A pergunta é: ainda tem sentido pensar e construir uma sociedade socialista, depois do aparente triunfo histórico do capitalismo e do fracasso do socialismo real? Deve o PT (re)afirmar-se socialista?

O debate sobre o socialismo e sua construção felizmente estão sendo retomados, especialmente através das mudanças em curso na América do Sul. Abriu-se um espaço e uma oportunidade histórica, depois de duas décadas de hegemonia do capitalismo neoliberal. Mas de que socialismo estamos falando?

O capitalismo neoliberal fracassou. Nem seus formuladores e executores hoje o defendem. O individualismo exacerbado, a busca do lucro sem limites, o consumismo, a violência e a criminalidade em crescimento, a concentração de renda, a fome e a miséria, o aquecimento global, as guerras mostram que o sistema capitalista, depois de séculos dominando o mundo, não resolveu os problemas da humanidade nem foi capaz de produzir desenvolvimento sustentável, democracia, justiça e inclusão social.

Já se conhecem os malefícios e contradições do capitalismo. Devido aos desvios e equívocos das experiências socialistas, sabe-se por onde uma proposta socialista pode e deve avançar. Para um novo modelo de sociedade, três elementos são fundamentais: a propriedade, o Estado e a democracia.

A propriedade privada dos meios de produção inevitavelmente leva à concentração de renda, à busca exclusiva do lucro. O direito de propriedade torna-se absoluto e perde qualquer função social. Por outro lado, a questão é como combinar formas de propriedade que evitem o estatismo e a burocratização com um modelo econômico que produza desenvolvimento e igualdade social.

O Estado deve ser democrático, não apenas aparelho de coerção e instrumento de setores privilegiados da sociedade. O Estado deve estar a serviço do povo, especial e prioritariamente dos mais fracos e empobrecidos, ser participativo e includente.

Democracia é controle social do Estado e abertura de espaço e oportunidade de todos se organizarem, expressarem suas idéias, opiniões e diferenças com liberdade, combinando formas de democracia representativa e direta. Sem democracia não há socialismo. A construção do coletivo e do solidário não pode esmagar o individualidade, o pluralismo, a diversidade.

A construção do socialismo não se dá de um dia para outro. É processo, caminhada, onde se constroem e disputam valores, práticas, vivências coletivas e solidariedade ao longo do tempo. Uma revolução econômico-social, sem conquistar consciências, corações e mentes, não implanta uma sociedade igualitária.

O socialismo não é apenas utopia, sonho. É para ser construído a partir da realidade vivida do povo e da sociedade, com uma mística de aprendizado, de partilha, de fraternidade. O Partido dos Trabalhadores, se não alimentar um projeto do novo e do diferente, não sobrevive. Acabará diluído em meio a outros tantos, sem cara, sem identidade, confundido nas práticas e valores com os conservadores, risco corrido em vários momentos de sua história. Por isso não há porque temer as rupturas necessárias nem deixar de enfrentar interesses estabelecidos, privilégios, ideologias e dominações de séculos das elites, dos meios de comunicação, dos detentores do capital. O novo sempre é superação do velho, dialeticamente.

O IIIº Congresso do PT deve (re)afirmar o socialismo como utopia. Mas uma utopia que não é apenas amanhã. Começa a sua realização e prática hoje, no plano individual e coletivo.

*Artigo enviado em 27 de março de 2007
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