Desde que o governo anunciou um corte de 30% em verbas de universidades federais e institutos federais, quase de forma automática, nesse outono de 2019, de chuvas mais esticadas que o normal, disparou-se o gatilho de um movimento que tem tudo para fazer brotar a primavera da educação.

Esse sentimento começa a levar estudantes de várias cidades para as ruas, é o mesmo que habita em professores, auxiliares e de todos os profissionais que compõe o mundo educação. Tal força, por sua vez, foi canalizada e constroi a greve geral da educação marcada para 15 de maio.

É bom reparar que isso não nasceu do nada, esse processo é o resultado construído e forjado nas melhores experiências. A semente foi plantada em meio à resistência ao golpe de 2016 e germinada com as consequências dele.

Lá atrás, muitos perceberam que ao tirar Dilma Rousseff da Presidência da República, passando o comando da nação para Michel Temer, não era tão somente como trocar um nome pelo outro, mas sim algo maior. No fundo o objetivo era trocar um projeto de governo por outro completamente oposto. Esse projeto que acabava de ocupar o Palácio do Planalto era algo devastador.

O ultraliberalismo defendido por Temer – a tal “A Ponte para o Futuro” – não era apenas impopular, o projeto se apresentava tão maléfico que não vingaria em uma disputa eleitoral. Daí a razão do golpe. Somente por meio de uma ruptura, forçada, na marra, o lançaria ao poder. Mas na vida nem tudo são flores. A forma pela qual Temer chegou ao poder resultaria em muitas sequelas.

Como era um projeto regado de destruição, algo que secaria o solo por onde passasse, então, quase diretamente proporcional, assim como a chuva traz vida em meio a trovoadas, tal iniciativa prenunciaria outra, a resistência dos que não aceitariam calados a destruição do solo fértil e fecundo, ou seja, ia ter luta, muita luta.

Tão longe, tão perto, os movimentos de ocupações de escolas, iniciados com particularidades estaduais e municipais, levantando-se contra a política neoliberal de fechamento de escolas, começaram a obter êxito em suas ações. Os estudantes saíram de sua forma embrionária com peculiaridades locais, para aquisição uma nova roupagem. A vida e suas experiências, principalmente aquelas que chegam através da luta, fazem de seu fruto mais belo e maduro o avançar de um ciclo.

Nesse novo momento os estudantes começaram a ter uma pauta mais global, percebendo assim, que a raiz do problema era o governo federal. O resultado foi mais de mil escolas ocupadas. A volta da inquietude questionadora que, ainda de forma embrionária, se manifestou em rejeição às formas dominantes de viver.

Como uma vanguarda minoritária, isoladamente, eles se insurgiram contra a polícia, o extermínio de jovens, a criminalização da maconha, o machismo, contra o avanço conservador e contra a perda de liberdades ou por mais liberdades e direitos. Outros elementos se somaram com a luta contra a PEC do Teto de Gastos, na qual as experiências das ações da juventude obtiveram apoio, em consonância e construção conjunta com a o movimento sindical, fizeram dessa interrelação um momento de crescimento.

E o próprio processo eleitoral de 2018, no qual, ao sentir que seus direitos e liberdades estavam ameaçados, a juventude, com outros setores como artistas, intelectuais e dos movimentos sociais, conseguiram somar 47 milhões de votos. Como consequência desse momento rico, houve o avançar de algo mais organizativo, cristalizando assim, a entrada deles na construção dessa nova vanguarda.

Vale lembrar aqui que, quando o sentimento de ódio e horror tentou assombrar as universidades públicas, esse mesmo movimento, com firmeza, coragem e flores, espantou o opaco e a falta de cor da onda sombria, trazendo de volta as cores e a vida.

Inúmeros casos registraram a tentativa de ataques homofóbicos, racistas, machistas e fascista, mas com energia, alegria, poesia e regado das melhores emoções humanas, estudantes de todo Brasil colocaram as bestas feras de novo na gaiola que havia sido rompida.

Enfim, essa rebeldia que nasceu volátil e tinha dificuldade de se conectar com uma luta política mais global, aprendeu na prática com suas dificuldades objetivas. E deve-se ajudar na sua atuação no movimento estudantil e nas lutas da juventude como um todo.

Embora se possa antever a configuração do movimento que essa energia latente da juventude promete eclodir, é possível apostar que será um movimento de caráter juvenil e popular, autônomo em relação às instituições e corporações e com fortes traços culturais.

Mais do que estar preparado, deve-se ajudá-los a parir esse algo novo. Essa experiência tão rica e que acumulou muito tem grandes tarefas como mudar o comportamento, a história e a cultura, tão grandes para quem apenas conhece a vida por pouco tempo. Ou seja, quem viveu um pouco mais, de forma generosa, respeitando sua autonomia e capacidade, deve auxiliá-los no que for preciso.

Já a luta dos trabalhadores da educação, a maturidade, é algo histórico, não há como esconder a importância deles na história das grandes lutas do Brasil.

O que há de novo é que com o avanço do conservadorismo no planeta e no Brasil, os trabalhadores da construção do saber em nosso país não se renderam e foram para cima. Eles não deixaram a propaganda conservadora ocupar mais espaço do que já havia ocupado.

As lutas contra a militarização das escolas, contra o nascer de uma cultura fascista nas universidades e contra a retirada de conquistas civilizatórias de todo tipo e em todas as áreas da vida sempre tiveram nesse setor um ponto central de resistência. Para além disso, as lutas pelas questões dos trabalhadores sempre tiveram nesse setor um grande impulsionador da luta.

A reforma da Previdência enxerga nos professores e nos trabalhadores da educação um inimigo a ser derrotado com requintes de maldade É só ver o que está sendo preparado para eles no projeto e, em particular, às professoras. Para o governo não basta só arrotar teses medievais sem pé nem cabeça, a busca é assassinar a ciência. Para o governo o saber é mercadoria a ser explorada, inimigo interno e cultural a ser derrotado, a educação é gasto desnecessário e foco de rebeldia, pois fazem a população refletir.

É por esses motivos que, no outono de lutas, o nascer da Primavera se faz tão possível.

Pedro Del Castro é assessor da liderança do PT no Senado

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