O PT e a base

Muitos de nós fundadores do Partido dos Trabalhadores aprendemos a fazer política no PT e o temos nosso primeiro e único partido. Começamos nas vilas populares, nas CEBs, nos movimentos sociais e sindicais. Estávamos antes na luta social, depois descobrimos a necessidade da ferramenta partidária e de um partido construído a partir da base, com nossas próprias práticas e idéias.

Os núcleos – o meu da Lomba do Pinheiro, arredores de Porto Alegre, criado em 1981, formado basicamente por trabalhadores da construção civil e donas de casa – eram o espaço privilegiado de atuação. Eram espaços de aprendizado, de analisar politicamente a ação comunitária (ou sindical ou estudantil), de educação política. Tudo era novo, por fazer, por construir. Não havia caciques de nenhum tipo, nem vereadores, nem deputados, nem prefeitos. Todos eram iguais, estudantes e pedreiros, médicos e donas de casa, arquitetos e bancários, metalúrgicos e trabalhadores rurais, professores e funcionários públicos. A base do PT era essa, a ‘cúpula’ do PT era essa, trabalhadores braçais, trabalhadores intelectuais, militantes todos das boas causas, dos direitos, da dignidade, da transformação, do socialismo.

É possível repetir esse modelo e história hoje, 2007, quando o partido tem uma centena de deputados federais e senadores, governadores, centenas de prefeituras, milhares de vereadores, a presidência da República?

Não vejo esta possibilidade. Mudaram as condições políticas, mudou o PT. Naquele tempo, o emprego era quase total, não se precisava da economia solidária, pelo menos no grau de urgência de hoje. A luta direta era entre capital e trabalho, na mobilização social, nas greves, nas ocupações urbanas e rurais de terra. Era preciso democratizar a sociedade, lutar por Diretas-Já, por liberdade de organização sindical e de expressão, acabar com a ditadura. Por isso, a militância era na pastoral da igreja, na organização social e no partido político, todos estavam em tudo ao mesmo tempo. Nem se sonhava com algo como a Internet, que integra todos instantaneamente, quase nem mais se precisa de reunião física. Hoje o embate é global, de grandes estratégias nacionais, de coalizões para governar, de disputa com o poder econômico, político e ideológico.

Ando pelo Brasil como Assessor Especial de Mobilização Social do Presidente, e vejo grande motivação: as pessoas querem formação, estão retornando aos movimentos de base, há novos atores sociais, como os catadores e recicladores, os que participam da economia solidária, índios, quilombolas, mas vejo pouco envolvimento e interesse partidário destes setores. Como superar isso e mostrar que a ferramenta partidária é necessária, não é apenas institucional e eleitoral, mas que está a serviço da transformação?

Primeiro, é preciso recuperar os valores da militância e do compromisso com o povo e a transformação, destruídos a partir do neoliberalismo e da excessiva institucionalização do PT. Segundo, é preciso usar as ferramentas contemporâneas de debate e informação, como a Internet. Terceiro, é preciso (re)criar mecanismos internos permanentes de debate, participação e formação entre os filiados. Quarto, o partido precisa (re)aproximar-se dos setores excluídos da sociedade, (re)abrir o diálogo com os mais pobres entre os pobres. Quinto, o partido precisa (re)tomar a visão estratégica da transformação brasileira.

1980 não existe mais. O PT só será PT se incorporar os trabalhadores e os empobrecidos num projeto de futuro.

*Selvino Heck é membro do DR – PT/RS
*Artigo enviado em 15 de maio de 2007
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