PIB segue na passada do tico-tico cansado
Cisca daqui, cisca dali, os números do PIB do terceiro trimestre ainda apontam para um quadro desolador. Apesar do entusiasmo interessado que animou as manchetes dos principais jornais brasileiros, a etérea variação de 0,1% ante o trimestre imediatamente anterior (abril-maio-junho) é claramente um mau sinal, tanto porque representa uma redução da intensidade de crescimento (veja a tendência declinante no gráfico), quanto porque os terceiros trimestres de cada ano costumam ser os melhores do ponto de vista da produção e do emprego.
A análise por setor de atividade (PIB pela ótica da oferta) revela que a queda da produção agrícola (-3%) foi a principal responsável pela desaceleração do PIB, enquanto o setor de serviços (+0,6%) e, principalmente, o setor industrial (+0,8%) mostraram um desempenho razoavelmente positivo.
Já sob a ótica da demanda, enquanto o consumo do governo caiu (-0,2%), acumulando cinco quedas trimestrais consecutivas, o consumo das famílias repetiu a taxa positiva de 1,2% e os investimentos cresceram 1,6%.
Aos olhos daqueles que se esforçam para dizer que o copo está meio cheio, o crescimento da produção industrial, puxado em grande medida pela expansão da indústria de transformação (+1,4%), ao lado dos mencionados crescimentos do consumo das famílias e dos investimentos seriam indicativos de que agora “a economia já caminha sozinha”. De acordo com essa interpretação, a economia estaria mostrando vitalidade mesmo na ausência daqueles tonificantes que deram força ao PIB no primeiro semestre do ano (safra agrícola excepcional, aumento das exportações e liberação do FGTS).
Entretanto, a análise mais acurada dos sinais positivos da indústria e dos serviços pode antes estar indicando justamente o inverso, isto é, os efeitos retardados daqueles impulsos extraordinários, os quais não deverão se repetir nos próximos meses.
De um lado, o crescimento da indústria de transformação pelo terceiro trimestre consecutivo guarda relação direta com a forte expansão do setor agrícola e das atividades exportadoras que estiveram vigentes na primeira metade do ano. Assim, tanto as indústrias produtoras de bens de capital para a produção agropecuária, quanto de caminhões, caminhonetas, utilitários e veículos automotoras, foram alavancadas por uma demanda (agrícola e externa) que já está se revertendo – ao lado do encolhimento do PIB agrícola, o setor externo também apresentou números ruins no terceiro trimestre, com as importações crescendo a um ritmo superior ao das exportações (6,6% ante 4,1%).
De outro lado, a expansão do consumo das famílias decorreu, em grande medida, da vigência de alguns fatores que não deverão se repetir com a mesma intensidade nos próximos meses: (1) o rescaldo dos saldos do FGTS e seu efeito indireto sobre a redução da inadimplência e o gradativo retorno do crédito às pessoas físicas; (2) os ganhos reais de salário que foram viabilizados pelo contraste entre as taxas de inflação dos anos anteriores e a baixa taxa percebida ao longo de 2017 – isto é, diversas categorias profissionais, que acumularam perdas salariais nos anos de 2015 e 2016, conseguiram recuperá-las em parte graças à acentuada queda da inflação no presente ano.
No cômputo geral, portanto, o cenário calibrado com os números do terceiro trimestre é ainda de preocupação. Como a capacidade ociosa persiste em patamar elevado e o mercado de trabalho se aquece apenas nas margens, em atividades mais precárias e com baixos rendimentos, tudo indica que o PIB seguira sonolento por mais alguns meses, mal conseguindo acertar o passo com o ritmo da tão declamada “recuperação cíclica”.