Edição 33 – Abril de 2009

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FMLN vence eleição presidencial em El Salvador

Processos eleitorais na Argentina, Equador, Panamá e Chile

EUA – Os primeiros testes da política externa de Barack Obama

OTAN – Cúpula comemorativa de 60 anos retrata cautela dos líderes europeus

Segunda reunião da Cúpula América do Sul–Países Árabes em Doha aproxima os dois blocos

Novo governo e a perspectiva de novos conflitos em Israel

Sudão – Presidente Bashir recebe ordem de prisão do Tribunal Penal Internacional

Cai o presidente de Madagascar

Aumenta tensão entre Coréias

G20 – Reunião de Londres muita declaração e pouca ação diante da crise

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FMLN vence eleição presidencial em El Salvador

Mauricio Funes da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional (FMLN) foi eleito o novo presidente de El Salvador em 15 de março ao derrotar o candidato governista da Aliança Republicana Nacionalista (ARENA), Rodrigo Ávila, por 51,3% a 48,7% dos votos.

O voto em El Salvador não é obrigatório, mas o comparecimento de 63% foi considerado alto e interromperam os 20 anos de governo de extrema direita da ARENA, representante da elite que governa o país desde a independência da Espanha e herdeira dos governos militares dos anos 1980.

Em 1992 foi assinado um acordo entre o governo militar e a FMLN encerrando a guerra civil que provocou 75.000 mortes, 6.000 desaparecimentos e o deslocamento forçado de mais de 40.000 pessoas. A paz foi possível porque a guerra fria e a era Reagan haviam terminado e não havia possibilidade de vitória militar para nenhum dos dois lados. O vice de Mauricio Funes, Salvador Sanches Cerén, foi um dos comandantes guerrilheiros que compareceu à solenidade de assinatura do acordo naquela ocasião.

A FMLN transformou-se em partido político e cresceu gradualmente em representatividade nas eleições parlamentares e municipais desde então. Chegou a governar a capital San Salvador até recentemente, embora tenha sofrido sucessivas derrotas nas eleições presidenciais.

O desafio para o novo governo é enorme. O índice de concentração de riqueza e terra, a pobreza e os níveis de criminalidade de El Salvador são todos extremamente altos. As remessas dos salvadorenhos que vivem no exterior, principalmente, nos EUA representam 13% do PIB, a principal divisa externa e que deverá ser afetada com a atual crise econômica mundial.

Apesar disso, este resultado é uma esperança de melhores dias para sua população e o novo presidente que tomará posse em julho se somará aos demais governos progressistas do continente. Leia mais em: De la guerrilla al gobierno, da Alainet; El Salvador: Funes promete estabilidad laboral, da Ansa; e o Manifiesto a la Nación.

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Processos eleitorais na Argentina, Equador, Panamá, Chile e Bolívia

Até o final do ano ocorrerão eleições nestes cinco países que são governados por presidentes progressistas de acordo com as diferentes realidades nacionais. Na Argentina trata-se de eleições para renovar metade da câmara de deputados e um terço do senado; no Equador e Bolívia ocorrerão eleições parlamentares e presidenciais à luz de suas novas constituições e no Panamá e Chile também ocorrerão eleições parlamentares e presidenciais, mas de acordo com o calendário e procedimentos tradicionais.

Argentina

A eleição parlamentar argentina apresenta um interesse particular para a presidente Cristina Kirchner, pois deverá definir quem terá a maioria, se o governo dela ou a oposição que, todavia, não é unitária. Cristina iniciou seu governo com maioria na câmara e no senado a partir da unidade das diferentes frações do Partido Justicialista (Peronista) e com algumas alianças como, por exemplo, com dissidentes da Unión Cívica Radical (UCR) que inclusive indicaram o vice-presidente da sua chapa, Julio Cobos.

Porém, esta aliança não foi suficientemente sólida diante de visões e interesses demasiadamente distintos e, particularmente, a proposta do governo de ampliar alguns impostos sobre a produção agrícola acabou sendo derrotada no ano passado com o voto de minerva de Cobos que também é presidente do senado.

A eleição foi antecipada de outubro para 28 de junho e a principal disputa está ocorrendo na província de Buenos Aires onde a maioria dos parlamentares será eleita e local onde a presidente possui maior popularidade.

Pelo menos três blocos começaram a se articular nesta província. Os candidatos apoiados pela presidente e que poderão ser liderados pelo ex-presidente Nestor Kirchner como candidato a deputado ou a senador; uma aliança pela direita entre o grupo de Mauricio Macri, atual prefeito de Buenos Aires, Felipe Solá, dissidente peronista e ex-ministro de Cristina Kirchner e o empresário Francisco Narváez e uma articulação à esquerda entre socialistas e ex-membros do Alianza por uma Republica de Iguales (ARI) que se chama “Proyecto Sur” da qual também participam o cineasta Fernando Solanas e o ex-presidente da Central de Trabalhadores Argentinos (CTA), Victor de Gennaro.

Chile

O primeiro turno da eleição chilena somente ocorrerá em 11 de dezembro, mas a “Concertación” composta pelos partidos Democrata Cristão, Socialista, Democrata e Social Democrata Radical e que governa o país desde o fim da ditadura de Pinochet, acabou de realizar suas prévias internas sagrando-se vencedor, Eduardo Frei do partido Democrata Cristão com 64% das preferências contra José Antonio Gomez do Partido Social Democrata Radical com 36%.

Seu opositor principal será Sebastian Piñera, empresário dono da LAN, candidato pela Alianza por Chile composta por dois partidos de direita: a Renovación Nacional e a Unión Democrática Independente.

Além deles há nove outros pré-candidatos, a maioria por pequenos agrupamentos de esquerda, além do Partido Comunista do Chile. Mas há movimentações no sentido de constituir uma candidatura única destes segmentos da esquerda. Houve uma série de composições locais entre a “Concertación” e o PCC nas eleições municipais de 2008, mas que não se repetiram no atual processo eleitoral.

As pesquisas atuais apontam para empate técnico entre Eduardo Frei e Sebastián Piñera, com ligeira vantagem para este, mas ainda há um prazo de cinco meses para registro de candidaturas e início da campanha oficial.

As eleições presidenciais e parlamentares na Bolívia também ocorrerão em dezembro por definição da nova Constituição ratificada por referendo popular no início de 2009, embora haja conflito entre o governo de Evo Morales e a oposição sobre os procedimentos eleitorais, em particular, o voto de imigrantes bolivianos, a presença de representantes dos povos originários no Congresso e consultas sobre autonomia nas províncias.

O projeto do governo passou na Câmara de Deputados, mas foi barrado no senado onde a oposição tem ligeira maioria. Tenta-se agora alguma fórmula para resolver o impasse, pois a nova Constituição exige o cumprimento de prazos para definição das regras eleitorais e estes estão por vencer.

Equador

No Equador, o processo eleitoral com caráter de eleição geral está marcado para 26 de abril e o atual presidente Rafael Correa, candidato a reeleição, lidera as pesquisas com índices que variam de 51% a 59% dependendo do instituto de pesquisa. O segundo colocado é Lucio Gutierrez pelo Partido Sociedade Patriótica com 13%, o terceiro é Álvaro Noboa do partido da Renovação Institucional (PRIAN) com 12% seguido por Martha Roldós da Rede Democrática com 9%. Os demais candidatos não alcançaram 5%.

No entanto, apesar do bom desempenho de Rafael Correa de acordo com as pesquisas não é certeza que seu partido Alianza Pais alcance a maioria de deputados no parlamento nacional.

Panamá

As eleições no Panamá ocorrerão em 3 de maio para definir o novo presidente em substituição a Martin Torrijos do Partido da Revolução Democrática (PRD), os 71 deputados do parlamento, os 75 prefeitos e respectivos vereadores, bem como os 20 deputados panamenhos do Parlamento Centro Americano.

O atual presidente foi eleito quatro anos atrás após vários mandatos da direita neoliberal e gerou grande expectativa de mudanças no país pelo que o PRD representa tradicionalmente enquanto um partido progressista e pelo fato de ser filho do general Omar Torrijos que quando governou o país nos anos 1980 negociou com os EUA a devolução do Canal do Panamá, o que ocorreu em 1999.
No entanto, ele não atendeu a expectativa e agora há o risco de retorno da direita ao governo por intermédio do candidato Ricardo Martinelli pela “Aliança pela Mudança” que enfrenta a candidata do PRD, Balbina Herrera.

Ela era ministra da habitação do governo Torrijos e foi indicada candidata após vencer a prévia com o prefeito da capital, Cidade do Panamá, Juan Carlos Navarro que se tornou o candidato a vice-presidente na chapa. Seu perfil político é, no entanto, mais à esquerda do que este e o atual presidente.

Há ainda uma terceira candidatura de um político tradicional, Guillermo Endara pelo agrupamento “Vanguarda Moral da Pátria” com poucas chances de vitória. Leia mais:

Argentina – Por un frente de centroizquierda, publicado no Pagina 12; e Kirchner, de campaña en el GBA: lanzó ataques a la prensa y a Solá, do Clarin.

EquadorSe dispara actividad proselitista en campaña electoral ecuatoriana, publicado no Prensa Latina.

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EUA – Os primeiros testes da política externa de Barack Obama

Pelo menos a retórica mudou. Os primeiros movimentos da política externa da nova administração democrata dos EUA têm sinalizado com diálogos ao contrário das atitudes beligerantes do antecessor republicano. Os governos que foram particularmente molestados pelo governo Bush também têm respondido positivamente à mudança, embora cobrando o devido respeito ao que consideram seus direitos e interesses.

Foi o exemplo do artigo que o presidente russo Dmitry Medvedev publicou no Washington Post um dia antes de seu encontro com o presidente norte-americano, prévio à reunião do G-20 em Londres. Nele, Medvedev declarou que as frias relações entre seus países somente melhorariam caso Obama reavaliasse uma série de políticas dos EUA referindo-se principalmente ao sistema antimísseis que os EUA pretendem instalar no Leste Europeu e as propostas de expansão da OTAN na mesma região.

Esta primeira reunião de Medvedev com Barack Obama gerou uma avaliação positiva na imprensa com o anúncio de uma possível redução de armas nucleares e que o governo russo teria captado a atenção do novo presidente.

Obama também se beneficiou com o encontro, que marcou a troca de tom nas negociações entre os dois países para um diálogo mais construtivo do que nos tempos de Bush e Putin.

A declaração conjunta de que os dois países têm a intenção de reduzir seus arsenais nucleares, os maiores do mundo, suaviza a imagem da Rússia, que tem preocupado a Europa recentemente com os cortes de fornecimento de gás natural e ameaças de colocação de mísseis nas fronteiras. O mesmo vale para os Estados Unidos que estão tentando se livrar da má imagem formada pelos oito anos de governo republicano.

O presidente norte-americano comprometeu-se a apoiar a entrada da Rússia na Organização Mundial do Comércio (OMC) e também a encaminhar o possível para a aprovação do Tratado de Interdição Completa de Testes Nucleares no congresso dos Estados Unidos, reivindicação antiga do governo russo.

Apesar da atmosfera aparentemente construtiva, Medvedev declarou após a reunião que houve progresso, mas que eles não conseguiram avançar nas questões mais complexas. Por outro lado, não houve compromisso russo para aumentar a pressão sobre o Irã conforme querem os americanos e europeus para interromper o programa nuclear iraniano, nem sinais de apoio aos esforços americanos no Afeganistão.

Após sua reunião com Medvedev, Barack Obama reuniu-se com o presidente da China Hu Jintao para discutir vários temas, entre eles, a declaração do governo chinês sobre uma nova moeda global para substituir o dólar como garantia no mercado financeiro internacional uma vez que são grandes credores da dívida americana.

Neste encontro, Obama aceitou o convite para visitar a China ainda em 2009 e os dois presidentes concordaram em criar um novo diálogo econômico-estratégico EUA/China. O presidente norte-americano ainda concordou com a necessidade de mudar algumas regras do Fundo Monetário Internacional (FMI) para dar à China e outros países em desenvolvimento um papel mais apropriado, no entanto, sem discuti-lo em detalhes.

A primeira viagem oficial de Hillary Clinton, como a nova secretária de Estado já havia sido para o sudeste asiático, visitando Japão, Indonésia, Coréia do Sul e China, a fim de demonstrar o papel chave que a região tem para a política externa norte-americana.

Também houve acenos de Obama em direção ao Irã e países árabes de que há disposição para o diálogo e de respeito ao Islã utilizando, inclusive, o argumento de ser filho de um muçulmano e ter Hussein como segundo nome.

No caso da América Latina, ao invés de prestigiar o principal aliado do governo Bush no continente, o presidente colombiano Alvaro Uribe, Obama reuniu-se com o presidente Lula em 14 de março para discutir a crise econômica mundial e o papel dos países em desenvolvimento na construção de uma nova arquitetura financeira, a questão energética, bem como as cúpulas do G-20 e das Américas.

Lula foi o primeiro presidente latino americano a ser recebido na Casa Branca por Obama o que significa o reconhecimento do papel de liderança e diplomacia que o Brasil pode ter no continente, inclusive para contribuir com uma nova abordagem americana em relação a países com os quais tem conflitos como, por exemplo, a Venezuela.

Porém, entre a retórica positiva e mudanças substantivas há uma grande distância na prática. No continente americano se espera, por exemplo, mudanças políticas concretas em relação ao bloqueio imposto a Cuba e uma agenda positiva na Cúpula de Chefes de Estado das Américas a realizar-se em Trinidad & Tobago para confirmar que existe uma política externa realmente diferente para a região do outro lado do Rio Grande.

As provocações que o novo governo israelense vem fazendo em relação aos palestinos e a alguns de seus vizinhos do Oriente Médio também exigirão posicionamentos claros do governo americano contra esta postura que, entretanto, não se sabe se virão.

Além disso, a situação no Iraque permanecerá a mesma, pelo menos até 2011, e os EUA ampliarão a presença de tropas no Afeganistão para tentar controlar a situação por meios militares com as conseqüências que isso tem para a população civil.

Apesar das sinalizações positivas mencionadas e a crise econômica mundial, que afeta principalmente os Estados Unidos, favorecer a cooperação internacional, ainda é cedo para se fazer uma avaliação definitiva da nova política externa americana. Leia mais em: Building Russian-U.S. Bonds, do Washington Post; China Takes Aim at Dollar, publicado no Wall Street Journal; e a Declaração do Presidente Obama sobre Encontro com Presidente Lula, Washington, de 14/03/09.

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OTAN – Cúpula comemorativa de 60 anos retrata cautela dos líderes europeus

No ano em que completou 60 anos de existência, a Organização do Tratado do Atlantico Norte (OTAN) ganhou dois novos membros, Albânia e Croácia, em mais um passo na expansão sobre os Bálcãs, onde a aliança atuou em sua primeira guerra há menos de uma década.

Estas adesões não geraram maiores questionamentos da Rússia, pois esta nunca teve maior influência ou relações estreitas com a Albânia e a Iugoslávia da qual a Croácia era parte, mesmo durante a era soviética. Agora o bloco é composto por 28 países e os dois novos membros já foram convidados a enviar tropas para se juntar à Força Militar da OTAN no Afeganistão.

Aliás, este tema era o maior destaque da agenda da Cúpula e a proposta do presidente norte-americano Barack Obama de ampliar as tropas de combate da organização no Afeganistão foi recusada pelos aliados tradicionais dos EUA. Diante do aumento da oposição à guerra por parte da opinião pública européia e as eleições para o Parlamento Europeu em junho próximo, os líderes europeus não concordaram com propostas além de oferta de ajuda humanitária à população civil e um número limitado de tropas com o objetivo de treinar a polícia e o exército afegãos, além de reforçar a segurança durante as eleições afegãs.

A OTAN mantém uma força de 58.000 soldados no país, contando os 26.000 americanos. A nova estratégia dos EUA planeja enviar 21.000 novos soldados para se juntarem aos combatentes norte-americanos que já se encontram no Afeganistão. Querem ainda que as forças de polícia e forças armadas estejam mais bem capacitadas e que o governo em Cabul seja fortalecido.

Outro tema da agenda da Cúpula foi a retomada das relações da aliança com a Rússia, rompidas devido à guerra desta com a Georgia. O Conselho OTAN-Russia, suspenso por ocasião do conflito voltará a se reunir nas próximas semanas e está programada para maio próximo um encontro entre os ministros de relações exteriores da Rússia e dos países integrantes do bloco.

Nos temas internos, a OTAN discutiu a sucessão de seu secretário-geral, atualmente o diplomata holandês Jaap de Hoop Scheffer, cujo mandato se encerra em 1º de agosto. O primeiro-ministro dinamarquês Anders Fogh Rasmussen foi eleito para substituí-lo, embora gerando algumas reações contraditórias.

A Turquia se opunha a sua candidatura em função da defesa da liberdade de expressão que o premiê fez em relação à publicação das charges sobre Maomé pelo jornal dinamarquês “Jylands Posten” em 2006, mas os partidos de oposição da Dinamarca estavam torcendo pela sua eleição, pois neste caso ele seria substituído no cargo de primeiro-ministro pelo vice-presidente do seu partido, Lars Loekke Rasmussen, extremamente impopular, o que poderá antecipar as eleições parlamentares e aumentar as chances do Partido Social Democrata voltar ao poder.

Apesar de todo o aparato de segurança que cercou o evento, a Cúpula foi alvo de grandes protestos. Leia mais em: Clashes at Nato summit protests, da Aljazeera.net; e Barack Obama sets out new strategy for Afghanistan war, do Guardian.

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Segunda reunião da Cúpula América do Sul – Países Árabes em Doha aproxima os dois blocos

A Cúpula América do Sul – Países Árabes (CASPA) surgiu de uma iniciativa brasileira, capitaneada pelo presidente Lula a partir de 2003. A primeira reunião foi realizada em Brasília, em maio de 2005, com o propósito de aproximar dois grandes e importantes blocos de países em desenvolvimento, que contabilizam 10,5% da população mundial.

O segundo encontro da Cúpula ocorreu em Doha, no Catar, em 31 de março, e culminou na adoção de uma declaração com 11 pontos tocando em vários temas como política, o processo de paz no Oriente Médio e cooperação econômica e financeira.

A declaração reforçou a necessidade do estabelecimento de um estado palestino, baseado nas fronteiras de 1967, incluindo a devolução das Colinas de Golã para a Síria e o desmonte dos assentamentos israelenses, incluindo os de Jerusalém Oriental. Os líderes signatários expressaram no documento também seu respeito pela legitimidade palestina, sob o comando do presidente Mahmoud Abbas e sua ojeriza pela ação conduzida pelo exército israelense na Faixa de Gaza pedindo que os postos de fiscalização sejam abertos à circulação dos moradores e que a ocupação da região seja levantada.

Quanto à situação no Iraque pediu o respeito à vontade do povo iraquiano e condenou os atos de terrorismo e violência que afetam particularmente a população civil. Com relação ao Sudão, a Cúpula apoiou a iniciativa da Liga dos Países Árabes e da União Africana de se unirem para resolver a crise em Darfur, mas não mencionou o mandato de prisão contra o presidente Omar al-Bashir.

Os dois blocos, em conjunto, também reiteraram seu apoio à iniciativa árabe de estabelecer uma área livre de armas nucleares no Oriente Médio, reforçando a importância de que todos os países da região sejam signatários do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares.

No tocante à cooperação econômica e financeira, a declaração reforçou a preocupação com a crise financeira global e solicitou o estabelecimento de um sistema financeiro internacional a fim de prevenir a especulação e também sugeriu a realização de uma conferência internacional – no âmbito da ONU – para discutir a crise e suas possíveis soluções.

Quanto à questão energética, foi definida a construção de mecanismos de cooperação e de troca de informações nos setores de petróleo, gás natural e outras fontes de energia, incluindo intercâmbio de conhecimento técnico, transferência de tecnologia e treinamento de recursos humanos. Os líderes dos dois blocos acordaram a troca de experiências em prol do desenvolvimento sustentável do uso de energia, dando apoio à proposta dos Emirados Árabes Unidos de receberem o escritório da Agencia Internacional de Energia Renovável em Abu Dhabi.

Para finalizar, o documento também pediu que a cooperação sul-sul promova a capacitação nos temas de desenvolvimento, inovação e luta contra a pobreza. A próxima reunião será realizada em Lima, no Peru, no ano de 2011. Leia mais: Página Oficial da 2a Cúpula América do Sul-Países Árabes; e Peru to host Third Summit of Arab-South American Countries in 2011, do Peruvian Times.

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Novo governo e a perspectiva de novos conflitos em Israel

O ataque contra a Faixa de Gaza e a morte de mais de 1.400 palestinos promovidos pelo governo da coalizão Kadima e Trabalhistas, sob a justificativa de conter os lançamentos de foguetes pelo Hamas sobre regiões do sul de Israel, não impediram Benyamin Netanyahu do Likud de se tornar o novo primeiro ministro de Israel após as eleições ocorridas em fevereiro. Leia mais em: Periscópio 32.

Embora o Partido Kadima liderado pela chanceler Tzipi Livni fosse o primeiro colocado nas eleições com uma cadeira a mais do que o Likud, o presidente do país, Shimon Perez, após realizar consultas com os vários partidos, avaliou que o Likud teria mais chances de assegurar uma composição majoritária no parlamento israelense e assim convidou Netanyahu para formar o novo governo. Aparentemente, ele apostava numa composição entre Likud, Kadima e Trabalhistas para minimizar a participação de partidos da extrema direita.

Netanyahu compôs uma maioria parlamentar de 66 votos em 120 com a participação de dois partidos ainda mais à direita que o Likud, o Israel Beitenu e o Shas, além dos trabalhistas que de principal força política do país no passado não muito distante caiu para quarto lugar após as últimas eleições e pateticamente fará parte de um governo de extrema direita em troca de seu líder, Ehud Barak, permanecer no cargo de Ministro da Defesa. Esta decisão foi tomada por ligeira maioria de votos no interior do partido.

O Kadima agora é o principal partido de oposição e aposta num governo de curta duração em função das contradições que marcam sua composição.

Desta maneira, os cargos de primeiro ministro e finanças ficaram com o Likud o que assegura o retorno de políticas econômicas neoliberais mais extremas, a chancelaria com Avigdor Lieberman do Israel Beitenu que já começou a declarar que o acordo de Annapolis prevendo a constituição de dois estados – Israel e Palestina – não tem validade, o ministério da habitação ficou com o Shas o que vai fortalecer o avanço das colônias israelenses em território palestino e os trabalhistas ficaram com o ministério da defesa o que dará continuidade às atrocidades costumeiras.

Neste particular, o relator da ONU nomeado para verificar as acusações de crimes de guerra que teriam sido cometidos durante os recentes ataques a Gaza confirmou que de fato ocorreram em grande medida por meio de ataques premeditados à população civil, além da utilização de armamento proibido pelas convenções internacionais como as bombas de fósforo.

Chamou a atenção também que se fortaleceu a presença de militares ligados aos partidos conservadores ultra religiosos neste ataque, o que cada vez mais substituirá as “Razões de Estado” pela motivação religiosa nos conflitos Os rabinos que atendem aos soldados israelenses nestas ocasiões pregavam abertamente a “necessidade de expulsar os não judeus da Terra Santa” durante o ataque a Gaza.

A retórica contra o Irã também subiu de tom e se a comunidade internacional e os EUA, em particular, não contiverem o novo governo, mesmo que ele venha ter curta duração, terá tempo para arruinar uma situação que no estado atual já é desastrosa. Leia mais em: Lieberman: Israel is changing its policies on peace, do Haaretz; Netanyahu government / Who’s who in the new cabinet, também no Haaretz; Haaretz poll: 54% of public dissatisfied with new government; Petraeus: Israel Might Attack Iran, do Huffington Post; e Analysis: Israel’s unwieldy government, da BBC.

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Sudão – Presidente Bashir recebe ordem de prisão do Tribunal Penal Internacional

O Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu em Haia, no início de março, um mandado de prisão contra o presidente do Sudão, Omar al-Bashir. Na ordem de prisão internacional, al-Bashir é acusado de crimes de guerra e contra a humanidade na região sudanesa de Darfur. O painel de três juízes do TPI descartou a acusação de genocídio por falta de provas.

Contudo, de acordo com o artigo 16 do estatuto da Corte, o Conselho de Segurança das Nações Unidas pode frear o andamento do processo pelo período renovável de um ano. Os países africanos e árabes, bem como membros do Conselho como China e Rússia, estão pressionando para que isso aconteça, argumentando que a manutenção da sentença tornará impossível a realização de um acordo de paz em Darfur.

De acordo com estimativas da ONU (Organização das Nações Unidas), mais de 300 mil pessoas foram mortas e mais de 2,5 milhões foram obrigados a fugir em mais de cinco anos de conflito em Darfur.

A violência começou quando integrantes de três etnias africanas da região pegaram em armas e se rebelaram contra o governo sudanês composto majoritariamente por árabes sudaneses. Estes grupos queixavam-se de décadas de negligência e discriminação pelo governo central. O governo iniciou então uma contra-insurgência, durante a qual uma milícia árabe pró-governo central (Janjaweed) cometeu atrocidades contra a comunidade africana.

De acordo com o porta-voz do TPI, o presidente é suspeito de ser conivente e responsável pelos ataques contra uma parcela da população civil de Darfur bem como assassinatos, extermínios, estupros, episódios de tortura e forçando o refúgio em outras áreas.

Al-Bashir é o primeiro líder em exercício a ter uma ordem de prisão expedida pelo TPI desde que essa corte permanente entrou em funcionamento, em 2002.

Em sua defesa, o presidente sudanês afirmou que o mandado de prisão desestabilizará toda a região, piorando o conflito em Darfur e ameaçando o acordo de paz que encerrou um período de décadas de guerra civil entre o norte e o sul do Sudão.

Al-Bashir nega as acusações e se recusa a tratar com a corte. Atualmente não há nenhum mecanismo internacional para prendê-lo, pois a principal ferramenta da corte é a pressão diplomática para que os países entreguem os suspeitos.

O promotor do TPI, Luis Moreno-Ocampo, sugeriu que o presidente poderia ser preso, caso deixasse o Sudão. Mas o presidente, neste meio tempo, desafiou a ordem de prisão e esteve em visita ao Egito, Eritréia, Líbia e participou da Cúpula da Liga Árabe em Doha no Catar, onde recebeu apoio e foi citado na declaração final com rejeição à medida da corte.

Algumas nações africanas ameaçaram se retirar do TPI em retaliação ao mandado de prisão contra al-Bashir. Treze países africanos estão entre os 108 membros da corte.

A larga demonstração de apoio a al-Bashir apesar da adesão de muitos países ao TPI se deve ao fato de o movimento realizado pela justiça internacional para responsabilizar o presidente sudanês criar precedentes que podem se estender a outros governantes igualmente acusados de violações de direitos humanos. Leia mais em: Página Oficial do Tribunal Penal Internacional, Shifting sands in the Arab world, da Aljazeera.net; Página Oficial da ONU sobre o Sudão (UN Sudan Information Gateway) e UN Darfur Humanitarian Profile.

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Cai o presidente de Madagascar

Uma série de protestos populares e mobilizações contra o presidente do Madagascar, Marc Ravalomanana, levou a uma intervenção de setores do exército do país para destituí-lo.

Ele é um empresário dono de uma grande empresa produtora de iogurte e havia sido eleito pela primeira vez em 2001 e reeleito em 2007. No entanto sua impopularidade cresceu na medida em que começou a misturar negócios do estado com seus interesses privados. A gota d’água foi o anunciou da cessão de terras para a empresa coreana Daewoo Logística desenvolver produtos agrícolas de exportação sem pagar qualquer valor pela mesma.

Madagascar é uma ex-colônia francesa que alcançou sua independência em 1960. A sua renda per capita inferior a US$ 1,000.00 e a economia depende 70% de cooperação internacional, o que explica a revolta diante das atitudes do ex-presidente.

Quem reivindica substituir Ravalomanana na presidência é o jovem prefeito de Antanarivo, a capital do país, Andry Rajoelina, por sua vez também um empresário, mas do setor de entretenimento. Ele se tornou o personagem de oposição mais importante ao tomar a frente de uma grande manifestação de rua que saiu do centro da capital em direção ao palácio presidencial, por sua vez barrada a tiros pela guarda do palácio.

No entanto, não será tão fácil para ele consolidar-se no governo, principalmente, pela alta dependência do apoio externo e a Unidade Africana já declarou que considera ilegítima a deposição de Ravalomanana ameaçando intervir militarmente para restaurá-lo na presidência. Leia mais em: Timeline: Madagascar political turmoil, da Reuters; Madagascar and Africa – A coup that is not yet irreversible, do The Economist; e Financial Times de 21/03/2009.

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Aumenta tensão entre Coréias

A “Sunshine Policy” que foi instituída pela Coréia do Sul há poucos anos na tentativa de reaproximar as duas Coréias com uma perspectiva, mesmo distante, de reunificá-los foi praticamente cancelada pelo atual presidente Lee Myun-bak devido a sua retórica anti-comunista.

Além disso, a Coréia do Norte já desenvolveu algumas ogivas atômicas e recentemente testou um foguete de longo alcance alegadamente para colocar um satélite na atmosfera, mas na verdade um míssil com capacidade de atingir o território americano do Havaí e Alasca.

Apesar da crescente tensão que isto gerou na região, principalmente, na Coréia do Sul e Japão, não há dúvida que a demonstração da capacidade de fabricar bombas atômicas e de jogá-las a milhares de quilômetros de distância, impulsionará a retomada das reuniões do Grupo dos Seis (EUA, Japão, Coréia do Sul, China, Rússia e Coréia do Norte) para discutir melhores relações e cooperação com a Coréia do Norte. Leia mais em: US to meet with Seoul, Tokyo over NKorea tension; e South wins pitch battle of the Koreas, do Financial Times.

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G20 – Reunião de Londres muita declaração e pouca ação diante da crise

Reunidos para discutir medidas globais de enfrentamento a mais grave crise econômica desde 1929, os países desenvolvidos e emergentes mais ricos definiram um pacote de recursos de US$ 1,1 trilhão em crédito para ajudar os países em dificuldades.

As bolsas de valores reagiram positivamente ao anúncio, apesar de ninguém ter clareza de onde sairá o dinheiro e a má notícia é que US$ 750 bilhões serão administrados pelo FMI. Mesmo com o acordo de que haverá mudanças na composição da direção do Fundo para dar mais influência a países emergentes como a China, Brasil e Índia, não houve mudanças nos critérios de austeridade e ajuste estrutural que condicionam a maior parte dos seus empréstimos.

Calcula-se, por exemplo, que os países do Leste Europeu, altamente dependentes de crédito e investimentos externos, necessitariam de até US$ 500 bilhões para enfrentar a crise e saldar suas dívidas de curto prazo. Se derem calote quebram o sistema financeiro sueco, dinamarquês, austríaco e, possivelmente, bancos de outros países europeus que realizaram grandes empréstimos para os países da região. Para ilustrar, somente os três países bálticos devem aos bancos suecos o equivalente a 20% do PIB deste país.

Portanto, é altamente conveniente atribuir ao FMI o papel de xerife desta situação, o que não se diz, é o custo social desta decisão.

Além do montante de US$ 1,1 trilhão para empréstimos aos países mais vulneráveis, o G-20 afirmou a necessidade de esforços para limpar os balanços dos bancos, extinguir os paraísos fiscais e apertar a regulamentação sobre as instituições financeiras, todos os mercados e todos os instrumentos financeiros, como os “hedge funds”. Porém, não foi definido como isto será feito e esta tarefa foi atribuída aos ministros de economia do grupo num próximo momento.

O presidente da França Nicolas Sarkozy e a chanceler alemã Angela Merkel não conseguiram aprovar sua proposta de criação de um organismo global de regulação com autoridade supra nacional.

De forma conjunta, as medidas sugeridas na declaração final da cúpula de Londres foram uma tentativa de fazer com que as bases do capitalismo, gastos, crédito, produção e comércio, que atualmente estão em retração, possam voltar a se expandir, mas quando Gordon Brown, primeiro ministro inglês e Barack Obama foram perguntados pela imprensa sobre o grau de importância da Cúpula para o encaminhamento da crise e da economia mundial, ambos fugiram do tema, pois a economia mundial piorou desde a realização da Cúpula em Washinton em novembro do ano passado e as expectativas para o atual encontro do G-20 eram limitadas.

Gordon Brown ainda chegou a declarar após a Cúpula que uma nova ordem mundial estava surgindo, e com ela as novas bases para uma nova era progressiva de cooperação internacional, referindo-se à participação e importância de Brasil, China e Índia no fórum.

No entanto, embora os países tenham reafirmado o compromisso feito em 2008 de não investir em políticas protecionistas, desde a reunião de novembro, 17 dos 20 países membros originais do grupo, incluindo os EUA, agiram de forma a proteger suas indústrias domésticas. No caso norte-americano, as ações protecionistas incluem os pacotes de ajuda à industria automobilística e parte do pacote de estímulo de US$ 787 bilhões para o programa “Buy American”.

Tampouco faltaram protestos e foram iniciadas uma semana antes da reunião com grandes passeatas em Londres e nas principais capitais européias chamando a atenção para a pobreza, mudanças climáticas e principalmente, a recusa de uma grande parcela da população em aceitar que o ônus da crise seja dividido igualmente.

Um grupo de grandes ONGs ligadas a temas de desenvolvimento e luta contra pobreza apresentou uma declaração aos chefes de Estados do G-20. No documento, pedem aos líderes que pensem em um novo tipo de política, longe da competitividade e visão nacionalista que normalmente soa levadas às negociações internacionais. De acordo com eles, é necessário concentrar os esforços para pensamento em longo prazo, planejamento e compromisso em âmbito global.

No Brasil, as manifestações foram integradas ao conjunto de protestos ao redor do mundo. Os movimentos sindical, social e estudantil convocaram, para várias capitais, atos no dia 30 de março sob o nome Ato Internacional Unificado contra a Crise. Leia mais em: Comunicado do G-20 – Global plan for recovery and reform (02/04/2009); El G20 y los PRAE, da Alainet; NGO Leaders Challenge G-20 Summit To Expand Scope, do Huffington Post.