Entrevista: Artur Henrique – CUT-Balanço do mandato
Artur, vamos começar pelos feitos que você considera os principais deste mandato.
Artur, vamos começar pelos feitos que você considera os principais deste mandato.
Eu destacaria, em primeiro lugar, o acordo do salário mínimo, que garantiu através das Marchas da Classe Trabalhadora e de uma negociação com o governo uma política de valorização que vai até 2023. Um acordo que agora traz a possibilidade de enfrentamento da crise com o incremento da renda e do consumo.
Outra ação importante foi nossa intervenção no Fórum Nacional da Previdência, quando todos diziam que havia intenções de fazer uma reforma da Previdência no sentido de retirar direitos, e a CUT se preparou, aliando diversos atores sociais, em defesa da Seguridade Social.
Em terceiro lugar eu destacaria também as grandes mobilizações contra a emenda 3, que que estabelecia a flexibilização de direitos trabalhistas. E em quarto, toda a luta que estamos desenvolvendo desde o início da crise, para apontar não só caminhos e propostas de enfrentamento, mas também para o pós-crise.
Há muitas outras ações que desenvolvemos, mas destacaria essas quatro.
Falando em crise, o que a sociedade pode esperar da CUT nessa luta?
Primeiro, a CUT desde o início dessa crise vem colocando com muita propriedade e energia qual a origem e quais os responsáveis pela crise: os responsáveis são os tucanos e os democratas que implementaram aqui no Brasil as políticas neoliberais do Consenso de Washington: Estado mínimo; desregulamentação; privatizações.
Em segundo, a defesa imediata de que para sair da crise é preciso proteger salários, emprego e renda e direitos dos trabalhadores. Tivemos uma reação forte logo no início da crise, porque outras centrais sindicais começaram a cair no canto da sereia de alguns empresários, de que era necessário fazer acordos de flexibilização dos direitos trabalhistas para enfrentar a crise. Nós saímos a campo imediatamente. Além disso, é preciso continuar reduzindo os juros, derrubar o superávit primário e continuar os investimentos públicos, não só em projetos que gerem emprego e renda, mas manter principalmente os programas sociais. Agora, nós temos que pensar também no pós-crise, o que será o Brasil que vai sair dessa situação.
O pós-crise passa necessariamente pela criação de novos instrumentos. Que instrumentos são esses?
Essa é uma crise grave do capitalismo. Uma crise que começou com caráter financeiro mas assumiu outras dimensões, um caráter de crise ambiental, alimentar e energética, e esses elementos têm de ser analisados quando discutimos a conjuntura. Precisamos discutir um novo modelo de desenvolvimento. É lógico que para nós, que sempre defendemos a superação do capitalismo e da transformação da sociedade rumo ao socialismo, essa questão continua sendo o foco ideológico importante. Mas nós não somos daqueles que acreditamos que a crise do capitalismo faz inexoravelmente que nós tenhamos a implementação do socialismo de um dia para o outro.
Com certeza não há uma fórmula pronta, e ela tem de ser construída ao longo do processo. Uma proposta que tenha democracia no centro, maior controle da sociedade sobre os vários instrumentos do estado, sobre o Judiciário, sobre o Legislativo.
Por outro lado nós não podemos continuar tendo instituições tais como FMI, o Banco Mundial, G-20, OMC, que não levaram em consideração o ser humano, o meio ambiente, e o trabalho na centralidade que deve ter.
Paralelamente, temos a questão do meio ambiente. Estou falando aqui de estabelecer novos mecanismos de produção e de consumo. Por exemplo, temos de pensar num novo modelo agrícola que privilegie mais a produção familiar. No governo Lula, saímos de um patamar de investimentos no Pronaf (Programa Nacional de Apoio à Agricultura Familiar) de R$ 2 bilhões para algo em torno de R$ 15 bilhões. Mas se você olhar a safra 2009-2010, nós estamos falando em R$ 107 bilhões de investimentos totais. Então, são R$ 92 bilhões que estão sendo direcionados para o agronegócio. Esta diferença tem de ter uma rediscussão.
Outro debate importante para nós é estabelecer novas formas de controle social. Mais democracia direta e menos democracia representativa.
Como o controle social pode ser exercido numa empresa pública, ou junto ao poder Judiciário, por exemplo?
Nós já temos uma série de instrumentos já implementados no Brasil. Se você analisar o Sistema Único de Saúde, há um Conselho Nacional de Saúde, de caráter deliberativo, com participação tripartite, que é uma clara demonstração de que é possível trabalhar com controle social sobre uma área importante e de grandes dimensões, com poder de decidir os rumos do sistema.
Quando falamos de democratização dos meios de comunicação, estamos falando também da participação da sociedade na programação das emissoras de TV. Por que não abrir para que as TVs estabeleçam espaços de educação ambiental em horário nobre? Falo aqui em utilizar as TVs como instrumentos de educação, de formação das pessoas. Há ainda a necessidade de regulamentar o artigo 14 da Constituição, para colocar os grandes temas do Brasil para análise de plebiscitos e referendos. Temos de avançar mais, por exemplo, no controle do Judiciário, que sempre se estabeleceu como um poder acima dos outros. A situação exige da parte de nossa Central e dos movimentos sociais a criação de novas propostas para controle do Judiciário.
São tarefas como essa que serão discutidas no 10º Congresso Nacional da CUT. Do Congresso sairá uma CUT mais fortalecida?
Espero que sim. Vamos debater no Congresso duas grandes ações para o próximo período. A primeira é a necessidade de enfrentamento da crise e a construção do novo cenário pós-crise.
A segunda linha de nossa estratégia é a ampliação de base de representação da CUT. Como nunca fizemos antes, entrar de fato nas organizações empresariais, organizar os trabalhadores a partir de seus locais de trabalho, constituir comissões sindicais por empresas, discutindo as mudanças no mundo do trabalho, mas não só isso. Temos de estar lá para discutir a participação dos trabalhadores na gestão dos sindicatos, na definição das políticas dos sindicatos.
Está previsto que no Congresso a Central vai fechar um acordo com o Ministério do Meio Ambiente para que os sindicatos tenham papel ativo na questão ambiental. Você quer falar um pouco sobre isso?
Este eu acho que vai ser um novo marco numa discussão que não é nova na CUT, mas sobre a qual a gente nunca havia conseguido construir uma proposta mais concreta. Ao se estabelecer consulta pública para definir regras ambientais para um determinado empreendimento ou projeto, queremos que o movimento sindical e os trabalhadores tenham voz e voto para concessão de licença ambiental.
Depois de concedida a licença, existirá a possibilidade clara de o movimento sindical acompanhar o cumprimento das condicionalidades previstas.
Um terceiro ponto é como garantir que as CIPAs tenham também caráter de CIPA ambiental. Ou seja: essa fábrica polui o rio? Essa fábrica produz ruído nocivo à comunidade? Esse acordo aponta para intervenção dos trabalhadores na discussão ambiental e uma outra forma de ampliar a organização e permitir a discussão política.
Como eu disse, nós precisamos mudar o modelo agrário brasileiro. E isso passa por discutir o limite da propriedade da terra. Todos os países desenvolvidos, e estou falando de países capitalistas, realizaram a reforma agrária. O Brasil ainda não fez. Nós temos também uma situação em que o Congresso Nacional tem uma bancada ruralista muito forte, e que por causa disso ainda não aprovou por exemplo a PEC do trabalho escravo. Segundo, a gente não tem ainda a aprovação do limite da propriedade da terra. Tem pessoas aqui que têm mais terra de propriedade privada do que um país inteiro da Europa. Isso é um absurdo.
Tomando como gancho o comentário sobre o Congresso conservador, vamos falar um pouco de eleições 2010.
Penso que essas eleições 2010 serão as principais eleições do Brasil nos últimos anos. Lógico que foi importante 2002, quando chegamos à eleição de um presidente operário, a partir de uma aliança com setores empresariais, que foi uma eleição de um projeto. Desde então passaram-se quase oito anos que mostram que é possível avançar principalmente nas questões sociais. É um governo que tem correlação de forças, de diferentes interesses, e também convivendo com deputados e senadores com muitas dificuldades de aprovar nossa pauta e que ainda querem nos impor uma agenda negativa.
Tudo isso vai estar em disputa nas eleições do ano que vem. Ou nós vamos ter um retrocesso, com a eleição de um tucano, ou teremos a continuidade de um projeto democrático popular que não precisa apenas continuar, mas avançar. Mais poder popular, mais intervenção do cidadão nas decisões nacionais.
Para essa disputa estamos produzindo nossa Plataforma da Classe Trabalhadora para as Eleições 2010, a partir dos debates com nossas bases, em todo o País. Não teremos dúvida em colocar nosso bloco na rua, quem sabe colocar a primeira mulher na Presidência da República.
Até lá, temos compromissos a arrancar deste governo, como uma nova lei do petróleo. Há ainda a Embraer, a Infraero, a Vale do Rio Doce, enfim, a redefinição do papel do Estado.
No caso da Vale e da Embraer, queremos mostrar que foram doadas, ou entregues, ou vendidas a preços bastante módicos, com promoções para investidores que se utilizaram do Estado, que demitiram ao primeiro sinal da crise.
No caso da Infraero, nós achamos que é preciso atrair a iniciativa privada para investir, mas não para comprar o que está pronto.
Em relação à Petrobrás, a descoberta do pré-sal exige a suspensão dos leilões e uma nova lei de petróleo para que toda a sociedade seja beneficiada através de um fundo soberano voltado a saldar a dívida social.
Pra encerrar, vamos falar da luta dos aposentados.
Estamos defendendo duas questões essenciais. Há 16 milhões beneficiados pelos reajustes do salário mínimo. Há outros 8 milhões que ganham acima do mínimo e que portanto precisam de um tratamento diferente. Nós queremos nesse governo uma proposta de aumento real. Mas queremos também uma mesa de negociação permanente para se discutir a pauta dos aposentados: medicamentos, transportes, políticas públicas e outras.
Quer falar alguma coisa do projeto CUT 30 Anos?
Nós estamos lançando a ideia de iniciar desde já um projeto de resgatar a história, a memória e a importância de nossa central para uma grande festividade de comemoração dos 30 anos da CUT. Fotografias, videos, depoimentos, entrevistas, e transformá-los em um filme, talvez, ou em livro.
Das coisas que a CUT não fez nesse mandato…
A mudança da estrutura sindical. Apesar da importância do reconhecimento das centrais, o fim do imposto, a liberdade e autonomia sindical, a ratificação da Convenção 87 da OIT e a organização no local de trabalho são desafios que ainda estão colocados em nosso horizonte.