Ano 1 – nº 10 – Dezembro 2016

O desmonte temerário das estatais federais

Uma das características mais marcantes dos governos Lula e Dilma foi a reconstrução e o reposicionamento do Sistema de Empresas Estatais Federais, tanto do setor produtivo quanto do setor financeiro. A atuação estatal foi fortalecida especialmente em setores estratégicos tais como energia e petróleo, infraestrutura, bancos públicos, entre outros. O êxito da mudança do papel das estatais pode ser evidenciado pela sua participação ativa na implementação de políticas econômicas anticíclicas e de políticas sociais distributivistas.

No entanto, na contramão do projeto eleito pelas urnas, neste semestre, aproveitando-se do momento de fragilidade na imagem das empresas estatais em função dos casos de corrupção investigados pela Polícia Federal, o governo Temer avançou na direção do desmonte desse patrimônio público. Merecem destaque, nessa conjuntura: (i) a aprovação da Lei de Responsabilidade das Estatais; (ii) a mudança no marco regulatório do pré-sal e a proposta de encolhimento da Petrobras; (iii) a circunscrição no espectro de atuação estatal no setor elétrico e a perspectiva de enxugamento patrimonial da Eletrobras.

Lei de Responsabilidade das Estatais

O governo Temer tem apresentado como uma de suas grandes vitórias a aprovação da chamada Lei de Responsabilidade das Estatais. O projeto tem como ponto de partida uma crítica contra a criação de empresas estatais nos governos Lula e Dilma e como linha de chegada a proposta de retomada da desestatização. O que ele não revela, no entanto, é que tais empresas tiveram papel fundamental na busca de saídas para dois problemas estruturantes da economia brasileira: a ausência de núcleos endógenos de financiamento de longo prazo (daí a importância do fortalecimento das instituições financeiras estatais) e a falta de núcleos endógenos de inovações tecnológicas (daí a relevância da dinamização das empresas estatais não-financeiras).

O liberal-conservadorismo brasileiro sempre buscou o encolhimento da ação do Estado por meio do enfraquecimento das empresas estatais. Ao longo de toda a chamada Era FHC, por exemplo, o país experimentou:

(I) A privatização de setores estratégicos e empresas fundamentais para o desenvolvimento econômico e a soberania nacional, como no caso das áreas de telecomunicações, mineração, além do estímulo ao desmonte do complexo de bancos públicos estaduais.

(II) A fragmentação e a distorção das atividades estatais, como no caso da Eletrobras, com a separação das funções de transmissão, geração e distribuição de energia; ou como no caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que de banco público de investimentos foi reduzido a instituição financeira apoiadora da desestatização.

(III) A descapitalização das empresas estatais articulada à estagnação dos investimentos, organizando aquela que foi a maior transferência de valores patrimoniais do Estado para a iniciativa privada;

(IV) A falta de compromisso com os servidores públicos que permaneceram reféns de diversas operações de redução de pessoal e encolhimento salarial.

(V) Além, é claro, da própria terceirização de serviços públicos fundamentais, como decorrência de todo esse processo.

Tal desmonte veio então acompanhado de um discurso pautado por uma suposta dinamização e eficiência de gestão. No entanto, o que se observou foi uma sequência de problemas marcados justamente pela ineficiência.

Para comprovar tal concepção, basta mencionar alguns resultados apresentados pelo Sistema de Empresas Estatais Federais relativos a 2014/2015, conforme o relatório do Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais, ligado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão1.

No que se refere às instituições financeiras federais: a) a Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF) implementou o Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE), que tem por finalidade oferecer, direta ou indiretamente, cobertura para risco de crédito, de performance, de descumprimento de obrigações contratuais ou de engenharia; b) o Banco do Brasil (BB) manteve a liderança nas operações de crédito do Sistema Financeiro Nacional, com participação de 21% desse mercado; c) o BNDES teve lucro de R$ 8,6 bilhões, resultado 5,4% superior ao ano anterior, em razão da expansão da carteira de crédito e do resultado das participações societárias; d) na Caixa, a carteira de crédito atingiu o saldo de R$ 597,1 bilhões, evolução de cerca de 23%, com destaque para o crédito imobiliário, que atingiu saldo de R$ 337,5 bilhões, expansão de cerca de 25%, e que representa mais de dois terços do mercado.

No que se refere às empresas estatais não-financeiras: e) a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) concluiu sistemas de abastecimento para o atendimento de 23.412 pessoas, esgoto sanitário em onze municípios e a instalação de cerca de 75 mil cisternas; f) a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) procedeu à identificação, delimitação e vetorização de setores de risco a deslizamentos e enchentes, classificados como alto e muito alto em 307 municípios, nos quais foram identificados 2.880 setores, com 194.026 moradias e 849.873 pessoas; g) a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) realizou a cobertura da Copa do Mundo e das eleições e a transmissão digital a partir da nova Torre de TV do Distrito Federal. Ofereceu o acesso a conteúdos de comunicação pública para 163,4 milhões de pessoas (85,7% da população brasileira) em 3.583 municípios; h) a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) desenvolveu o Aplicativo de Vigilância em Saúde e Gestão de Riscos Assistenciais Hospitalares (Vigihosp), um software online para notificações em tempo real de incidentes em saúde, queixas técnicas, doenças e agravos de notificação compulsória; i) a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) inaugurou novo banco genético que triplicou a capacidade de armazenamento de amostras de sementes, tornando-se o maior banco genético da América Latina. A nova capacidade colocará o Brasil entre os três maiores repositórios mundiais do gênero; j) o Hospital das Clínicas de Porto Alegre (HCPA) foi o primeiro centro universitário público a formar cirurgiões em cirurgia robótica. Além disso, renovou a conquista da Acreditação Internacional, conferida pela Joint Commission International, sendo o primeiro Centro Médico Acadêmico do Brasil e o terceiro da América Latina a possuir este selo de padrão internacional de qualidade e segurança; k) a Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) iniciou a distribuição ao Sistema Único de Saúde (SUS) do primeiro produto com marca própria: o Hemo-8r, medicamento considerado mais moderno para o tratamento de hemofilia tipo A. Foram entregues mais de cem mil frascos do produto em 25 serviços de saúde de todas as regiões do país, para beneficiar cerca de nove mil portadores da doença.

Desconsiderar esse conjunto de avanços e apresentar a Lei de Responsabilidade das Estatais como panaceia para os problemas da eficiência estatal, das contas públicas e da corrupção é apenas um subterfúgio para esconder as reais razões que movem o projeto liberal-conservador. A proibição ou restrição de que pessoas com atuação partidária e que ocupam cargos públicos atuem nas empresas estatais é mais uma falácia moralizadora: vale lembrar que a maior parte dos envolvidos na Operação Lava Jato são empresários privados ou diretores de empresas estatais que se encaixam exatamente nesse perfil, nunca foram filiados a partidos ou militaram politicamente.

Além disso, utilizar a tecnocracia como forma de criminalização da política é uma forma de enfraquecer o Estado nas suas responsabilidades com a democracia e com os direitos sociais e trabalhistas, para que se possa fortalecer através do Estado a aliança com certos interesses do rentismo.

Petrobras

Nos últimos anos a Petrobras esteve no centro do projeto industrial social-desenvolvimentista implementado pelos governos Lula e Dilma. A petrolífera estatal brasileira teve papel decisivo no crescimento econômico do país e na recuperação da crise iniciada em 2008, seu plano de investimentos foi decisivo para os projetos do PAC, sua política de conteúdo tecnológico nacional foi fundamental para a reativação da indústria naval e de engenharia pesada, sua política de pesquisa e desenvolvimento foi essencial para a descoberta do pré-sal, e este, por seu turno, permitiu a criação de um fundo social para a educação e a saúde.

Prova disso é que o investimento da Petrobras saltou de US$ 9 bilhões, em 2004, para quase US$ 55 bilhões, em 2013; os efeitos multiplicadores significaram a geração de cinquenta mil empregos na indústria naval e milhares de postos de trabalho na indústria metal-mecânica2. Em suma, os efeitos diretos e indiretos da Petrobras favoreceram tanto a criação de emprego e renda quanto a garantia de direitos.

No entanto, de forma oportunista, o atual governo golpista tem se valido dos desdobramentos da Operação Lava Jato para fazer a opinião pública crer que o combate à corrupção deve ser feito por meio, não do saneamento e do aperfeiçoamento dos instrumentos de governança da empresa estatal, mas sim do desmanche da Petrobras.

Essa atual estratégia apresenta um olhar fortemente concentrado no curto prazo, quando os grandes desafios da empresa e do setor estão orientados para o longo prazo.

No plano de negócios3 para os próximos cinco anos anunciado no último mês pelo presidente da Petrobras, merecem destaque as metas de (I) redução de 25% nos investimentos, que devem ser cortados de US$ 98,8 bilhões para US$ 74,1 bilhões; (II) redução dos ativos da empresa, que deve sair integralmente de setores como os de gás liquefeito (GLP), biocombustíveis, petroquímico e fertilizantes; (III) a venda, já realizada, da Liquigás para o grupo privado Ultragaz; (IV) venda dos 47% de capital votante que a petroleira mantém na Braskem; (V) implementação de uma nova política mantendo os preços de derivados do petróleo em paridade com o mercado internacional.

A grande questão, no entanto, é que a Petrobras precisa encontrar alternativas para a geração de caixa no médio e longo prazos. Segundo o Relatório Financeiro da Petrobras4, cerca de 68% do endividamento da companhia está concentrado após 2019 e, deste percentual, por volta de dois terços após 2021. Além disso, de acordo com o mesmo Plano de Negócios, o preço do barril do petróleo tem perspectivas de uma consistente expansão até 2021, saindo dos atuais US$ 45 para US$ 71. Por fim, cabe ressaltar que, para o mesmo período, há uma forte perspectiva de redução do custo de extração da companhia (cerca de 30% em cinco anos) justamente por conta da maior participação relativa das áreas de exploração do pré-sal.

Portanto, parece mais lógico que a Petrobras fortaleça sua capacidade de exploração e produção, principalmente do pré-sal, a fim de se aproveitar de um cenário mais vantajoso no médio e longo prazos, em termos de preço e custo.

A permanência da Petrobras como operadora em todos os consórcios para a exploração do pré-sal contribui decisivamente para o sistema de controle brasileiro do processo de exploração feito por estrangeiros. Por isso, a ausência da Petrobras não permitiria ao governo aferir eficientemente se a exploração realizada por transnacionais estrangeiras estaria em volumes corretos ou seria subnotificada ao governo brasileiro.

Além do próprio equívoco estratégico da companhia, essas medidas trazem impactos deletérios para o atual padrão de desenvolvimento econômico brasileiro.

Portanto, qual seria o interesse por trás de tais medidas da companhia, bem como do PL 4567/16 que flexibiliza a obrigatoriedade de exploração da Petrobras no pré-sal? O PL proposto pelo atual ministro das Relações Exteriores, José Serra, foi aprovado pelo Senado em fevereiro e pela Câmara dos Deputados agora em outubro e aguarda apenas a sanção do presidente postiço Michel Temer, com isso abre-se a permissão para que outras empresas, além da Petrobras, possam realizar a exploração da camada do pré-sal. Sabe-se que esse projeto tem um grande apoio de empresas multinacionais do setor, bem como de uma fração da classe política contrária ao papel de indutor no desenvolvimento nacional exercido pela Petrobras nos últimos anos.

De acordo com a regra vigente até hoje todos os poços do pré-sal devem ser explorados obrigatoriamente sob a liderança da Petrobras, que deve atuar como operadora única. A estatal tem o direito de se consorciar a outras empresas, nacionais ou estrangeiras, desde que ela seja a líder da operação e tenha no mínimo 30% do consórcio.

Com as mudanças em curso a Petrobras terá o direito de participar da exploração, mas não terá mais a exclusividade, pois os poços poderão ser explorados sob o comando de outras empresas, sejam elas nacionais ou estrangeiras.

Além do atual governo, o projeto foi defendido pelo Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), que representa as empresas privadas interessadas em lucrar com o negócio e também em incorporar a tecnologia de exploração em águas profundas desenvolvida pela Petrobras, além de contar com o apoio dos governadores do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, ambos do PMDB, pois os dois estados são os grandes beneficiados pelos royalties e por isso desejam intensificar a atividade de empresas estrangeiras no setor a fim de estimular as economias locais.

O que uma visada de olhos mais cuidadosa evidencia é mais um dos exemplos em que, com a cumplicidade do Estado, por meio do plano de negócios da empresa e da mudança regulatória, a iniciativa privada se apropria de tecnologias nas quais ela não investiu para intensificar seus ganhos de curto prazo.

As entidades que reúnem os sindicatos da categoria, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e a Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), atuaram contra as mudanças iminentes nas regras de exploração do pré-sal e argumentam que a pressa para a realização de novos leilões no momento em que o preço do barril do petróleo está em baixa interessa principalmente aos Estados Unidos (EUA), pois sua produção tende a entrar em declínio no médio-prazo. Sendo assim, a aceleração da exploração nesse momento atende muito mais a interesses da economia norte-americana do que à soberania da economia brasileira.

A entrada de novas empresas nesse setor deve significar uma ameaça contra a política de conteúdo tecnológico nacional, uma vez que tais empresas devem importar sondas, equipamentos e outros serviços.

Dessa forma, em última instância, se diminui a geração de emprego e renda no país; além disso, segundo Ildo Sauer5 (ex-diretor de gás e energia da Petrobras) o governo brasileiro pode deixar de arrecadar cerca de R$ 331,3 bilhões em 35 anos com o leilão do pré-sal; por fim, o país deve sofrer a redução no volume de recursos destinados ao fundo social encolhendo o potencial de financiamento da educação e da saúde.

Sob o pretexto de solucionar um problema de curto-prazo, o endividamento da Petrobras, a reação liberal-conservadora afronta as possibilidades de construirmos, no médio e no longo prazo, um projeto baseado em um Estado soberano e em um desenvolvimento industrial e tecnológico nacional.

Eletrobras

A Eletrobras atravessa, também, mais uma forte tentativa de desmonte do governo federal, a exemplo do que ocorreu ao longo dos anos 1990 e, como se sabe, culminou na crise energética e no apagão de 2001. As reformas neoliberais do governo FHC afetaram também o setor elétrico por meio de mudanças estruturais que visaram promover uma ampla liberalização do setor. Primeiramente, buscou-se desverticalizar toda a cadeia de energia elétrica com dois grandes objetivos: aumentar a eficiência competitiva do setor e facilitar a entrada do setor privado por meio da transferência patrimonial das companhias estatais regionais.

A fim de atender esse objetivo, o governo FHC inseriu o setor elétrico no Plano Nacional de Desestatização (PND), cuja ideia principal, nesse caso, era permitir uma forte atuação privada, subordinada a um modelo de regulação setorial. As crises financeiras das empresas do setor, principalmente das regionais – que eram sustentadas financeiramente pela Eletrobras – legitimou a adoção dessa estratégia. Ou seja, a privatização se iniciaria pelas empresas estaduais que apresentaram situações financeiras mais fragilizadas.

Na realidade, a partir das privatizações das empresas estaduais o que se observou foi uma forte desorganização com uma regulação ineficiente e ausência de investimentos para garantir o suprimento de energia elétrica para a população. Houve um ‘desmonte’ de equipes e processos de planejamento nas empresas federais e, principalmente na Eletrobras, que perdeu suas funções organizadoras. O erro mais grave foi a interrupção do processo de inventários de novos empreendimentos, deixando à iniciativa privada a realização desses estudos.

Anteriormente às reformas neoliberais, a forma de funcionamento integrada da Eletrobras foi crucial para a expansão dos investimentos e da operação da malha energética. Além de financiar boa parte dos gastos necessários à modernização e desenvolvimento, a Eletrobras tinha um papel fundamental na operação, execução de programas e planejamento do setor elétrico. Ao fragmentar a empresa e desverticalizar o setor, houve uma forte desorganização setorial que, num cenário de ausência de chuvas, resultou na crise energética no início dos anos 2000.

A partir de 2003, estruturou-se uma nova política para o setor fortalecendo o papel da Eletrobras nas parcerias público-privada, articulando a atuação de novos atores estatais para garantir os investimentos e a operação do setor, bem como melhorando a regulação e as condições de atuação privada.

A regulação do setor foi fortalecida, pois esse novo modelo tinha como linhas gerais a competição pelo mercado na geração e a regulação nos segmentos de transmissão e distribuição. Foram delimitados de forma mais clara dois ambientes separados para a contratação de energia: o Ambiente de Contratação Livre (ACL) e o Ambiente de Contratação Regulado (ACR). Essa definição foi importante, pois no modelo anterior almejava-se a criação gradual de um mercado único totalmente liberalizado. Dadas as especificidades do mercado brasileiro em franca expansão, o novo modelo garantia o aumento via leilões no ACR, ao mesmo tempo que, para melhor atender as demandas de grandes consumidores, dava opções de negócio para geradores no ACL. Houve também, por conta disso, a promoção de outro segmento da cadeia, o da comercialização, que atuava apenas nas relações contratuais de compra e venda de energia no mercado liberalizado.

Com a crise financeira de 2008, o governo federal fortaleceu ainda mais o papel da Eletrobras cujo objetivo era transformá-la numa grande corporação global de energia elétrica. Inovações financeiras, novas parcerias globais e modernização da gestão foram considerados aspectos fundamentais para o alcance deste objetivo.

Além disso, a atuação da Eletrobras ficou concentrada na coordenação das demais empresas do grupo e na garantia de uma expansão nacional e internacional da operação do sistema de energia.

Evidentemente esse processo trouxe prejuízos e lacunas, principalmente pela forte terceirização e financeirização das empresas. A entrada do setor privado e a criação de novas formas de financiamento e gestão tornaram mais volátil o financiamento e precarizaram o mercado de trabalho. No entanto, a Eletrobras ganhou novo dinamismo até a crise atual, permitindo a expansão da malha energética e a redução de riscos para a atuação das empresas privadas em projetos que exigem financiamento de longo prazo e custos bastante elevados.

A atual crise brasileira, aliada ao amplo endividamento da empresa – motivada em grande medida pelo pagamento de juros ao próprio governo federal – e a manutenção das tarifas a patamares relativamente baixos fragilizaram as condições da Eletrobras, cuja dívida líquida de R$ 18,3 bilhões supera em mais de oito vezes sua geração de caixa.

No entanto, o que se observa até o momento é a repetição da estratégia fracassada do governo FHC, como fica claro no Plano Diretor de Negócios e Gestão (2017-2021)6 apresentado pela empresa recentemente. Novamente, o objetivo é fragmentar o sistema de energia e iniciar um amplo processo de privatização. A primeira medida tomada pelo novo presidente foi justamente acabar com as seis distribuidoras estaduais incluindo-as no Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) do governo federal, elas irão a leilão até o final de 2017. Nesse mesmo compasso, a empresa deve reduzir em 29% seus investimentos, caindo de R$ 50,3 bilhões para R$ 35,8 bilhões.

Além disso, a empresa deve negociar as participações minoritárias da estatal, atualmente são 178 participações diretas e indiretas em companhias do setor, como em obras das usinas de Belo Monte, Jirau e Teles Pires. O objetivo com esses negócios é levantar algo em torno de R$ 20 bilhões, estimando que metade desse valor seja possível negociar no mercado com rapidez.

A Eletrobras estabeleceu como prioridades estratégicas para o próximo período: a privatização, a reestruturação dos negócios e a governança corporativa. O objetivo é circunscrever as atividades da empresa apenas à geração e transmissão de energia. Como já se apontou: as distribuidoras foram colocadas à venda e a administração dos fundos setoriais, que movimentam aproximadamente R$ 30 bilhões, passou a ser feita, definitivamente, pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), com isso a estatal deixa de ter a função de financiadora setorial.

Mais ainda, a empresa busca enxugar em 25% seu quadro de funcionários, diminuindo-o de 23,5 mil pessoas para cerca de 17,6 mil e, nesse momento, trabalha em um plano de incentivo à aposentadoria para reduzir, no médio-prazo, ainda mais o seu tamanho. Esse processo tem sido acompanhado também pela venda dos ativos imobiliários da empresa.

No último mês, os acionistas da estatal aprovaram a venda de participação (51%) da Celg Distribuição.

Recentemente, o novo presidente da empresa chegou a afirmar que a Eletrobras não é eficiente em nenhuma das suas operações. Uma declaração tão forte obviamente não reflete as mudanças positivas da companhia nos últimos anos, mas apenas legitima a nova “velha” estratégia em curso.

Conclusão

No que se refere à gestão das empresas públicas não financeiras, o atual governo tem buscado combinar (I) privatizações, (II) desmobilização de ativos, (III) reestruturação societária, (IV) planos de incentivo à demissão e (V) planos de incentivo à aposentadoria.

Por trás dos argumentos de combate à corrupção escondem-se interesses que atentam contra a soberania nacional e em favor de ganhos exorbitantes para o capital privado internacional e de ganhos de curto prazo para alguns setores do capital privado nacional.

1. Os dados foram extraídos do documento: “O perfil das empresas estatais federais, 2015, ano-base 2014”. Disponível em: http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/arquivo/dest-1/perfil-das-empresas-estatais-1/160801_2015_ano_base_2014.pdf

2. Os dados referidos podem estão disponíveis em nota técnica do Dieese: http://www.dieese.org.br/notatecnica/2013/notaTec129LeilaoCampoLibra.pdf

3. O Plano de Negócios e Gestão (2017-2021) pode ser encontrado em: <http://www.petrobras.com.br/pt/quem-somos/estrategia/plano-de-negocios-e-gestao>

4. As Demonstrações Financeiras e Contábeis podem ser consultadas em: <http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/divulgamos-nossas-demonstracoes-contabeis-auditadas.htm>

5. A declaração de Ildo Sauer está disponível em: <http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/10/18/governo-perde-ate-r331-bi-com-leilao-do-pre-sal-diz-ex-chefe-da-petrobras.htm>
6. O Plano Diretor pode ser consultado em: http://www.eletrobras.com/elb/main.asp?View=%7BEB7EA1A1-360E-40FA-9360-742E53C8C220%7D&Team=&params=itemID=%7BB0EFA4BB-C708-4C8A-B8EA-3D9649B08D4B%7D;&UIPartUID=%7B9E178D3B-9E55-414B-A540-EB790C1DF788%7D

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