reformas”, como se as reformas fossem proteger a economia do forte choque que virá. Uma delas, a PEC Emergencial é parte do apelidado “Plano Mais Brasil” e tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Vale lembrar que a tramitação está na fase de audiências públicas, que deve ser afetada por restrição de circulação no Congresso devido ao Covid-19 .

Um dos pontos mais polêmicos é a previsão de que, no exercício em que seja realizado volume de operações de crédito para além da despesa de capital, “a jornada de trabalho dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional poderá ser reduzida em até 25% (vinte e cinco por cento), com adequação proporcional de subsídios e vencimentos à nova carga horária”.

Seu relator, Senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), afirmou que pode incluir no texto da PEC a proibição de que seja cortada a carga horária e salários de servidores de áreas essenciais, citando saúde, educação e segurança pública.

No entanto, os especialistas apontam que os cortes de jornada e salário devem ocorrer justamente nessas áreas,
com claro impacto na prestação de serviços para a população e também na capacidade de consumo dos trabalhadores.

Além do claro impacto que a PEC 186 pode ter no sucateamento dos serviços públicos e na piora do acesso aos direitos sociais, estudo do NEMEA/FACE/UFMG mostra que a PEC pode ter forte efeito contracionista pela redução do
consumo dos trabalhadores. Em linhas gerais, o estudo, de autoria de Edson Paulo Domingues, Débora Freire Cardoso, Aline Souza Magalhães e Thiago Cavalcante Simonato, aponta que o setor da Administração Pública pagou cerca de 220 bilhões de reais em salários (12% do total de salários pagos) em 2018 e que, caso colocados em prática os cortes, o PIB pode recuar de -1,4% (corte de 25%) a -0,30% (corte de 5%) como efeito de curto prazo desse tipo de política, em relação a um cenário
sem essa política. Segundo os pesquisadores, se um corte de 25% fosse aplicado sobre os salários da Administração Pública, isso significaria cerca de R$ 55 bilhões a menos de remunerações na economia brasileira, ou -3% sobre o total de salários no mercado de trabalho brasileiro. No médio prazo, segundo o estudo, o impacto negativo é permanente se a medida não for revertida: -1% para corte de 25% e -0,2% para corte de 5%.

Assim, os dados mostram que para a população brasileira essa insistência em avançar com as reformas no paradigma da austeridade, na “redução do papel do Estado” para os pobres por mexer no provimento dos direitos sociais, será mais um tiro no pé. Insiste-se na receita que vai deprimir ainda mais a renda, mexendo agora na renda de camadas da sociedade que apresentam condições de trabalho mais fixas e mais seguras que os trabalhadores com carteira assinada (e obviamente mais
que os informais). Com a chegada do Covid-19 ao Brasil, com força, é preciso ter em mente que o desmonte que está sendo realizado no Brasil nos deixa mais vulneráveis para enfrentar graves crises como a vivida  agora, que demanda, ao contrário, maior presença do poder público para lidar com a situação. Ao dizer que quer reduzir a jornada e salário dos funcionários públicos, de forma abstrata, a população precisa entender que a PEC quer cortar justamente a jornada de trabalhadores
da saúde e da educação, que se fazem fundamentais não só neste momento de crise mas para o desenvolvimento do país.

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