*Painel apresentado no seminário Brasil na China, realizado em maio.


Desde de 1987, em seu 5º Encontro Nacional, o Partido dos Trabalhadores optou pela Revolução Democrática como um processo de longo prazo. No decorrer deste processo, através da socialização da política, seriam incorporados milhões de trabalhadores da cidade e do campo, em alianças com as classes médias e com setores do capital produtivo.

Tendo como estratégia a chegada ao governo através do processo eleitoral combinado com ações de massas, o PT assumiu as lutas pelo fim da ditadura, pelas eleições diretas para presidente, pela constituição da CUT (Central Única dos Trabalhadores), por uma Assembléia Nacional Constituinte. Na década de 80 conquistou espaços em parlamentos municipais, estaduais e federal, assim como em governos municipais e, a partir dos anos 90, em governos estaduais. Disputou as eleições para a presidência do país em 1989, 1994 e 1998 com Lula encabeçando a Frente Democrático Popular.

O PT denominou de acumulação de forças esse processo de conquista de espaços em parlamentos e governos, disputa pela presidência e lutas sociais.

Finalmente, em 2002, Lula alcançou a vitória nas eleições para a Presidência da República, com ampliação das alianças, tendo como vice-presidente o empresário José Alencar, liderança do setor nacional desenvolvimentista, defensor da ampliação do mercado interno.

Em 2006 Lula e José Alencar foram reeleitos, para liderar um governo de coalizão com forças de esquerda, centro-esquerda e de centro.

A vitória de Lula em 2002 interrompeu o processo de contrareformas neoliberais, de redução do Estado, de desregulamentação do mercado, de retirada de direitos dos trabalhadores e de privatizações e iniciou a reorganização do Estado e do modelo produtivo do país.

Em lugar de serem privatizados, o governo Lula fortaleceu os dois grandes bancos estatais – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que sob o governo anterior financiava a privatização, foi transformado de fato em um grande banco de fomento. Estes três bancos são instrumentos que permitiram intervir no mercado nos anos de crescimento e, agora, no enfrentamento da crise, o BNDES, por exemplo, tinha 68 bilhões de dólares para investir e recebeu mais 100 bilhões, volume maior do dispunham o Banco Mundial e o Banco Interamericano para o Desenvolvimento.

Outras duas empresas públicas, que estavam na lista das privatizações, foram, são e serão fundamentais na reorganização do Estado para o modelo sócio-desenvolvimentista: a Petrobras e a Eletrobras.

A reorganização do Estado objetiva resgatar seu papel de indutor do desenvolvimento econômico com acento fortemente distributivo para a redução drástica das desigualdades sociais e regionais do país. Trata-se da implantação de um padrão de desenvolvimento capaz de promover empregos qualificados e uma rede de proteção social que amplie um mercado interno estável.

Desde o primeiro momento, o governo Lula buscou a melhoria da capacidade de planejamento e gestão do Estado. Núcleos de inteligência nos ministérios, bancos públicos, e empresas estatais prepararam planos, projetos, programas e ações de curto, médio e longo prazos.

Novos ministérios foram criados: o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que coordenou o cadastro único das famílias pobres do país (pela primeira vez no país, as famílias com desnutrição grave ou moderada passam a ser conhecidas pelo Estado), que implantou o programa “Bolsa Família” para 11,5 milhões de famílias, retirando-as da miséria, e concedendo benefícios sociais para as pessoas pobres com deficiência e idosos sem Previdência. E administra o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; a construção de dezenas de milhares de cisternas na região do semiárido do Nordeste brasileiro e a construção de restaurantes populares.

Foi criado também o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Desde 2003, meio milhão de famílias foram assentadas em projetos de Reforma Agrária. O financiamento da Agricultura Familiar cresceu de 2,4 bilhões de reais em 2002 para 13 bilhões em 2008. Mais de 300 mil casas foram construídas, foi dada assistência técnica, seguro da agricultura familiar, e construídas estradas rurais. Também foram realizados investimentos na educação, eletrificação, saúde, abastecimento de água. No segundo governo Lula foi lançado o programa “Territórios da Cidadania”, de enfrentamento conjunto da pobreza rural.

O Ministério do Trabalho e Emprego combate o trabalho escravo, o trabalho em condições degradantes, o trabalho infantil e promove a formalização do emprego.

O Ministério de Minas e Energia, além de sua missão no campo da energia (petróleo, etanol, gás, elétrica, eólica, solar e biocombustíveis) realizou o programa “Luz para Todos”, alterando a qualidade de vida e de produção de 2,5 milhões de famílias até então excluídas deste direito.

O Ministério da Previdência trabalha para o combate à sonegação e à fraude e expandiu as aposentadorias dos trabalhadores e trabalhadoras rurais às expensas do Tesouro Nacional. 18 milhões de beneficiários recebem até 1 salário mínimo por mês.

Foi criado o Ministério das Cidades, para garantir moradia adequada, infraestrutura urbana, saneamento e água.

O governo Lula instituiu ainda o Ministério dos Esportes e o Ministério da Cultura para democratizar o acesso e a participação de todos e todas.

Criou a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres para coordenar as políticas de igualdade de gênero, a Secretaria Especial de Políticas de Igualdade Racial, a Secretaria Especial de Direitos Humanos. Todas com status ministerial.

Estabeleceu pela primeira vez no país políticas específicas para a juventude e instituições voltadas a promoção da cidadania dos jovens.

O Ministério do Meio Ambiente deteve o avassalador avanço da degradação sobre a Amazônia, os manguezais, a região do Cerrado e a Mata Atlântica e estabeleceu parâmetros para o desenvolvimento sustentável. 9% do território brasileiro estão em unidades de conservação federais. O país conta com um Plano Nacional sobre Mudanças Climáticas e estabeleceu metas para reduzir queimadas, desmatamentos, e para dobrar o número de árvores plantadas.

O Brasil tem 220 nações indígenas, com mais de 180 línguas e 654 territórios (12,5% do total do país nacional). São 700 mil indígenas que tem direitos a qualidade de vida digna, a terem suas terras protegidas, suas culturas e modos de vida respeitados.Também são numerosos os programas de vários ministérios para garantir a promoção econômica, social e cultural dos povos indígenas.

Há também uma política pública para os quilombolas (população remanescente dos escravos). São milhares de comunidades com cerca de 1.700.00 quilombolas. O objetivo é regularizar suas terras, melhorar suas precaríssimas condições de vida (saneamento, atenção a saúde, ações de desenvolvimento local, apoio as suas manifestações culturais e tradições). A instituição de cotas raciais em 23 universidades federais, 25 universidades estaduais e 3 centros federais de educação tecnológica garantiu o acesso de indígenas e quilombolas à educação.

No período neoliberal, o Estado foi sendo transformado em mero reprodutor de ações destinadas à regulação competitiva dos capitais; as políticas sociais se distanciaram cada vez do seu caráter universal, e se transformaram em políticas assistencialistas e “focalizadas” (restrita a grupos sociais mais pobres). Até mesmo no sistema único de saúde, conquista civilizatória de amplos movimentos sociais e da sociedade civil, houve tentativa de intervenção dos neoliberais que tentaram transformar a saúde em produto financeiro, a exemplo da previdência complementar.

O governo Lula opera sempre com a proposta de universalização da proteção social, investindo em saúde, educação, assistência social e pleno emprego.

No campo da educação, considerado estratégico pelo governo Lula, também estão ocorrendo transformações que dão sustentabilidade ao modelo sócio desenvolvimentista.

No governo anterior só uma universidade foi criada em 8 anos, enquanto no governo Lula, além da criação de 12 novas universidades, foram colocadas em funcionamento 61 novos campi. 434 mil estudantes pobres recebem bolsas integrais ou parciais para estudarem em universidades privadas.

As escolas técnicas – que não foram ampliadas no governo anterior – passaram a 214 entre novas e em implantação.

Oito milhões de adultos e jovens foram e estão sendo alfabetizadas em cursos de alfabetização e educação continuada.

O plano de desenvolvimento da educação está implantando ações integradas que vão desde a melhoria dos salários e capacitação dos professores, passando pela educação à distância, pela avaliação da qualidade do ensino, pelo transporte escolar e pela melhoria merenda, até o acesso a internet por banda larga na escola.

Investimentos em ciência, tecnologia e inovação fortalecem as instituições de pesquisa, a capacidade inovadora das empresas e a inclusão social.

No governo Lula há uma política pública de apoio, incentivo, assistência técnica e fomento a economia Solidaria, com novas relações de propriedade, produção e consumo.

Entre 2003 e 2008 três milhões e 500 mil pessoas participaram de 53 conferências nacionais para debater e aperfeiçoar políticas públicas de direitos humanos, igualdade racial, mulheres, assistência social, saúde, meio ambiente, educação, idosos, pessoas com deficiência, juventude, segurança pública, povos indígenas, ciência e tecnologia, cidades, agricultura e pesca, e outros.

Existem 18 conselhos nacionais em funcionamento, com a tarefa específica de fiscalizar, monitorar e aperfeiçoar as políticas públicas.

Há ainda um programa nacional de segurança pública com cidadania que articula políticas públicas de segurança com ações sociais, prioriza a prevenção e busca atingir as causas que levam a violência, com prioridade para as 18 regiões com mais altos índices de homicídios e criminalidade juvenil.

O governo opera para modernizar as instituições, investe na formação e na valorização dos profissionais.

Outra mudança importante verificada desde o primeiro mandato do presidente Lula foi na condução da política externa. O governo anterior apoiava a ALCA, o Acordo de Livre Comércio com os Estados Unidos, e a cada crise recorria ao FMI submetendo-se aos ditames daquela instituição. Com o governo Lula, o Brasil recuperou sua soberania.Priorizou o eixo Sul-Sul, a consolidação do Mercosul, a constituição do bloco UNASUL, as relações com a África (visitou 23 países) com a Ásia, com o Oriente Médio, com a Rússia. Frente à crise, jogou todo seu peso no G-20, que rompe com o padrão de governança econômico-financeira global, em que medidas substantivas e reformas das instituições financeiras globais eram discutidas apenas no âmbito do G 6-7 ou do G-8.

As exportações brasileiras bateram recorde em 2008, com a diversificação dos destinos. As maiores ampliações de destinos foram as da Ásia 9 (+51%), especialmente a China (9+55%), Europa Oriental (+(36%) e Mercosul (+29%). Enquanto com os parceiros tradicionais os aumentos foram de 17% (EUA) e 11% (Europa). Em abril de 2009, pela primeira vez as exportações para a China superaram as exportações para os EUA.

O Brasil trabalha pelo desarmamento mundial (a América Latina é território livre de armas nucleares), pela paz com justiça, defesa da multipolaridade, pela vigência dos direitos humanos e pela preservação ambiental global.

Até setembro de 2008, a economia cresceu a taxas expressivas; foi dos últimos países a desacelerar. Nas crises anteriores, havia fuga de capitais; o país recorria ao FMI e entrava em recessão. Desta vez, o país estava melhor preparado. Temos commodities cuja demanda não cai. Temos três fortes bases estatais, que são instrumentos para intervir nos mercados (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social); duas grandes estatais de significativa importância (Petrobras e Eletrobrás).

O problema é o crédito: 20% do crédito que movimentavam a economia vinham do exterior, faltou crédito para financiar as exportações. Houve problemas internos com os bancos pequenos e médios que dependem de créditos externos para financiar suas carteiras. Houve também evasão de créditos: investidores e fundos de investimento estrangeiros foram cobrir os bancos em suas matrizes.

O Brasil teve instrumentos para enfrentar estes desafios. O país tem controles; todo sistema de crédito é controlado, inclusive o sistema de derivativos (o Conselho Monetário Nacional exige a demonstração das operações com derivativos no balanço trimestral) e as operações de hedge, a compra de contratos cambiais no mercado futuro. Só escapam ao controle as operações de empresas feitas no exterior, operações “de balcão”, feitas à margem da Bolsa de Valores. Tiveram prejuízos, mas, como eram empresas sólidas, que ganharam muito nos últimos 5 anos, nenhuma quebrou. O Brasil não quebrou, nenhum banco quebrou. Empresas não quebraram. O país usou os depósitos compulsórios (o Brasil exige depósitos compulsórios no Banco Central de 25% a 50%; nos EUA são 10%, e em outros países, 8%).

Nosso país tem reservas de 206 bilhões de dólares e desde 2007 implantou o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), um programa macroeconômico completo. Em 2002, o investimento em infraestrutura era de somente 0,3% do PIB; em 2007 chegou a 1% do PIB. A infraestrutura é a espinha dorsal do desenvolvimento e o Brasil estava atrasado. O PAC investe em rodovias, ferrovias, hidrovias, pontes, aeroportos, em energia fóssil e renovável, em infraestrutura urbana (metrô, saneamento, água), em um grande programa habitacional inclusivo e de grande efeito multiplicador.

Mesmo com a crise, o salário mínimo teve aumento superior a inflação pelo 7º ano consecutivo. O salário mínimo atinge a base da pirâmide social pois remunera 18 milhões de aposentados rurais e 3 milhões de idosos e pessoas com deficiência, beneficiários do BPC (Beneficio de Prestação Continuada), e os empregos domésticos, entre outros.

Em plena crise o governo reajustou a Bolsa Família, responsável em 21% pela redução das desigualdades no país.

A inflação está sob controle.

O Brasil reúne condições para manter um ciclo duradouro de crescimento econômico acompanhado da redução das desigualdades sociais e regionais.

Além das reservas de 206 bilhões de dólares, o Brasil conquistou o grau de investimento 5 por agências de risco. Encerrada a fase aguda da crise internacional, poderá captar recursos com menores encargos financeiros e com prazos mais longos.

As empresas estatais e privadas (nacionais e multinacionais) obtiveram grandes lucros nos últimos 5 anos e podem investir com recursos próprios. Os fundos de pensão tem 155 bilhões de dólares, as instituições financeiras e os fundos mútuos de investimento obtiveram grande rentabilidade. Existem pois excedentes acumulados que podem financiar investimentos e realizar parcerias com o Estado na infraestrutura. As grandes reservas de petróleo do pré-sal são propriedade da nação. Exploradas de modo planejado, em parceria com capitais privados, devem constituir fontes de reservas para alavancar o desenvolvimento, financiando infraestrutura básica e grandes projetos de educação, saúde, assistência social e de inovação.

O ciclo de desenvolvimento econômico e social do pós-guerra só incluiu 1/3 da humanidade e esbarrou na insustentabilidade ambiental do atual padrão de produção e consumo, além de produzir efeitos perversos na elevação da temperatura e as drásticas mudanças climáticas.

Este projeto de sociedade não é passível de universalização. As medidas de atenuação da crise são importantes: preservam empregos e forças produtivas mas não atendem nosso projeto de distribuição de renda, riqueza, conhecimento, saber e do poder.

O governo Lula (e outros governos de esquerda e progressistas da América Latina) resgatou o papel do Estado como diretamente produtivo, como financiador do desenvolvimento, como provisionador de serviços de saúde, educação, transferência de renda, cultura e esporte; como regulador do mercado de trabalho e como planejador do crescimento na diversificação da matriz energética.

No entanto, o Partido dos Trabalhadores e as esquerdas são minoritárias no parlamento, nos governos estaduais, na mídia controlada por poucos grupos privados, que detém 70% do controle do ensino do país.

Em prol da Revolução Democrática temos a emergência de novos sujeitos sociais: os pobres da cidade e do campo, as novas classes médias (31 milhões de pessoas passaram das classe D e E para a classe C), os jovens que podem novamente sonhar com um futuro melhor, as mulheres que vencem preconceitos e ocupam espaços novos, as centrais sindicais que foram legalmente reconhecidas e negociam com o governo o salário mínimo e o enfrentamento da crise, os movimentos sociais anticapitalistas, os ambientalistas.

Mas, sobretudo, contamos com o enorme prestigio do presidente Lula e com a aprovação de seu governo para dar continuidade e avançar no processo de Revolução Democrática.