Edição 35 – Junho de 2009

Senado colombiano aprova referendo da reeleição

O Senado colombiano aprovou no dia 19 de maio a realização de um referendo para a população decidir se aceita ou não que o atual presidente Álvaro Uribe concorra um terceiro mandato, a rigor impedido pela Constituição do país que ele, aliás, já alterou para buscar a reeleição e o atual mandato.

Como o texto aprovado pelo senado se difere do que foi aprovado na Câmara de Deputados, ambos terão que ser conciliados e depois enviados para a Corte Constitucional confirmar ou não a sua constitucionalidade. De qualquer maneira, as eleições presidenciais estão previstas para se realizar em fevereiro de 2010.

O quadro sobre o que acontecerá ainda é incerto. Já se apresentam alguns pré-candidatos do Partido Conservador que faz parte da base aliada de Uribe, alguns inclusive afirmando que farão campanha pela abstenção se o referendo for ratificado pela Corte.

O atual ministro da defesa, Juan Manuel Santos, também se lançou como pré-candidato, mas declarou que retira a candidatura se Uribe puder concorrer ao terceiro mandato.

Entretanto, há pouco se revelou um novo escândalo, entre os tantos que já apareceram durante seus dois mandatos. O atual envolve seus dois filhos em supostos favorecimentos na negociação de contratos com o governo.

Por outro lado, há analistas que afirmam que ele prefere sair agora no seu auge de popularidade e que as iniciativas legislativas em busca do terceiro mandato seriam apenas uma “cortina de fumaça” para ganhar tempo e assegurar a escolha de um Procurador Geral da República que não vá incomodá-lo no futuro com processos devido à ligação de seus colaboradores no governo com paramilitares ou o caso dos “falsos positivos” onde se descobriu que militares seqüestravam e assassinavam jovens da periferia os quais apresentavam como membros de grupos guerrilheiros para receber promoções e recompensas, bem como para justificar a necessidade da onipresença do exército. Motivos para processar o presidente não faltam.

Por sua vez, o partido político progressista Pólo Democrático Alternativo (PDA), vem se preparando para as eleições com a perspectiva de enfrentar Uribe pela terceira vez. Porém, dividiu-se quanto a estratégia eleitoral mais adequada a ser seguida. Dois membros importantes do partido, Luiz Eduardo Garzón, ex-prefeito de Bogotá e o senador Gustavo Petro, defendem que deveria ser convocada uma prévia envolvendo candidatos do PDA, Partido Liberal e independentes já para o primeiro turno, onde todos apoiariam o candidato escolhido fosse de que partido fosse.

Porém, a maioria do partido é favorável a definição de um programa e disputa com os demais no primeiro turno para afirmar a identidade do PDA frente aos problemas colombianos e que alianças seriam feitas apenas num eventual segundo turno. Diante disso, tanto o PDA quanto o Partido Liberal decidiram realizar suas respectivas prévias internas. Leia mais em: Precandidatos conservadores se dividen frente al referendo reeleccionista, no El Tiempo; El Polo Democrático se enfrentará solo a las elecciones presidenciales, no miSemana.com; Admite ex líder paramilitar apoyo a candidatura de Uribe , em milenio.com; e Análisis – El Fiscal que llega y la reelección, em semana.com.

A Situação da Guatemala

O governo do presidente Alvaro Colom inaugurado a pouco tempo foi abalado pelo assassinato do advogado e empresário, Rodrigo Rosenberg no dia 10 de maio. Diferentemente das outras 6.000 pessoas que morrem em média por ano devido a alta criminalidade na Guatemala, ele deixou um vídeo gravado quatro dias antes de sua morte onde acusava o presidente pelo seu eventual assassinato com ajuda de sua esposa, do chefe de gabinete – Gustavo Alejos e de um empresário chamado Gregorio Valdez.

O motivo mencionado na gravação seria o fato de um cliente de Rosenberg, Khalil Musa – outro empresário ter sido indicado por Colom para compor a diretoria do BANRURAL, um banco estatal de fomento. Este teria sido assassinado em abril supostamente por ameaçar revelar esquemas de corrupção no banco e, diante disso, Rosemberg também estaria ameaçado por “saber demais”.

Obviamente o presidente e demais acusados negam a procedência da acusação, apoiados pelo argumento que o seu governo, ao contrário dos anteriores, busca por todos os meios, inclusive, com ajuda das forças armadas, combater o crime organizado que se tornou endêmico no país. Aliás, esta participação do exército neste particular é objeto de fortes críticas dos aliados mais à esquerda de Colom devido ao histórico de repressão contra grupos de oposição às diferentes ditaduras que grassaram na Guatemala. Particularmente nos anos 1970 até o final dos anos 1990. A repressão violenta que as forças armadas desencadearam nesse período matou mais de 30.000 pessoas.

Porém, em relação às acusações contra o presidente Colom, ele recebeu a solidariedade e o apoio da esquerda guatemalteca e também do exterior.

Há suspeitas que tudo possa ser um complô da direita derrotada nas eleições presidenciais, uma vez que o autor da gravação e reprodução do vídeo, Mario David Garcia, é um comentarista político conservador que nos anos 1980 expressava apoio aos governos militares e aos golpes.

Além disso, na gravação, o advogado Rosenberg aparentava uma tranqüilidade anormal para um ameaçado de morte e tampouco adotou maiores medidas de segurança, o que também seria de se esperar. De todo modo espera-se a conclusão da investigação do Procurador Geral da República para quem Álvaro Colom já pediu apoio da ONU e do FBI dos EUA para realizar o trabalho. Leia mais em: Crime and politics in Guatemala – An indictment from the grave, no The Economist; e El oficialismo guatemalteco, gravemente herido por el caso Rosenberg, no sítio cope.es.

Reunião da OEA

A 39ª Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) realizou-se na cidade de San Pedro Sula em Honduras nos dias 2 e 3 de junho. O tema sob o qual os 34 países membros se reuniram era “Rumo a uma cultura de não violência”, proposto pelo país anfitrião.

A agenda estava repleta de temas rotineiros como os informes das diferentes instâncias da Organização, Gripe Suína, Haiti, Cooperação com o Sistema Avançado de Informações sobre Passageiros, entre outros, mas o que dominou e repercutiu na imprensa mundial foi a discussão de uma resolução sobre o retorno de Cuba a OEA de onde foi excluída em 1962.

Revogar a decisão adotada 47 anos atrás no auge da Guerra Fria seria um primeiro passo para também resgatar a OEA dos ditames que nortearam a criação da Organização em 1948, embora haja vários governos de países latino americanos que atualmente questionam sua utilidade.

Assim como ocorreu na recente Cúpula de Chefes de Estado das Américas em Trinidad & Tobago, a maioria dos países da América Latina debateu com o governo dos Estados Unidos e seus aliados no continente – que não são muitos atualmente, basicamente Canadá, Colômbia, Peru e México – a questão da normalização das relações com Cuba, em particular o fim do bloqueio dos EUA a ilha e sua reintegração ao sistema interamericano.

A resolução aprovada por consenso na Assembléia da OEA, após intensas negociações, revogou a suspensão de 1962 e propõe a reintegração de Cuba como membro da OEA de acordo com as normas e procedimentos da Organização. Apesar da obviedade da segunda parte, esta foi a fórmula encontrada para evitar o condicionamento de um eventual retorno, proposto pelos EUA.

O governo cubano saudou a resolução, mas declarou que não pretende retornar a OEA, exatamente pelo seu histórico de apoio às intervenções americanas para depor governos progressistas em vários países do continente como Guatemala, República Dominicana, entre outros. Leia mais no site da OEA .

Haverá mudanças na política americana para o Oriente Médio?

Pela primeira vez em mais de quarenta anos, a política externa dos Estados Unidos não está totalmente alinhada à Israel. Isso não significa que o governo norte-americano mudará sua política de apoio militar e financeiro ao estado israelense, mas nenhum dos presidentes americanos – desde que John F. Kennedy tentou impedir Israel de desenvolver armas nucleares – havia questionado para valer qualquer tomada de decisão do aliado no Oriente Médio.

Em 18 de maio, o presidente Barack Obama encontrou-se em Washington com o primeiro-ministro israelense, empossado em março, Benjamin Netanyahu para discutir a proposta para a paz no Oriente Médio através da criação de um Estado Palestino, a chamada “Solução dos Dois Estados”.

O novo governo israelense tem evitado falar em “Estado Palestino”, embora declare que não é contrário à proposta de os palestinos “desenvolverem sua própria economia” desde que haja reconhecimento e manutenção da legitimidade de Israel como estado judaico e que sua segurança seja garantida.

Entretanto, o encaminhamento desta proposta, entre outras medidas, pressupõe que Israel congele a construção de novos assentamentos para negociar a criação do novo Estado na região.

Dez dias após o encontro com Netanyahu, o presidente Obama reuniu-se também com o presidente palestino Mahmoud Abbas. A visita palestina em si não levantou muito interesse da mídia local. Contudo, uma declaração da secretária de Estado Hillary Clinton, no dia anterior, requisitando de Israel o congelamento total das construções na Cisjordânia, surpreendeu os oficiais do governo israelense.

O tema havia sido discutido no encontro com Netanyahu em Washington, mas nenhuma declaração mais forte havia sido feita. As palavras de Hillary Clinton foram: “Obama quer ver um fim aos avanços dos assentamentos – não de alguns, não apenas de postos avançados e nenhuma exceção deverá ser justificada pelo crescimento natural”, mencionando justificativas normalmente ouvidas de Israel.

Em 1993, na época do acordo de Oslo, os assentados na Cisjordânia ocupada eram 200.000 israelenses, hoje chegam a 443.702, em números de 2006 da respeitada organização israelense de defesa dos direitos humanos B’Tselem (Israeli Information Center for Human Rights in the Occupied Territories). Especula-se que hoje, os números variam de 500.000 a 600.000 israelenses vivendo nos assentamentos. Leia mais em: Estatísticas sobre a população nos assentamentos na Cisjordânia.

Israel respondeu ao chamado norte-americano dizendo que a vida nos assentamentos prosseguirá normalmente fazendo com que Barack Obama declarasse que a intransigência israelense na questão dos assentamentos coloca em perigo a manutenção da segurança dos Estados Unidos reforçando a idéia de que a ocupação é o principal obstáculo à negociação do território palestino.

No entanto, apesar desta posição mais dura com Israel, Obama reafirmou a posição do ex-presidente George W. Bush ao declarar apoio à posição do presidente palestino em sua recusa de formar um governo de unidade com o Hamas até que o grupo reconheça a existência de Israel e abandone o recurso a violência. Este argumento foi considerado um erro pelos que já criticavam a política de Bush de insistir na retórica de que o Hamas é um grupo terrorista e contribuir para a fragmentação da política palestina.

Estes encontros com os líderes de Israel e Palestina eram parte do processo preparatório para a primeira visita que Obama faria ao Oriente Médio como presidente eleito no início de junho. Às vésperas de eleições no Líbano e no Irã, Barack Obama discursou no Egito, em 4 de junho, país considerado aliado em relação às principais preocupações dos americanos na região como o conflito entre palestinos e israelenses e o contencioso com o Irã. O conteúdo como outros discursos foi o de propor um novo começo nas relações entre EUA e países árabes e ele voltou a defender o fim dos assentamentos israelenses e a criação do Estado Palestino. O seu “quase pedido de desculpas pela desmesurada reação americana em função do 11 de setembro” gerou fortes críticas dos conservadores dos EUA, mas o discurso agradou ao público americano em geral.

Porém, o seu representante especial para o Oriente Médio, George Mitchell, em visita a Israel depois do discurso no Cairo amenizou dizendo que “as discordâncias entre EUA e Israel não eram entre adversários, pois os dois países continuam amigos e aliados próximos”.

A intenção de Obama foi a de tentar convencer os árabes de que ele busca mudanças reais no Oriente Médio, mas antes de sua visita seu vice-presidente Joe Biden ao Líbano a fim de estreitar as relações com os partidos políticos aliados a Washington. Isto porque haveria eleições parlamentares neste país poucos dias depois da visita do presidente dos EUA à região. O povo libanês acabou dando a maioria no poder legislativo, 71 cadeiras a uma coalizão de partidos de direita, simpáticos aos Estados Unidos, e 57 cadeiras à oposição composto pelos Xiitas do Partido Amal, Cristãos ligados ao líder nacionalista Michel Aoun e o Hezbollah. Este grupo por sua vez afirmou que o discurso de Obama não apresentou nenhuma mudança estratégica na política externa dos Estados Unidos. Leia mais em: In Lebanon: Hezbollah Says Visit Interferes With Election, no Huffington Post.

Como as pesquisas não mostravam resultados definidos, o governo norte-americano esperava que o discurso de Obama tivesse alguma influência na atual visão dos árabes sobre o Ocidente e os EUA. O mesmo se aplicava, em menor escala, ao pleito iraniano. No entanto, nas eleições presidenciais iranianas de 12 de junho foi proclamado vencedor o atual presidente e candidato à reeleição Mahmoud Ahmajinedad. Porém, este resultado foi questionado principalmente pelo segundo colocado Mir Hossein Mousavi e seus seguidores. Apoiadores de ambos os lados têm realizado grandes manifestações públicas, cujo desdobramento ainda é imprevisível.

Contudo, alguns críticos afirmam que falta ao presidente demonstrar uma visão estratégica sobre o Oriente Médio, além de força política e determinação para alcançar algum avanço concreto. Porém, ele parece reconhecer os perigos da posição mais extrema do governo direitista de Israel. Ao ser questionado sobre a belicosidade de Netanyahu com relação ao Irã, Obama declarou que: “a paz entre árabes e israelenses deve facilitar e preceder a resolução da questão iraniana e não o contrário”.

A sucessão presidencial norte americana e a escolha de Obama mudou um pouco o clima político no Oriente Médio em relação ao governo americano, pois 48% dos entrevistados em uma pesquisa realizada em toda a região, no início de maio, apontavam ser simpatizantes do mandatário norte-americano e nos Estados Unidos sua popularidade se mantém alta apesar das dificuldades criadas pela crise e as guerras no Afeganistão e Iraque ainda em desenvolvimento. Segundo levantamento do Gallup realizado durante todo o mês de maio e divulgado no dia 29, ele tem 65% de aprovação no exercício do cargo, mantendo o mesmo percentual desde sua posse. Leia mais em: More popular than U.S. among Arabs, na Reuters; e Pesquisa Gallup de maio de 2009.

A esperança do povo americano de que Obama possa cumprir a promessa de campanha de trazer mudanças reais na era pós-Bush continua sendo alimentada nestes primeiros meses de governo. Resta saber se o seu governo saberá utilizar esta janela de oportunidade antes que ela se feche. Leia mais em: President fails to reassure Israel’s prime minister, no The Economist; Six Issues That Divide Bibi from Barack, na revista Time online; Peace in Palestine, no The Nation.

Crise do parlamento inglês

O parlamento britânico está em crise desde que uma série de reportagens publicada, iniciada em 8 de maio, pelo jornal inglês Daily Telegraph demonstrou uso indevido da verbas de gabinete por parte de vários parlamentares.

Como a maioria dos parlamentares mantém duas moradias, uma no distrito que representam e uma em Londres, o Parlamento permite que sejam reembolsados os custos de manutenção de uma segunda residência. No entanto, os detalhes de como isso era feito nunca haviam sido expostos até que o jornal mencionado teve acesso a cópias de solicitações de reembolso.

A partir destes documentos, membros do parlamento foram acusados de fazer gastos extravagantes, de exagerar nos pedidos de reembolso e de burlar o pagamento de impostos em vendas de imóveis.

Os primeiros expostos foram ministros de governo e, em seguida, um grupo de outros políticos do Partido Trabalhista, uma vez que o jornal é abertamente conservador. Contudo, depois também denunciou alguns parlamentares do Partido Conservador. Quando chegou a vez dos Liberais, o parlamento estava em crise e no dia 11 de maio o primeiro-ministro Gordon Brown pediu desculpas publicamente, em nome de toda a classe política.

Mesmo assim, o escândalo do mal-uso das verbas causou a queda do presidente da Câmara dos Comuns, Michael Martin, acusado de tentar acobertar o caso. Martin foi o primeiro presidente da Câmara dos Comuns a renunciar desde 1695, ano em que John Trevor teve que renunciar depois da revelação de que aceitara dinheiro para apoiar uma lei.

O presidente da Câmara já vinha sendo criticado por ter se oposto a propostas de tornar os gastos do parlamento públicos.

Antes dele, a crise havia feito sua primeira vítima no ministério de Gordon Brown, com a renúncia do subsecretário de Estado da Justiça, Shahid Malik. Malik apresentou a renúncia, mas prossegue a investigação para esclarecer se ele abusou do uso dos recursos para o aluguel de uma de suas casas. Posteriormente, outros quatro ministros também renunciaram.

O premiê Gordon Brown fez uma proposta de reforma do Legislativo e de aumento de sua transparência. Porém, a iniciativa aparentemente não serviu para livrá-lo da ira popular. De acordo com uma pesquisa publicada pelo diário “The Guardian”, 69% dos britânicos consideram que o primeiro-ministro não lidou bem com o escândalo. Por outro lado, para 55% das 1.002 pessoas entrevistadas, a atuação do líder dos conservadores, David Cameron, foi bem mais convincente.

O ocorrido afetou os resultados das eleições locais para escolher os representantes dos 27 condados da Inglaterra e para Parlamento Europeu. Os Conservadores alcançaram 38% dos votos, os Liberais-Democratas chegaram em segundo lugar com 28% dos votos e os trabalhistas amargaram um humilhante terceiro lugar com 23% dos votos, o pior resultado da história do partido.

Apesar das pressões, inclusive internas do Partido Trabalhista, Gordon Brown se recusa a renunciar ao cargo e antecipar a convocação das eleições parlamentares nacionais previstas para 2010. Pelo contrário, aproveitou a crise para promover uma reforma ministerial e tentar recuperar algum nível de governabilidade que permita aos trabalhistas renovarem o mandato no governo, mesmo em aliança com os Liberais-Democratas.

Porém, analistas avaliam que a opinião pública poderá se revoltar ainda mais e aprofundar a crise com novas divulgações de gastos que estão surgindo como o reembolso pelo uso de estrume nos jardins da casa de um deputado e o uso de verbas para financiamentos residenciais não existentes de outros, ainda mais, em tempos de crise econômica e desemprego.

Embora haja consenso sobre a necessidade de uma reforma no sistema, os parlamentares não conseguem chegar a um acordo sobre como substituir o esquema vigente. Entre as diferentes propostas, há planos para a criação de um órgão independente de auditoria para analisar e julgar caso a caso os pedidos de reembolso dos parlamentares.

Presidente alemão é reeleito

O presidente da Alemanha, Horst Köhler, foi eleito para cumprir um segundo mandato no dia 23 de maio. Ele que também já foi diretor geral do FMI foi escolhido pelo colégio eleitoral alemão, composto pelos membros do parlamento e representantes dos Estados, no primeiro turno pela diferença de um voto, evitando uma derrota da Chanceler Angela Merkel que o apoiava.

Köhler obteve 613 votos de um total de 1.224 contra seu principal oponente do Partido Social Democrata (SPD), Gesine Schwan, que obteve 503 votos e contra o candidato do “Die Linke” (Esquerda), Peter Sodam, que ficou com 91 votos.

No entanto, a vitória dependeu de 10 votos conservadores de um pequeno partido dao estado da Baviera “Die Freie Waehler” (Os Eleitores Livres).

Há um limite de dois mandatos com cinco anos cada de duração. Embora a presidência da Alemanha seja um cargo quase cerimonial, a presente disputa antecede as eleições parlamentares em setembro próximo e aponta algumas tendências como a vitória do Partido Democrata Cristão de Angela Merkel e a dificuldade da união entre os sociais democratas e a esquerda.

França inaugura nova política para a região do golfo Pérsico

No final de maio, o presidente francês Nicolas Sarkozy visitou os Emirados Árabes Unidos (EAU) a fim de inaugurar a primeira base militar francesa fora de território francês e africano em Abu Dhabi. Apesar de ser uma instalação pequena, para receber de 400 a 500 homens, a base naval representa uma novidade na política externa francesa para a região, pois muda o investimento na proteção de seus interesses nas ex-colônias na África para um papel estratégico no Oriente Médio.

Com a inauguração desta instalação, a França também muda seu papel tradicional na política complexa da região do golfo Pérsico, como mera fornecedora de armas, para, num primeiro momento, exercer pressão sobre o Irã acusada pelos EUA e União Européia de buscar armamento nuclear, embora Sarkozy fizesse amplo lobby em favor de multinacionais francesas, inclusive da Dassault – fabricante de aviões militares, com amplos interesses em fazer negócios nos Emirados.

Segundo o presidente francês, a instalação da base naval foi sugerida pelos Emirados, mas o acordo “coincidentemente” foi assinado durante uma visita conjunta com o ex-presidente dos EUA George W. Bush à região no início de 2008, durante a qual o Irã foi muito criticado.

Este passo significa um alinhamento mais claro da França com os Estados Unidos, que mantém sua base militar de grande porte no Bahrain e que também fornece armas para os países do golfo, podendo no futuro também representar uma alternativa à presença norte-americana. Ainda não é possível saber o exato papel desta presença francesa na região.

A França tem sido um forte defensor do aumento das sanções ao Irã por não cumprir com as especificações do Conselho de Segurança da ONU na questão do enriquecimento do urânio. Nesta visita a Abu Dhabi, vizinho do Irã, a poucas semanas da eleição presidencial iraniana, Sarkozy declarou em tom ameaçador: “Agora as autoridades iranianas terão que escolher: retornam aos mandatos da comunidade internacional ou enfrentarão… mais isolamento”. Leia mais em: Sarkozy inaugure la base militaire française d’Abu Dhabi, no Le Monde.

Eleições para o Parlamento Europeu

O resultado das eleições para o Parlamento Europeu confirmou no geral, o que já se delineava em determinados países da União Européia. Em primeiro lugar o desinteresse no voto com uma abstenção de 60% e segundo a queda da socialdemocracia e da esquerda e terceiro o crescimento da extrema direita.

A mídia mundial vem destacando que a centro-direita/direita teria sido a grande vencedora, o que não é bem assim. O bloco dos liberais e a coalizão “Partido Popular”, com respectivamente 80 e 263 deputados, conformam o maior agrupamento (46,6%) do Parlamento Europeu de 736 integrantes, mas perderam 13 cadeiras em relação à eleição de 2004.

No campo da centro-esquerda/esquerda, os social democratas perderam 39 vagas, a esquerda perdeu oito e os verdes ganharam dez. Esta representação agora é de 33,4% quando votam alinhados, o que nem sempre é o caso como na votação da infame “Diretriz de Retorno” em 2008, quando muitos social democratas votaram com a direita.

Os social democratas deverão sair de governos em países importantes como na Alemanha e Inglaterra e têm pouca expectativa de voltar ao governo no curto prazo em países como Itália e França. Na Espanha a disputa foi acirrada, embora o Partido Popular tenha obtido ligeira vantagem (42% a 38%) sobre o PSOE. Na Dinamarca, Suécia, Bélgica e Grécia, os socialdemocratas foram os mais votados, mas estão na oposição. Esse fato lhes dá algum alento de que possam retornar ao governo nas próximas eleições. Fora estas possibilidades, há a expectativa de que a coalizão vermelha e verde (Partido Trabalhista e Partido dos Camponeses) consiga se reeleger em setembro na Noruega que não faz parte da União Européia.

A extrema direita xenófoba e, inclusive, crítica a União Européia foi a que mais cresceu saindo de 29 para 93 deputados. Até o neofascista Partido Nacional Britânico elegeu três parlamentares.

O quadro político europeu é sombrio e a depender dos desdobramentos da crise econômica, poderá piorar afetando diversas políticas na esfera internacional, como assistimos a pouco em relação aos imigrantes.

Grilagem de terra na África

Vários países africanos estão disponibilizando terras para estrangeiros quase de graça. É o que demonstra um relatório recente produzido por dois organismos da ONU, a Organização para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (IFAD), com apoio de um instituto de pesquisas da Inglaterra chamado International Institute for Environment and Development (IIED).

O relatório com o título “Tomada de terras ou oportunidade de desenvolvimento” analisa a tendência de países ricos como a Arábia Saudita e a Coréia do Sul investir na aquisição de terras no exterior como forma de garantir a segurança alimentar de suas populações ao exportarem toda a produção de volta aos seus países.

Ganhou notoriedade uma compra de grande porção de terra pela empresa sul coreana “Daewoo Logistics” em Madagascar e que por esse motivo provocou a queda do presidente do país. Leia mais em: Periscópio Internacional nº 33.

Embora os neoliberais de plantão argumentem que os investimentos podem contribuir para o desenvolvimento africano, dirigentes da FAO alertam para os riscos desse neocolonialismo. O relatório que realizou estudos na Etiópia, Gana, Sudão, Mali e Madagascar argumenta que cerca de 2,5 milhões de hectares de terras de alta qualidade, equivalente a metade das terras aráveis da Inglaterra, já foram vendidos a preços aviltantes.

Além disso, a maioria dos contratos são extremamente simples e vagos quanto aos compromissos de geração de empregos, investimentos em infra-estrutura e segurança alimentar local. O acesso da população local a fontes de água no interior dessas propriedades também fica sob risco.

As grandes corporações multinacionais de alimentos vêem a possibilidade de obter grandes lucros com esta prática, pois os preços internacionais de alimentos continuam altos apesar da crise. Leia mais em: Financial Times edição de 25/05/2009.

Aproximação entre China e Taiwan

Em um sinal da melhoria das relações entre China e Taiwan, o presidente chinês Hu Jintao reuniu-se em 26 de maio com o líder do partido governista de Taiwan, Kuomintang (KMT), Wu Poh-hsiung, a fim de reafirmar acordos para melhorar as relações trans-estatais e o desenvolvimento econômico dos dois países.

Os dois líderes reafirmaram a posição acordada em 1992 quando o Kuomintang compunha a oposição taiwanesa, contrária à independência total de Taiwan e apesar do histórico de contenciosos, os dois países avançaram em uma série de assuntos durante o último ano.

Em abril, a China permitiu que, pela primeira vez, Taiwan participasse como observador da Assembléia da Organização Mundial da Saúde (OMS). Desde que a representação da China nos organismos internacionais foi assumida pela República Popular da China, as autoridades de Taiwan não haviam se apresentado diante de nenhum órgão da ONU, salvo na Organização Mundial de Comércio (OMC) onde participa com o status de “Zona de Representação Econômica”.

Além disso, os dois lados também chegaram a alguns acordos concretos com o estabelecimento da primeira linha aérea ligando Taiwan à China continental e o aumento em dez vezes as visitas provenientes da China a Taiwan.

A visita reforça a aproximação iniciada em 2008, após o Kuomintang vencer a eleição presidencial, substituindo o independentista partido Progressista Democrático. O presidente Ma Ying-jeou rejeita a posição chinesa de soberania sobre a ilha de Taiwan, mas tem buscado reforçar os laços econômicos com a China e o diálogo entre seu partido e o Partido Comunista Chinês.

Um dos temas do encontro foi discutir uma maior abertura de Taiwan para investimentos chineses, tema controverso em alguns círculos em Taiwan que questionam a permissão para que a China possa investir em infra-estrutura e setores estratégicos da economia, embora empresários “taiwaneses” realizem grandes investimentos na China há vários anos. Leia mais em: Hu meets KMT chairman, achieving “important progress”, na agência Xinhua.

Resultado das eleições indianas

O Partido do Congresso Indiano (CPI) venceu as eleições parlamentares em coalizão com alguns partidos aliados e governará sem necessidade de fazer alianças com outras coalizões, ao contrário das análises que previam a necessidade de qualquer um dos vitoriosos compor com uma miríade de partidos regionais priorizando interesses locais invés dos temas nacionais.

A principal coalizão de oposição, um agrupamento nacionalista de direita, o BJP, que esperava tirar vantagens do ataque terrorista a Mumbai ocorrido em novembro de 2008 ficou muito aquém do esperado.

Os partidos de esquerda liderados pelo Partido Comunista da India – Marxista (CPI-M) e que formaram a “Terceira Frente” junto com alguns partidos regionais, chegaram a aventar a possibilidade de vitória, mas foram, politicamente, os grandes derrotados. De apoiadores do governo que agora termina e com o qual romperam em 2007 quando a India negociou um acordo nuclear com os EUA, chegaram em terceiro lugar. O CPI-M caiu de 62 deputados para 24, perdendo para o Partido do Congresso, inclusive, nos dois estados que governam há muitos anos, Bengala Ocidental e Kerala. Foi seu pior resultado desde 1952 e o presidente do Partido já anunciou o início de uma profunda reflexão para avaliar o ocorrido.

Das 543 cadeiras no Parlamento, a “Aliança Progressista Unida” do CPI obteve 206 a qual se somarão outros 55. A “Aliança Democrática Nacional” dirigida pelo BJP obteve 116, além de outras 41 cadeiras de seus aliados. A “Terceira Frente” obteve 80 cadeiras, incluindo as 24 do CPI-M e havia ainda uma “Quarta Frente” que anunciava de antemão sua disposição de compor com qualquer um dos vencedores, a depender da oferta. Estes obtiveram 27 cadeiras.

A governadora “Dalit” (Casta dos Intocáveis), Kumari Mayawati do estado de Utar Pradesh que também esperava influenciar o novo governo elegeu apenas 21 parlamentares do seu partido BSP.

Além da estrutura nacional que o CPI possui, pois governa a Índia desde a independência com um ligeiro intervalo entre 1999 e 2004, quando perdeu para o BJP e os programas sociais implementados durante o atual mandato, tudo indica que o eleitorado indiano não quis correr riscos neste momento de crise.

No dia 20 de maio, a presidente da Índia, Pratibha Patil, convidou o primeiro ministro Manmohan Singh a continuar no cargo e montar o novo governo, onde continuarão personagens que se tornaram conhecidos ao longo dos últimos cinco anos como Kamal Nath que liderava a delegação indiana nas negociações da OMC. Leia mais em: India’s new government – A well-made cabinet, no The Economist; e Manmohan Singh takes oath as PM for 2nd term, no Times of India.

Massacre em Sri Lanka

No dia 19 de maio, o governo de Sri Lanka anunciou que teria obtido a vitória definitiva sobre os “Tigres da Libertação Tamil Eelam” (LTTE), inclusive, matando seu principal líder, Velupillai Prabhakaran, um dos filhos dele e auxiliares próximos.

Os combatentes do LTTE vinham sendo acuados pelo exército ao longo dos últimos meses para uma pequena área litorânea junto com milhares de civis da etnia tamil. Embora o governo reconheça a morte de 5.000 civis acusando o LTTE de tê-los utilizado como “escudos humanos”, fontes da ONU e Cruz Vermelha chegam a mencionar a possibilidade de aproximadamente 20.000 mortos devido aos bombardeios indiscriminados do exército governamental, o que caracterizaria uma série de crimes de guerra.

No entanto, o governo cingalês não tem permitido o acesso de observadores estrangeiros a área e a população sobrevivente tem sido recolhida a campos de refugiados em situações extremamente precárias.

A guerrilha tamil operava a mais de 25 anos reivindicando a independência da região norte da ilha que é o Sri Lanka (ex-Ceilão) onde esta etnia é majoritária. Contaram ao longo destes anos com apoio de seus congêneres que vivem no sul da Índia e montaram uma guerrilha extremamente eficiente que contava até com alguns pequenos barcos de guerra e aviões. Porém, politicamente não era um movimento de esquerda como muitos outros que defenderam causas semelhantes. Pelo contrário, liquidaram os demais grupos independentistas na sua área de atuação.

O governo da maioria étnica singalesa, por sua vez, começou a articular uma estratégia para derrotar o LTTE a quase dez anos, contratando inclusive consultoria israelense e armas do Paquistão. O treinamento militar e a superioridade em armamentos foram fatores decisivos.

A divisão entre as duas etnias advém do tempo da colonização britânica quando a minoria tamil ocupava os cargos intermediários no governo colonial, o que era percebido como opressão pela maioria singalesa e gerando profundos ressentimentos. Após a independência, a maioria passou a oprimir a minoria gerando o movimento guerrilheiro que, aliás, foi quem inaugurou a tática de “bombas humanas” como instrumento de ataque. Leia mais em: Sri Lanka fighting ‘killed 20,000’, em Al Jazeera online; e After the slaughter – The Tamil Tigers contemplate life without Prabhakaran, no The Economist .

Repressão política prossegue na Birmânia

A líder da oposição birmanesa, Aung San Suu Kyi, laureada com o Prêmio Nobel da Paz que cumpria pena de prisão de 19 anos dos quais 13 em regime domiciliar, voltou ao cárcere e corre o risco de ser condenada a até cinco anos de prisão.

Formalmente ela estava prestes a concluir o tempo de detenção domiciliar e proibição de manter contatos externos. No entanto, um jornalista americano, John Yettaw, que aparentemente pretendia entrevistá-la sobre temas espirituais e não-políticos, atravessou a nado o Lago Inya e conseguiu chegar a sua casa que fica numa das beiras.

O jornalista foi detido e no interrogatório judicial alegou que “Deus o enviou para alertá-la que seria assassinada por terroristas”. Aparentemente, ele pretende se livrar de punições maiores com esta demonstração de insanidade, mas para a ditadura militar birmanesa, a ocorrência justificou a acusação que Aung San violou os termos de sua prisão domiciliar e poderá ser condenada a até cinco anos de prisão embora ela alegue firmemente que não soube de imediato sobre a chegada do jornalista e que quando foi informada pediu-lhe para se retirar. No entanto, ele alegou que estava demasiadamente cansado para nadar de volta.

Os oposicionistas da “Liga Nacional pela Democracia” (NLD), partido de Aung San Suu Kyi, têm manifestado preocupações com seu estado de saúde, uma vez que ela tem 63 anos de idade e estaria com desidratação e, com toda razão, afirmam que as autoridades é que deveriam ser responsabilizadas pela quebra de segurança que possibilitou o acesso de um estranho à residência dela.

A questão política e imediata de fundo é que em 2008, após uma série de protestos populares, foi aprovada uma nova Constituição. Embora extremamente casuística para preservar o controle dos militares sobre o governo, ela prevê a realização de eleições parlamentares em 2010 e, diante disso, nada melhor para a ditadura do que afastar a principal liderança civil do páreo.

Enquanto isto, os sobreviventes do Ciclone Nargis que arrasou o Delta do Rio Irrawady no ano passado ainda não conseguiram reconstruir suas casas e plantações por absoluta falta de apoio governamental, proibição de receber ajuda externa e porque o ciclone também prejudicou as terras aráveis fazendo com que a safra de arroz fosse reduzida a 50% do normal.

Escala a tensão na península coreana novamente

A notícia de que a Coréia do Norte realizou seu segundo teste nuclear subterrâneo, em 25 de maio, aproximadamente três anos após o primeiro, provocou uma onda de condenações por parte da comunidade internacional, inclusive da China, o país que possui as melhores relações com o governo norte coreano.

O exercício também ressuscitou o discurso sobre o “Eixo do Mal”, termo cunhado pelos neo-conservadores da administração do ex-presidente George W. Bush. E, antes mesmo do presidente Barack Obama costurar sua política de não-proliferação de armas nucleares, seus críticos internamente nos EUA pedem o uso de todos os meios necessários para controlar o governo do presidente norte-coreano Kim Jong-il.

O teste nuclear, de acordo com medições sísmicas, atingiu uma explosão entre 4 e 20 quilotons (equivalente a mil toneladas de explosivo), possivelmente maior do que o bombardeio norte-americano a Hiroshima em 1945. A imprensa norte-americana tem se atido ao fato de que o teste realizado em 2006 registrou aproximadamente um quiloton e usa este argumento para reforçar a necessidade de uma reação dura diante da potência do exercício recente e a conseqüente evolução na capacidade nuclear da Coréia do Norte.

Representantes do alto escalão do governo dos Estados Unidos, Coréia do Sul e Japão reuniram-se em Cingapura cinco dias após o teste para formular estratégias de ação conjunta. Não participaram da reunião China, Rússia e Coréia do Norte que completam o Grupo dos Seis que vinha negociando a interrupção do programa nuclear norte coreano desde 2006.

O acordo que alcançaram em fevereiro de 2007, afirmava que o governo norte-coreano abriria mão de seu arsenal nuclear e desativaria o reator nuclear em Yongbyon em troca de combustível, alimentos e remoção do país da lista dos EUA de países patrocinadores do terrorismo.

No entanto, as atitudes agressivas do presidente conservador da Coréia do Sul, que tomou posse em fevereiro de 2008, contra o país vizinho e o retrocesso que ele estabeleceu na política de reaproximação entre as “duas Coréias”, promovida pelos dois presidentes liberais que o antecederam, levaram a Coréia do Norte a suspender sua participação nas reuniões do G-6 e aventar a possibilidade de retomar seu programa nuclear.

A retórica norte-americana subiu de tom após o teste nuclear com a declaração da Embaixadora dos EUA na ONU, Susan Rice, dizendo que o país iria pagar pelas ações tomadas contra a comunidade internacional. Em resposta, Pyongyang declarou inválida a trégua que encerrou a Guerra da Coréia, ocorrida de 1950 a 1953, o que, no entanto, já fizera antes durante outros momentos de tensão.

Embora a trégua seja o que tecnicamente impede Coréia do Sul/EUA e Coréia do Norte de se enfrentarem, os analistas não acreditam que haja nova guerra e tampouco se percebia maiores preocupações por parte da população na semana em que os fatos mencionados ocorreram. Os sul coreanos estavam muito mais envolvidos com o luto provocado pelo suicídio do ex-presidente Roh Moo-hyun do que com a perspectiva de algum ataque.

Porém, é possível que se repitam as escaramuças ocorridas em 1999 e 2002 no Mar do Leste, pois o armistício de 1953 não definiu a fronteira nesta área marítima. A área que os sul coreanos consideram como sua e que inclui cinco ilhas localizadas estrategicamente parte de um limite traçado unilateralmente na época pelo governo americano e que não é reconhecido pela Coréia do Norte.

Embora a Coréia do Norte possua um exército poderoso, há enorme discrepância entre suas forças e as dos EUA e a Coréia do Sul, o que contribuiu para a decisão norte coreana de desenvolver armas nucleares. O sucesso da iniciativa em 2006, na prática, obrigou o então governo Bush a mudar sua política em relação ao país que classificava como membro do “Eixo do Mal”.

O novo teste nuclear, os sucessivos disparos de mísseis que se seguiram, a declaração de rompimento da trégua e a ameaça de ir à guerra se navios norte coreanos forem detidos e inspecionados no Mar do Leste conforme os americanos anunciaram que fariam para impedir a exportação norte coreana de armas, na avaliação de analistas sul coreanos, é uma estratégia do norte para testar o novo governo americano e tentar trazer os EUA para uma mesa bilateral de negociações.

A preferência pela negociação bilateral invés da retomada das discussões no âmbito do G-6 é porque um acordo com os EUA contribuiria para definir os rumos das relações com a Coréia do Sul e com o Japão, pois, particularmente, este último tem interesse na manutenção da tensão na região para fortalecer sua reivindicação de desenvolver forças e armas ofensivas. Os termos da rendição japonesa no final da segunda guerra mundial lhe permite apenas possuir forças armadas com caráter defensivo.

Embora a mídia e a direita conservadora tentem criar o quadro de que este é um desafio crucial para o presidente Obama, uma ação mais dura dos EUA apenas criará mais dificuldades e não se pode ignorar que a Coréia do Norte nunca afirmou que não deseja restabelecer o diálogo. Inclusive, o fracasso da tentativa de retomar as negociações entre as duas Coréias em abril foi mais prejudicial para o norte do que para o sul. Leia mais em: Periscópio Internacional nº 34.

O maior interesse dos países da comunidade internacional deveria ser o de manter o canal diplomático aberto e não apelar para ações militares “preventivas”, como os neo-conservadores gostam de nomeá-las. Todavia, há muita hipocrisia na discussão, até porque o teste nuclear de 24 de maio é o de número 2.054 no mundo e os cinco membros permanentes do CS da ONU são responsáveis por 99,99% dos testes realizados até hoje.

Apesar das tensões, a maioria dos setores políticos da Coréia do Sul, em particular, os mais progressistas continuam favoráveis à reunificação dos dois países, embora também defendam a “desnuclearização” da península coreana e tenham percepções diferentes quanto ao regime da Coréia do Norte. Acredita-se que o rompimento do isolamento internacional da Coréia do Norte possa contribuir para melhorar a sua relação com a comunidade internacional e, neste particular, a América Latina e União Européia têm muita relevância.

Os únicos que realmente se opõem à reunificação são os setores de direita e extrema direita da Coréia do Sul, embora se possa imaginar também que forças externas vejam com desconfiança o estabelecimento de uma Coréia reunificada com uma força armada de quase dois milhões de homens, oito a dez bombas atômicas, mísseis de longo alcance e um grande parque industrial. Leia mais em: North Korea’s nuclear test – Here we go again, no The Economist .

Notícias da crise

A mídia mundial prossegue na tentativa de convencer a opinião pública que o pior da crise econômica já passou e que há ligeira retomada dos índices de crescimento ou na pior das hipóteses uma redução na intensidade dos indicadores negativos. Alguns órgãos de imprensa começam a falar em ligeira retomada de crescimento a partir de 2010 utilizando argumentos como o crescimento indiano de 5,8% no primeiro trimestre.

Porém, segundo o FMI, a retração mundial em 2009 será 1,3% e no primeiro trimestre, a queda no PIB europeu foi de 2,5% em média. O único país da União Européia que apresentou crescimento econômico nos três primeiros meses do ano foi a Polônia com 0,4%. Esta é a maior contração econômica na região desde 1996.

Por outro lado, a média do desemprego europeu passou de 8,9% em março para 9,2% em abril e tem previsão de chegar a 11,5% em 2010. O desemprego na Espanha alcançou o nível de18,1%, a pior situação desde 1993. Estes percentuais se referem a um total de 20,8 milhões de trabalhadores sem emprego na União Européia dos quais 14,5 milhões na zona do Euro.

Segundo a OIT, até final de 2009, 239 milhões de trabalhadores no mundo estarão desempregados. Entre eles, 25 milhões da América Latina que já perdeu seis milhões de postos de trabalho entre 2007 e 2009. Em 2007 eram 19 milhões de desempregados.

Estas perdas de postos de trabalho levarão vários anos para serem recuperados e seus efeitos sobre a crise ainda não apareceram de fato. Leia mais em: UN: World economy to shrink further, em Al Jazeera online

`