Em 2008 se comemora o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Aprovada em 10 de dezembro de 1948, quando as Nações Unidas tentavam imaginar regras de convivência entre os países e também entre ricos e pobres de cada país para afastar o fantasma de uma nova guerra, essa convenção-mãe dos instrumentos humanitários de alcance internacional desdobra em 30 artigos a idéia central: todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

Em 2008 se comemora o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Aprovada em 10 de dezembro de 1948, quando as Nações Unidas tentavam imaginar regras de convivência entre os países e também entre ricos e pobres de cada país para afastar o fantasma de uma nova guerra, essa convenção-mãe dos instrumentos humanitários de alcance internacional desdobra em 30 artigos a idéia central: todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

Eleanor Roosevelt, que jogou papel decisivo em sua aprovação, considerou o documento uma verdadeira Carta Magna da humanidade. O aniversário deve ser aproveitado para uma reflexão abrangente, visando a formatar novas políticas públicas e iniciativas da sociedade civil para transformar em fato concreto os belos enunciados que apontam para um contexto de paz e justiça que só os ingênuos acreditam estar ao alcance das mãos. Vale lembrar o alerta de Bobbio sobre a distância que separa a declaração e o mundo real que nos cerca.

Acaba de ser aprovada, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, a proposta brasileira de aproveitar o 60º aniversário para construir consenso em torno de metas mundiais referentes aos direitos humanos, seguindo o êxito obtido com as Metas do Milênio.
Com forte apoio sul-americano, a iniciativa do Brasil abre caminho para que seja lançado um subconjunto de metas a serem perseguidas nas décadas seguintes. Fim da pena de morte em todo o planeta? Eliminação definitiva da tortura? Efetiva abolição da escravidão e do racismo? O que mais?

No Brasil, a 11ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos, em dezembro, será o desaguadouro de debate nacional para atualizar o Programa Nacional de Direitos Humanos. Em 1996, José Gregori era o titular da área, e o Estado brasileiro recolheu 228 propostas da sociedade civil para instituir a primeira edição do programa, com ênfase nos direitos civis e políticos. Em 2002, sendo Paulo Sérgio Pinheiro o titular, o PNDH-2 acolheu 518 proposições, com acento nos direitos econômicos, sociais e culturais.

O debate de 2008 deve estabelecer os contornos do PNDH-3, a ser oficializado por decreto presidencial, como os anteriores.

Em resumo, trata-se de atualizar propostas e planejar as intervenções necessárias para que o Brasil seja, cada vez menos, o país daquela jovem presa e violentada em Abaetetuba (PA), do bebê morto na prisão de Cariacica (ES), do adolescente executado sob choques elétricos em Bauru (SP). E, cada vez mais, uma terra onde a fome e a extrema pobreza sejam erradicadas, onde cresça a inclusão social e educacional e onde declinem as estatísticas a respeito da violência. No aspecto atualização, merece registro a emergência de novos sujeitos.

No calendário de 2008, teremos em maio a primeira conferência nacional do segmento GLBT, abordando o direito à diversidade sexual; no segundo semestre, a segunda edição de duas conferências iniciadas no governo Lula – direitos do idoso e direitos da pessoa com deficiência – e um encontro mundial, em novembro, com 5.000 participantes, sobre exploração sexual de crianças e adolescentes.

São temas e atores que ocuparão espaço crescente na terceira versão do PNDH, assim como as várias questões abordadas nos encontros nacionais sobre igualdade racial, direitos da mulher, segurança alimentar, saúde, criança e muitos outros.

Queremos convidar para esse mutirão de debates, de forma especial, três segmentos que ainda não se integraram plenamente ao itinerário de lutas que as comissões parlamentares e os movimentos sociais dos direitos humanos trilharam nas últimas décadas. Os três segmentos são a universidade, o Judiciário e a mídia. O ministro Fernando Haddad vai articular nas federais seminários e debates -que proporemos a todas as outras universidades. Tivemos audiências com a ministra Ellen Gracie abordando a idéia e levaremos a sugestão também ao Judiciário dos Estados, chamando juízes, procuradores e defensores públicos. A mídia pode ter papel decisivo nesse campo, informando que os direitos humanos não podem ser confundidos com a defesa de bandidos, como ainda divulgam alguns veículos diariamente.

Avanços existem, são palpáveis e muitos. Mas a violência que segue grassando no país torna o chamado a esse debate muito mais que um simples convite. É uma convocação aos brasileiros e brasileiras de todos os credos, de todas as convicções e de todos os partidos a um esforço solidário.

Paulo Vannuchi é ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

Publicado originalmente na coluna Tendências/Debates da Folha de S.Paulo em 30/12/2007.