O novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que toma posse nesta terça-feira (20), deve mudar o relacionamento do país com a América Latina. A avaliação é do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que acredita que o momento político americano é também uma oportunidade para o fim do bloqueio econômico a Cuba.

“Os Estados Unidos, durante muito tempo, tiveram uma política equivocada para a América Latina”, afirmou Lula em seu programa semanal de rádio, Café com o Presidente. ” É importante que Obama faça um sinal para Cuba. É importante que o bloqueio seja desobstruído para que Cuba possa ter uma vida normal como todos os países, tendo relação com todos os países”, apontou.

Leia abaixo trechos da entrevista do Presidente Lula para o programa de segunda-feira, 19/01:

Presidente, nesta terça-feira, dia 20, toma posse o novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. O mundo inteiro acompanha com atenção esse momento. E no Brasil, qual é a sua expectativa em relação a essa posse?
Aqui no Brasil nós acompanhamos também com muito interesse a posse do presidente Obama. Afinal de contas, não é em todo momento histórico que um país, importante como os Estados Unidos, elegem um negro para presidente da República. Isso por si só é um fato extraordinário. Mas o que é importante é que o Obama toma posse num momento delicado da política externa e da política interna americana. Do ponto de vista da política interna você tem a crise financeira, que nasceu dentro dos Estados Unidos, e está causando danos sobretudo para as pessoas mais pobres, no campo da habitação. Segundo: ele vai viver um problema sério que é o problema do Oriente Médio, que está se agravando. Ou seja, o Clinton tentou resolver, o Bush tentou resolver. O dado concreto é que o acordo no Oriente Médio depende muito da política americana. Nós tentamos criar o Grupo de Annápolis para ver se colocávamos outros países em negociação. Não deu certo ainda, só fez uma reunião. A segunda reunião que era para ser feita em Moscou ainda não aconteceu. Mas esse é um problema que o Obama vai ter dizer com muita competência se quer efetivamente a paz no Oriente Médio, ou não. A terceira coisa, que eu acho que o Obama precisa fazer, é a questão do acordo da OMC (Organização Mundial do Comércio), a Rodada de Doha. Nós estivemos por um milímetro para fazermos o acordo. No último momento não havia mais, eu diria, disposição política do governo americano de fazer porque estava o Bush no final de seu mandato, mas eu penso que era importante que o presidente Obama tomasse outra vez a iniciativa para que nós pudéssemos concluir o acordo de Doha, porque seria uma ajuda enorme nesse momento de crise para os países mais pobres, sobretudo aqueles que têm a agricultura como base de sua economia. Esses são os fatos importantes e por isso a minha expectativa. Aqui no Brasil, nós certamente vamos continuar com a boa política que temos com os Estados Unidos. Ela é histórica e eu penso que o Obama, se quiser, pode aprimorar essa relação com o Brasil, aperfeiçoar porque se os Estados Unidos são o país mais importante do mundo, o Brasil é o país mais importante da América Latina.

E com relação a América Latina de uma forma geral, presidente, a posse do presidente americano Barack Obama muda alguma coisa nesse relacionamento?
Eu acredito que deva mudar e deve mudar muito, veja, porque os Estados Unidos durante muito tempo tiveram uma política equivocada para a América Latina. Ora, no tempo da Guerra Fria havia aqui na América Latina apenas grupos revolucionários ou comunistas, ou seja, depois teve a participação americana em vários golpes aqui na década de 60 em quase todo o Continente. E eu penso que agora o Obama tem que olhar agora para a América Latina com o olhar democrático, com um olhar desenvolvimentista, com um olhar de um país importante como os Estados Unidos que pode ajudar os países periféricos, sobretudo da América Central e do Caribe. Acho que é importante que o Obama faça um sinal para Cuba, ou seja, não há mais nenhuma explicação científica, política para que continue o bloqueio. É importante que isso seja desobstruído para que Cuba possa ter uma vida normal como todos os países, tendo relações com todos os outros países. Acho que o presidente Obama vai ter de ter uma política especial para a América Latina, ou seja, não é possível que os Estados Unidos, em algum momento, não tenham uma política, eu diria preferencial na sua relação com a América Latina.


Presidente, em relação a questão do clima, com a chegada do presidente Obama muda alguma coisa?

Eu acredito que sim. Estou torcendo para que mude, sobretudo se a gente levar em conta que os Estados Unidos ainda não assinou o acordo de Kioto, que é muito importante para que a gente possa cuidar da questão climática, ou seja, nós temos que diminuir a emissão de gás de efeito estufa, nós precisamos fortalecer a matriz energética limpa e o Brasil tem um potencial extraordinário com o etanol. Os Estados Unidos também têm um potencial , só que o potencial produzido a base de milho, que não é interessante para a economia, ou seja, pode ser interessante em algum momento para os Estados Unidos, mas no ponto de vista da economia e do preço dos alimentos não é importante produzir etanol a base de milho, mas sim de outro produto da cana, ou de terceira geração. De qualquer forma esse é um assunto que estará na pauta do Brasil e dos Estados Unidos a partir de agora, eu acho que com mais êxito do que teve no governo passado porque em todos os discursos de campanha o Obama foi mais palatável, foi mais flexível com relação a questão ambiental. Eu penso que aí há um espaço de fertilidade extraordinário para que o Brasil possa aprofundar esse tema com os Estados Unidos.