Quem controlará os controladores?, Celso Schröder
Celso Schröder, coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e vice-presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), participou da mesa sobre Controle Público e Políticas Públicas, com o professor Venício Lima da Unb. O debate aconteceu no dia 11/09 pela manhã.
Schörder iniciou a exposição afirmando que as discussões sobre política pública de comunicação dentro do PT são praticamente inexistentes. O quadro se repete no governo petista, que não conseguiu emplacar projetos públicos para o setor. Segundo ele, esse vácuo é provocado pelas relações de forças no país, extremamente desfavorável no campo da comunicação.
Em seguida, Schörder analisou a construção do conceito de Controle Público e suas variáveis, focado na comunicação, usado pelos movimentos sociais e pelo próprio PT nas últimas décadas. Para entender esse construção, é necessário apreender que a democracia não é só a ação do Estado, que não representa todas as manifestações da sociedade. Como exemplo concreto de controle público, Schörder citou as experiências do Orçamento Participativo em Porto Alegre – que mostrou as dificuldades de aplicação, evidenciando a necessidade de vigilância constante dos agentes políticos e do PT sobre o processo que apresenta forte tendência de ser instrumentalizado.
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação tem como o eixo o controle público, com a cautela usual nos conceitos polêmicos. Este controle público, quando foi formatado o FNDC, era uma rede de controles que não estavam exclusivamente no campo do Estado e nem exclusivamente no campo privado, mas estavam no espaço público (Habermas). Ao citar Daniel Herz, Schorder afimou que havia um cuidado de produzir controles na Comunicação que não permitissem a apropriação autoritária, não-democrática, mesmo em nome da democracia.
A história do sistema de comunicação brasileiro justifica essa preocupação, pois foi construída numa tradição política autoritária, sob a tutela e o controle do Estado, representante da classe dominante. Após a ditadura de 64, os meios de comunicação encarnam essa classe dominante, e agem como partidos político, fazendo a transição para manter os privilégios da elite. A reação dos movimentos que defendiam a democracia ameçada por essa hegemonia era de enfrentamento, com o risco de fazer movimento partidário contrário, com as mesmas armas. Do ponto de vista da luta de classes seria correto, mas neste caso seriam empregada a mesma lógica instrumental de controle da elite, resultando num controle autoritário com sinal invertido.
A democracia se dará se o Estado estiver no meio das redes de controle da comunicação, com algum tipo de regulação e de legislação – fruto exclusivo das ações dos movimentos sociais, já que o sistema não aceita a ideia de regulamentação, assentado sobre o conceito liberal de liberdade de expressão, reafirmado nos processos de redemocratização do país. A luta sobre as liberdades pertence aos movimentos sociais e partidos de esquerda, mas é apropriada pelos donos dos meios de comunicação e constróem assim um movimento muito difícil de ser enfrentado tanto do ponto de vista conceitual como político.
O problema do controle do sistema de comunicação, como o que existe no Brasil hoje, é: quem controla os controladores? (Daniel Herz). Num sistema democrático, qual é o sistema de pesos e contrapesos que deve ser feito para este controle? E no atual cenário, em que uma nação é construída a partir de uma vontade privada? O próprio governo Lula, para constituir a governabilidade do país, precisa fazer acordos vísiveis para isso, incluindo não sinalizar políticas para o setor no primeiro governo, para não ser combatido como os anteriores.
Os limites do público e do social
Mesmo esse conceito de controle público elaborado (e defendido) pelo FNDC é insuficiente. Existem algumas experiências, como os conselhos e ombudmans. De acordo com Schörder, seria preciso ter sistemas difusos, legais e formais, junto com movimentos políticos que formatassem essa possibilidade de controle, assim como é o Orçamento participativo.
Mas neste momento, antecedendo a Confecom é necessário fazer uma análise da mudança do conceito político de controle público para controle Sscial, uma decisão que cabe nesta conferência. Dentro do conceito de controle social pode estar embutida a ideiQuem controlará os controladores?, Celso Schröder a de impor as ações e as demandas dos movimentos sociais, que mesmo sendo legítimas do ponto de vista da luta de classes, essa ação pode ser autoritária e manipulatória, do ponto de vista das políticas públicas contemporânea.
Essa questão se revela, por exemplo, quando o ministro Franklin Martins – militante dos anos 60 e que não participa dos movimentos de formatação da política dos anos 70 e 80 – compreende que o controle público é o Estado e ele rejeita esta ideia, porque sabe que o Estado não pode controlar a comunicação. As experiências históricas em que o Estado controlou a comunicação foram desastrosas, independente da orientação política, porque representou uma parte do público, e não o todo, criando situações despóticas em relação aos excluídos do seu circulo. O desafio do controle social é o de construir uma esfera pública onde esse debate possa ocorrer com todos na mesma igualdade de condições.
Espaço público para todas as vozes
Schörder afirmou que os movimentos sociais e o PT têm que afastar a ameaça de censura do controle social, garantido que todas as políticas a serem aplicadas na legislação tenham o aval da sociedade brasileira. Segundo ele, é com essa legitimação que o partido e os movimentos mostraram que estão fazendo pelo todo e não defendendo apenas o interesse de uma parte da sociedade.
As empresas de comunicação não querem essas políticas públicas, que afrontam seus príncipios neoliberais. Políticas públicas é o controle público, controle social e isso não interessa para os negócios e para o poder exercido pelos meios de comunicação.
Para o FNDC, a política pública seria uma articulação de um nível de um marco regulatório, seria uma articulação legal – de leis e regulamentos – oriundos do debate público brasileiro, porque o nível regulatório que existe hoje é insuficiente, autoritário e privado – oriundo de momentos que valeu-se da vontade de uma classe sobre a outra. Outro nível seria a articulação de agentes políticos existentes e que devem ser construídos. Um exemplo dessa articulação seria a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), hoje oriunda de um determinado modelo de privatização e que poderia ter um papel democrático. Outra instância, o Conselho de Comunicação Social, que deveria ter um papel mais efetivo e não que não dependesse da vontade dos presidentes do Congresso. E outros organismos podem ser construídos pela a Internet, não vinculados à um ministério, que fosse difuso e articulasse essa ação. E um terceiro nível de política pública seria a disputa da hegemonia, prevendo o esforço político de todas as áreas.
Ao concluir a exposição, Schörder ressaltou a necessidade de resistir à prática manipulatória e instrumentalizada da comunicação, num esforço de racionalidade e de superação para constituir espaços que possibilitem que as vozes “que não são as nossas” sejam ouvidas.
*Celso Schröder é coordenador-geral do FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação) e vice-presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas).
Por Evelize PachecoMais