O engajamento do PT na luta pela democratização das comunicações – em suas várias vertentes – é fundamental para que o país avance nessa área, segundo o entendimento dos participantes do debate “O Governo Lula e o Direito à Comunicação”, ocorrido na tarde desta sexta-feira (25) durante a 1ª Conferência Nacional de Comunicação do PT.

Coordenada pelo presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini, a mesa teve o ministro Franklin Martins (Comunicação Social) como expositor principal e reuniu cerca de 200 pessoas no auditório do hotel San Marco, onde acontece a Conferência.

Com a tarefa de comentar a exposição do ministro, o professor Venício Lima (Universidade de Brasília), o deputado federal Wagner Pinheiro (PT-Bahia), João Brant (Coletivo Intervozes) e José Luiz Sóter (diretor da Abraço/Associação Brasileira de Rádios Comunitárias) defenderam a necessidade de o governo federal convocar uma ampla Conferência Nacional de Comunicação como forma de envolver a sociedade no debate dos temas relativos ao assunto.

A reivindicação foi uma resposta à fala inicial de Franklin, para quem a Conferência traria mais resultados se fosse convocada pelo Congresso Nacional. Em sua exposição, o ministro também falou sobre a concentração de mídia no Brasil e disse que este é um problema de difícil solução.

“Vai resolver como? Se proibir simplesmente, a própria sociedade vai voltar a gerar uma nova concentração”, analisou, concordando, porém, com a necessidade de combater a chamada propriedade cruzada, além de estimular o conteúdo nacional e a produção regional e independente.

Sobre a falta de política para as rádios comunitárias – um dos pontos mais debatidos desta mesa – Franklin admitiu que o governo federal está aquém das expectativas e sugeriu que a sociedade exerça mais pressão para que haja avanços neste campo.

Para Franklin, a digitalização, o processo de convergência tecnológica e o conjunto de mudanças sociais vividas pelo País são elementos que provocar, naturalmente, mudanças no atual modelo de comunicação.

O ministro afirmou que a própria sociedade se encarrega de exercer o controle sobre os veículos e que, ao governo, caberia, como primeira função, garantir a “absoluta liberdade de imprensa”, mesmo quando não gosta do que ouviu ou leu. “O leitor percebe quando a mídia passa do ponto”, justificou.

O povo não é bobo

Os meios de comunicação tradicionais, segundo o ministro, fazem investimentos pesados e disputam um público plural. “Você pode fazer um jornal partidarizado, mas será difícil mantê-lo. Em princípio, as pessoas não querem um jornal partidarizado, mas sim amplo. Os jornais são obrigados a ser plurais por conta da escala comercial, mas, às vezes, eles ousam e tomam partido”.

O ministro destacou que o momento é de mudanças inevitáveis. A entrada do padrão digital amplia o espectro, possibilita tecnicamente que a oferta seja aumentada.

Sobre o processo de convergência de mídia, o ministro disse que as teles têm a possibilidade de produzir conteúdo e entrar na área das televisões e vice-versa. “Computador, telefone celular tendem a desaparecer. É uma mexida brutal. As teles têm poder econômico muito maior que os grupos de comunicação”, comparou.

Para Franklin, o processo digital é extremamente importante porque o Brasil está se tornando menos homogêneo, mais complexo. “Não há mais um formador de opinião da classe média que impõe suas informações e opiniões às classes mais baixas. Os jornalões estão com tiragem estagnada, já os jornais populares estão crescendo fortemente. Dos 15 jornais de maior circulação no Brasil hoje, sete são populares”, citou.

Regras

Franklin afirma que não basta discutir regras e princípios, mas criar mecanismos e aplicá-los. “Não temos agência reguladora, o Ministério das Comunicações se limita a questões técnicas. É necessário criar uma instância que seja capaz de aplicar a lei e exigir o cumprimento da lei. É preciso diminuir a concentração dos meios de comunicação, discutir se existe a força para descruzar a propriedade”.

Ao defender a regionalização, ele lembrou que o país pagou um preço muito alto pela integração nacional que as grandes redes nacionais protagonizaram a partir de 1968. “Houve um sacrifício da cultura regional e não temos mais que pagar este preço.”

O ministro também defendeu a produção independente, separando-a da divulgação e favorecendo a democratização; a necessidade de garantir espaço à produção nacional diante do processo crescente de internacionalização.

Sobre as rádios comunitárias, afirmou que “não há justificativa para que o governo Lula não tenha honrado os compromissos que fez”. “Rádio comunitária hoje é um faroeste. O governo tem que fazer um mutirão, um esforço para aplicar a legislação. A sociedade, vocês, têm de pressionar. É possível fazer, é questão de organizar e enfrentar os interesses contrários”, disse Franklin.

Controle

O professor da UnB Venício Lima afirmou que a experiência de outras democracias liberais mostram ser possível intervir de formas diferentes, “para não deixar a comunicação inteiramente por conta do mercado”.

“Nos EUA, as regras sobre propriedade privada que atingem a mídia eletrônica se estendem à imprensa. Apesar de flexibilizada em 1996, há controle de veículos impressos e mídia eletrônica”.

Segundo ele, a regulação da mídia eletrônica obedece a princípios já aprovados na Constituinte – evitar a concentração, a propriedade cruzada, e estimular o conteúdo nacional e a produção regional -, mas em artigos não regulamentados.

“A expectativa era de que o governo Lula fosse tomar iniciativas para mudar esse quadro, e isso e não ocorreu”, lamentou, destacando também o exemplo das rádios comunitárias.

Direito humano

O mais aplaudido pelo plenário, deputado Wagner Pinheiro (PT-BA) defendeu que a Conferência Nacional de Comunicação tem de ser convocada pelo Executivo porque o tema, em sua opinião, é tão importante quanto o da saúde.

Ele também falou sobre a importância do engajamento partidário. “O PT tem de estar à frente da mobilização para mudar a realidade da radiodifusão no País, porque comunicação é direito humano e não pode ser propriedade de meia dúzia. O PT não pode pensar em comunicação só em época eleitoral”, alertou.

Para o deputado, é preciso discutir o “ouro da Babilônia” do espectro de radiodifusão, englobando temas como os limites para as rádios comunitárias e os prazos de concessão às emissoras comerciais.

Pinheiro defendeu ainda a modernização das leis que regem o setor. “Nossa legislação de radiodifusão é da década de 1960. Estamos colocando o dedo na ferida. Por que a produção da caatinga não é mostrada na TV? A gente só vê neve na televisão brasileira”, disse o parlamentar, ao criticar a programação das tevês por assinatura.

Ele destacou avanços do atual governo, como a criação da TV Pública, mas foi na mesma linha dos demais a respeito das rádios comunitárias. “Virou um mangue, como dizemos lá na Bahia. Precisamos botar o dedo nessa ferida e ter TV comunitária também”.

Tomar as rédeas

João Brant, do Coletivo Intervozes (80 associados em 16 Estados), disse ver contradições no debate das políticas de comunicação. “A gente relativiza o poder dos meios de comunicação, mas não os enfrenta. Precisamos discutir para descobrir como tomar a rédea de certas situações”, disse.

Ele lembrou que, em 2007, a Casa Civil tentou cobrar das grandes emissoras se elas haviam cumprido suas obrigações legais e constitucionais. Elas responderam que não cumpriram porque não houve fiscalização no período (tarefa do Ministério das Comunicações).

“Infelizmente, as políticas têm sido construídas de forma a proteger o grande capital nacional. Tem havido uma leniência do governo, e o PT precisa questionar isso”.

Relação conflituosa

José Luiz Sóter, da Abraço, afirmou que o Ministério das Comunicações dificulta a vida das rádio comunitárias que têm um trabalho de cunho social e cultural. “A Polícia Federal tem dossiê completo das rádios comunitárias, enquanto o MC não tem nada nem fiscaliza”, disse Sóter.

Ele afirmou ainda que a Anatel tem hoje um orçamento de US$ 48 milhões para rastrear as “rádios piratas”. “Precisamos entender que relação conflituosa é essa. O governo reconhece que o tema é importante, mas segue em dívida. Temos de criar um processo transparente nas autorizações no Ministério das Comunicações, hoje deficiente, além de criar um controle social e um conselho de acompanhamento do processo de autorizações”.

Publicado no portal do PT – 25/04/2008