Confecom: letargia de Serra atrasa conferência em São Paulo
Serra deixou estourar o prazo dado pelo Regimento Interno estabelecido pelo Ministério das Comunicações, que fixava 15 de setembro como data limite para os governos estaduais convocarem suas conferências. Como deixou de fazê-lo, a Assembléia Legislativa de São Paulo (segunda na ordem de precedência para essa convocação, com prazo até 20 de setembro) assumiu a tarefa e, em 19 de setembro, começaram oficialmente os trabalhos. Na verdade, uma corrida contra o tempo para cumprir os prazos legais, prejudicados pela letargia do governador.
Em São Paulo, depois de muita negociação, ficou estabelecido que a Comissão Organizadora da Conferência Estadual seria formada por 39 titulares e seus suplentes, divididos paritariamente entre os representantes do poder público (13), da sociedade civil (13) e da sociedade civil empresarial (13); as vagas daquele setor que não conseguisse preencher sua cota seriam divididas entre os outros dois. Foi o que ocorreu – a sociedade civil empresarial indicou nove representantes, e as quatro vagas que sobraram foram divididas entre os demais. No final, ficou assim: Poder Público, 15; sociedade civil, 15; sociedade civil empresarial, 9.
Foi nessa correria que a Comissão Organizadora paulista instalou-se oficialmente em 5 de outubro, iniciando a discussão do regimento interno do evento – tudo a toque de caixa, para ganhar tempo para o debate mais substantivo, que envolve desde as providências materiais (infra-estrutura, propaganda, etc) até o debate das teses que os delegados paulistas defenderão na Conferência Nacional.
Apesar do empenho das entidades da sociedade civil que, mobilizada desde o início do ano, já acumularam uma extensa pauta de discussão, o estado de São Paulo, graças ao descaso de seu governador, está na rabeira do debate organizado e, principalmente, da organização da Confecom, processo em andamento em dezenove estados e no Distrito Federal. Mas São Paulo, onde estão as sedes das principais cadeias nacionais de comunicação – como a Editora Abril, as tevês Bandeirantes e Record, os jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, e que detém 60% do faturamento brasileiro do setor – claudicou, apesar das pressões feitas por quase uma centena de entidades da sociedade civil.
As protelações de José Serra não impediram, contudo, o início processo da Conferência, embora atrasado. Mesmo com tempo escasso, a Comissão Organizadora trabalha para definir as normas do debate do tema proposto pela portaria 667 (de 03/09/2009) do Ministro das Comunicações, "Comunicação: Direito e Cidadania na Era Digital", organizado em torno de seus três eixos temáticos, "Produção de Conteúdo", "Meios de Distribuição" e "Cidadania: Direitos e Deveres".
A discussão será árdua mesmo porque vai envolver temas fundamentais para o fortalecimento e consolidação da democracia brasileira. Ela envolve uma série de abordagens, como a busca de uma mídia democrática, a defesa da cultura nacional (e da produção de conteúdos nacionais); a construção de uma rede pública de comunicação com finalidade educativa, cultural e artística e que estimule a produção independente e regional; a abertura da "caixa-preta" representada pela lei de concessões e o respeito às normas constitucionais vigentes, que proíbem a formação de monopólios; a revisão dos critérios de distribuição das verbas publicitárias das várias esferas de governo, democratizando-a e descentralizando-a; o estímulo à rádio difusão comunitária e o investimento no processo de inclusão digital; o fortalecimento das publicações alternativas (convencionais e eletrônicas) ligadas às forças progressistas e aos movimentos sociais, fomentando a difusão ampla e múltipla das correntes de opinião e de pensamento presentes na sociedade brasileira.
Este é o desafio da conferência. Em São Paulo, ele corre contra o tempo para ter na conferência nacional um papel que corresponda aos desafios apresentados pela centralidade do estado neste importante segmento responsável pela difusão cultural e política. Segmento que é a arena privilegiada onde ocorre a luta pela garantia, ampliação e consolidação da democracia brasileira.
José Carlos Ruy é jornalista.
Publicado na Agência Carta Maior em 13/10/2009