Jornadas CEDEM/UNESP debatem os 200 anos da imprensa no Brasil
O Centro de Documentação e Memória (CEDEM) da UNESP promove nos dias 8 e 9 de outubro, às 18h30, uma jornada de debates sobre os 200 anos da imprensa no Brasil com historiadores e jornalistas. O primeiro debate (8/10, 18h30) – O poder da palavra impressa: entre livros e jornais (séculos XIX e XX), terá como palestrantes Dainis Karepovs (Fundação Perseu Abramo) para falar sobre A esquerda nos jornais: arquivo e memória, e Flamarion Maués (historiador e editor) cujo tema será Literatura de protesto nos “anos de chumbo”. A mediação será de Lincoln Secco (docente da USP). O segundo debate (9/10, 18h30) – Livros e práticas de leitura no Brasil (séculos XIX e XX) – contará com a participação de Airton Cavenaghi (Universidade Anhembi-Morumbi) que falará sobre Por um catálogo de livros impressos em São Paulo no século XIX, e Nelson Schapochnik (Faculdade de Educação da USP) sobre A História da leitura no Brasil: Dimensões. A mediação será de Marisa Midori Deaecto /USP.
A participação é gratuita, mas é preciso inscrever-se pelo e-mail [email protected] . Local: CEDEM/UNESP – Centro de Documentação e Memória – Praça da Sé, 108 – 1º andar metrô Sé – (11) 3105 – 9903 – Mais informações: www.cedem.unesp.br
Os debatedores e seus temas
A esquerda nos jornais: arquivo e memória – Dainis Karepovs – Editor da Revista Perseu (Fundação Perseu Abramo)
Embora se comemorem neste ano dois séculos de existência da imprensa brasileira, o objeto desta apresentação é um pouco mais jovem. Mas não muito. Trata-se aqui da imprensa que representava os interesses dos trabalhadores rurais e urbanos brasileiros, em torno das idéias do socialismo. Podemos chamá-la de imprensa de esquerda.
No Brasil ela surge ainda na primeira metade do século XIX, vinculada às formas de organização que os trabalhadores daquela época promoviam. A referência mais antiga encontrada é a do jornal O Defensor dos Caixeiros, de 1837 (Salvador-BA). Foram identificados, para o século XIX, cerca de 300 títulos de periódicos vinculados à imprensa operária e socialista. Em sua maioria eles não ultrapassam o primeiro número. Tal característica é resultado da falta de recursos econômicos, que se combina com a formação tardia e o desenvolvimento intermitente da classe trabalhadora brasileira. A isso se devem acrescentar os acachapantes índices de analfabetismo que acometem os trabalhadores brasileiros.
No século XX, em especial a partir de meados dos anos de 1910, a imprensa de esquerda fica mais vigorosa e consegue uma relativa continuidade. Portanto, uma maior capacidade de difusão e implantação de suas idéias entre os leitores. Tal continuidade, relativa, reitere-se, justifica-se pela expansão da influência nas fileiras dos trabalhadores brasileiros das diversas vertentes socialistas, o anarquismo, o socialismo, o comunismo ou suas variantes. As interrupções dos títulos e o surgimento de outros não apaga o fio de continuidade das diferentes correntes em que se dividem os socialistas brasileiros. Por eles é possível acompanhar sua vida, seu desenvolvimento, suas vitórias, suas derrotas. Mas ainda hoje não temos no Brasil algo que possa ser compreendido como uma imprensa de esquerda nos mesmos moldes – e tiragens! – do que ocorre em outros países.
Evidentemente, neste percurso de cerca de 170 anos, muitos desses registros se perderam. Descaso, em pequeno número, e repressão política, em grande parte, explicam as ausências e uma visão incompleta sobre a história dos trabalhadores que ainda temos em nossos dias. Hoje, com uma estabilidade política e institucional que alcança inéditos prazos em nossa história republicana, temos incorporado ao nosso manancial de pesquisa uma série de acervos que enriquecem este universo e permitem cada vez mais uma melhor compreensão da história e do desenvolvimento das lutas dos trabalhadores brasileiros. Mas se temos uma crescente incorporação de fontes, ainda estamos longe de possuir condições materiais e tecnologicamente adequadas à preservação desta imprensa. É este o combate que se afigura como primordial em nossos dias: o legado ao futuro.
Os livros de denúncia da tortura e da repressão política após o golpe de 1964 – Flamarion Maués – doutorando em História (FFLCH-USP)
Alguns livros tiveram importante papel na denúncia da repressão política e das violações aos direitos humanos no Brasil após o golpe de 1964, transformando-se em armas políticas e instrumentos de mobilização no país e no exterior.
Desde o livro Torturas e torturados, de Márcio Moreira Alves, lançado em 1966, com a denúncia dos casos ocorridos logo após o golpe, até Brasil: Nunca mais, coordenado por D. Paulo Evaristo Arns e editado em 1985, houve várias publicações que cumpriram esse papel.
Algumas dessas obras circularam apenas no exterior, outras tiveram circulação quase clandestina, xerocadas e distribuídas de mão em mão. Mas houve até aquelas que se tornaram best-sellers.
Nossa proposta consiste em identificar essas obras, destacando as mais importantes e de maior repercussão. A ênfase recairá sobre os livros produzidos entre 1970 e 1980, ou seja, a partir do momento em que a tortura já era amplamente utilizada contra os perseguidos políticos e a estrutura de repressão se encontrava em pleno funcionamento, até o período imediatamente posterior à anistia.
Por um catálogo de livros impressos em São Paulo no século XIX – Airton José Cavenaghi – Assessor acadêmico e professor da Universidade Anhembi-Morumbi e Laureate International Universites
Muito se fala sobre as origens e a produção de livros em território paulista. Na análise do panorama da publicação de livros na então Província de São Paulo, no século XIX, percebe-se a impossibilidade de se rastear muitas informações bibliográficas em obras escritas durante o período, na Província ou mesmo em outros países. O hábito, por exemplo, de não se citar corretamente as fontes de consulta, usado constantemente por autores do período, persiste até mesmo nas décadas iniciais do século XX e contribui diretamente para o desconhecimento dos autores e das obras utilizadas por um determinado escritor.
Nessa palestra procuramos, de forma sucinta, relatar os caminhos percorridos para o resgate de informações atinentes à produção editorial da Província e futuro Estado de São Paulo, durante a segunda metade do século XIX e os anos iniciais do século XX. Trata-se, enfim, de investigar a maneira como o cotidiano histórico da Província se formou, influenciando e também sendo influenciado pela produção de um manancial particular de obras impressas na região paulista.
História da Leitura no Brasil: dimensões – Nelson Schapochnik – Docente (FE-USP)
Há uma história da leitura no Brasil?
A pergunta não tem caráter escolástico. Ao contrário, ela busca situar o campo de investigação em evidente crescimento no Brasil. Caracterizadas por sua interdisciplinaridade, as pesquisas nesse campo sofreram forte influência das diretrizes adotadas nos centros universitários europeus, em particular, da França.
Seria, então, a história da leitura uma “frutinha exótica” no pomar das delícias tropicais? Ou, para retomar uma bela asserção de José de Alencar, “o povo que chupa o caju, a manga, o cambucá, e a jabuticaba, pode falar uma língua com igual pronúncia e o mesmo espírito do povo que sorve o figo, a pêra, o damasco e nêspera?”
Minha argumentação será no sentido de apresentar algumas linhas de força que atestam o vigor deste campo de investigação dotado de substância, inquietação intelectual e diálogo inventivo que o afasta de qualquer modismo ou fascínio imitativo.
Desta forma, a abordagem a cerca dos caminhos da história da leitura no Brasil se orienta por uma apreciação genealógica, o que não implica em uma visão evolutiva da temática. Esta genealogia tem por princípio resgatar alguns momentos decisivos em que o leitor emergiu para o primeiro plano da análise histórico-literária, os quais se fixam nas contribuições de alguns críticos de nossa cepa (Augusto Meyer, Magalhães Junior, Brito Broca); nos primeiros estudos acadêmicos, nos anos de 1970, que colocaram em cena a figura do scholar; e na década de 1980, na consolidação da temática por meio dos programas de pós-graduação, que garantiram a formação de novas gerações de especialistas voltados para a problemática do leitor brasileiro.