Michel Temer certamente será lembrado como um dos mais covardes presidentes que este país já teve. O máximo que faz é desfazer, usando de meios escusos e jogando com uma base aliada fisiológica para desconstruir com mão pesada aquilo que a duríssimas penas os deputados constituintes botaram de pé em 1988. Completados treze meses de governo, não há nada, absolutamente nada, relevante que sua gestão tenha apresentado de positivo à sociedade brasileira.

Pois agora, encorajado pela dupla Meirelles-Ilan, parece que o sujeito resolveu se mexer, mas mexeu para o lado errado. Em um contexto de grave depressão econômica e consequente queda da inflação para baixo do limite inferior da meta, o governo decidiu reduzir a meta de inflação. Dos atuais 4,5%, chegaríamos em 2019 com 4,25% e em 2020 com 4,0%.

Claro que reduzir a inflação é um objetivo desejável e importante. Ocorre que, a não ser que se acredite nos poderes da “fadinha da confiança”, mexer na meta da inflação pode ter muito pouco impacto no controle efetivo da taxa de inflação. A persistência da inflação brasileira em patamares superiores à que se verifica em outros países tem causas muito específicas, jabuticabas para as quais os diretores do Banco Central parecem não ter olhos.

Em primeiro lugar, como bem sabe qualquer aluno de primeiro ano de economia, muitos preços no Brasil ainda estão indexados, isto é, são corrigidos anualmente de acordo com algum índice de inflação – são os casos, por exemplo, dos aluguéis, dos serviços de energia, telefonia, pedágio, TV a cabo, etc. Por isso, sempre que houver algum choque de preços (quebra de safra, aumento do preço do petróleo, seca na horta, valorização do dólar, etc) aqueles preços deverão se ajustar de forma automática, esparramando para o resto da economia um “desequilíbrio” que deveria permanecer localizado e restrito no tempo.

Em segundo lugar, dada a aviltante desigualdade de renda no Brasil, sempre que o país crescer um pouquinho e conseguir incluir os mais pobres no mercado de trabalho haverá alguma pressão altista sobre os preços, afinal, a não ser por absoluta necessidade, não é razoável supor que as pessoas continuem aceitando trabalhar como empregados domésticos ou serventes de pedreiro em troca de salários que não garantem condições mínimas de sobrevivência. Até mesmo o controverso Delfim Netto, na época em que dava seus pitacos no governo Lula, chegou a dizer que esse componente da inflação brasileira podia ser considerado como uma “inflação civilizatória”, isto é, um ônus a se pagar se quiséssemos superar o atraso social.

Por isso, diante destas e outras particularidades da estrutura de preços do Brasil e considerando que o nosso Banco Central insiste em manter um modelo “puro sangue” de regime de metas de inflação, pelo qual não são permitidos expurgos das elevações de preços derivadas dos tais choques exógenos, parece uma temeridade baixar o centro da meta, sem que antes sejam tomadas outras medidas mais efetivas para o controle inflacionário. Na verdade, justamente porque estamos atravessando um período de queda abrupta das taxas de inflação, esse seria o momento ideal – e raríssimo! – para eliminar o quanto for possível os vícios da indexação.

Sem isso, o risco de reduzir a meta de inflação é que assim que houver alguma recuperação econômica para fazer os preços convergirem ao novo alvo, muito provavelmente será necessário manter a taxa de juros em patamares por demais elevados, impedindo que a economia volte a rodar em ritmo suficiente para fazer crescer o emprego e desenvolver o país. Ficaríamos condenados a navegar em ponto morto, embalando vez ou outra nas marolas do mercado externo.

Claro que, para o rentismo e os ministros-banqueiros do governo, aquele arranjo parece lindo. Bancos e rentistas salivam com juros e têm calafrios com inflação.

Não por outro motivo, ao tratar do tema na CBN, o economista Luiz Gustavo Medina, perfeitamente afinado com os anseios do “mercado”, repetiu ao âncora Sardenberg uma frase emblemática do que este segmento pensa: “Agora que já definimos a meta até 2020, podemos resolver coisas menos importantes, como ver quem vai ser o presidente.” Não poderia ser mais preciso.

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