O Município e a educação
O município pode ajudar a universalizar o ensino com programas que garantam a permanência dos alunos nas escolas, capacitando professores e democratizando a gestão da educação.Autor: Marco Antônio de Almeida
O município pode ajudar a universalizar o ensino com programas que garantam a permanência dos alunos nas escolas, capacitando professores e democratizando a gestão da educação.Autor: Marco Antônio de Almeida
O Brasil possui carências muito grandes em Educação __ embora gaste 4% do seu PIB nesta área, mais que a Espanha, por exemplo. O principal objetivo a ser buscado é a universalização do ensino, garantindo que todas as crianças brasileiras concluam, pelo menos, o primeiro grau. O município é a instância de governo mais capacitada para promover a educação básica, já que esta é basicamente de caráter local, com um forte componente familiar e comunitário. No entanto, para que os municípios não sejam penalizados financeiramente com o ônus dessa tarefa, é necessário um diálogo entre os diversos níveis de governo (municipal, estadual e federal) para equacionar adequadamente os recursos destinados à área. Alguns municípios brasileiros têm desenvolvido, com bastante êxito, experiências que melhoram a qualidade do ensino. Muitas dessas soluções são simples, embora necessitem de um bom planejamento, que considere as necessidades específicas de cada local, permitindo assim superar problemas e alcançar resultados concretos.
AMPLIAÇÃO DO ACESSO À ESCOLA
As iniciativas municipais devem preocupar-se em integrar e garantir o acesso e a permanência no sistema de ensino daqueles que são sistematicamente excluídos, como a população de baixa renda, a população da zona rural, as crianças trabalhadoras e as crianças de rua, bem como com os jovens e os adultos não-alfabetizados.
Em geral, a primeira solução a ser pensada é a construção de mais escolas, esbarrando na falta de recursos dos municípios. Mas nem sempre construir escolas significa uma boa resposta: é preciso otimizar o uso da estrutura física da rede escolar já existente. Para isso, algumas medidas podem ser tomadas:
* Realização de um diagnóstico da situação da rede através de um censo ou cadastro escolar, que permita racionalizar os espaços disponíveis. Dessa forma, novas construções, reformas ou ampliações ocorreriam apenas onde realmente for necessário. Muitas vezes, como foi feito em Ijuí-RS (74,9 mil hab.), vale a pena desativar pequenas escolas, nucleando-as em um número menor de unidades, para racionalizar e economizar recursos humanos.
* O transporte escolar pode ser uma forma de garantir a freqüência e a permanência dos alunos, particularmente nos municípios com território extenso ou com uma grande zona rural. Além disso, o transporte do escolar contribui para o êxito de outras ações, como a nucleação das escolas. Uma possibilidade é o município liberar os estudantes da tarifa dos ônibus, criando o passe escolar gratuito; outra ação possível é estabelecer convênios com perueiros, como em São José da Varginha-MG (2,8 mil hab.).
* Outra forma de garantir o acesso e a permanência é adequar o calendário escolar às características dos municípios, especialmente os rurais, respeitando, por exemplo, os diferentes ciclos da produção agrícola, compatibilizando as férias com os períodos de colheita, já que muitas crianças auxiliam os pais nessas tarefas. Icapuí-CE (14,5 mil hab.) e Jaguaré-ES (18,8 mil hab.) adotaram esta flexibilidade.
* A concessão de bolsas para complementar a renda das famílias carentes, condicionada à assiduidade e ao desempenho escolar dos alunos, pode ser um grande incentivo para a permanência das crianças na escola, particularmente se a iniciativa for agregada a outros programas sociais. Os recursos podem vir do próprio município, através da arrecadação de tributos, ou de verbas da União, de organismos e entidades nacionais e internacionais. Brasília-DF (1.737,8 mil hab.) possui um programa do gênero.
Além do ensino básico, outras modalidades também podem ser contempladas por ações do poder público municipal:
* A educação infantil, que atende a faixa de 0 a 6 anos, deve ser uma prioridade do município. Além de sua importante função social de receber os filhos dos trabalhadores muitas vezes em período integral, ajuda na melhoria do desempenho do aluno no 1º grau, especialmente se proveniente de família de baixa renda. A prefeitura pode construir uma rede própria de pré-escolas e creches ou estabelecer parcerias com instituições da sociedade civil.
* Os programas de combate ao analfabetismo de adultos também merecem atenção, podendo ser feitos em parceria, através de convênios com instituições de ensino, da mobilização de voluntários, etc. Os cursos devem ser flexíveis, e a seriação pode ser modular: o aluno é promovido de acordo com o nível de conhecimento acumulado, independente da época do ano. Cursos profissionalizantes podem ser oferecidos em conjunto com estes programas.
VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS
A valorização do profissional de educação é condição fundamental para melhorar a qualidade do ensino e para o êxito escolar dos alunos. Além de cuidar do aspecto financeiro e institucional, que abrange uma remuneração justa, quadro de carreira que incentive um bom desempenho profissional, etc., o governo municipal também deve desenvolver ações que melhorem a formação e a habilitação de seus professores, tais como:
* Treinamento, realização de cursos, edição de revistas e cadernos pedagógicos. Pode ser buscada a parceria com entidades de ensino superior na região para colaboração na realização destas tarefas, assim como a inclusão do município nos programas federais e estaduais do gênero.
* Formação permanente através de reuniões periódicas entre os supervisores da Secretaria de Educação, os professores e a equipe escolar. A atuação do supervisor pode ser decisiva, deixando de ser um mero fiscalizador e assumindo um papel de capacitador e assessor pedagógico. Para isso, a Secretaria de Educação precisa investir na formação desse profissional.
* A prefeitura pode favorecer também a habilitação dos professores da rede garantindo bolsas de estudo e transporte para que seus professores freqüentem uma faculdade (São José da Varginha-MG/Icapuí-CE). No caso de não se poder contar exclusivamente com professores regularmente habilitados, é aconselhável criar critérios para a contratação de professores leigos, que passariam a ser habilitados pelo ensino regular ou pela suplência. A falta de professores especialistas que atuem da 5ª à 8ª série pode ser contornada pela formação de monitores através de programas da TV Educativa.
MELHORIA DO ENSINO
Garantido o acesso à escola e a valorização dos profissionais, a preocupação do poder público local deve voltar-se para ações que busquem a permanência e o progresso das crianças na sala de aula, como:
* Mudanças no currículo, adequando-o à realidade local, assegurando a formação básica e, ao mesmo tempo, o respeito aos valores culturais e ao cotidiano da comunidade. Foi o caso de Jaguaré-ES, que incluiu em seu currículo atividades e disciplinas ligadas à realidade do meio rural, e de Piúma-ES (10,5 mil hab.), onde o ensino de técnicas de pesca e de navegação está incluído no programa regular.
* Redução da reprovação e da evasão escolar: a criação de uma recuperação contínua ao longo do ano, na própria sala de aula, e de uma recuperação fora do horário escolar, como fez Resende-RJ (96,5 mil hab.), podem ser uma solução. A ampliação do número de dias letivos (a média nas escolas brasileiras é de 180 dias), garantindo um maior período de aprendizagem também contribui para diminuir os índices de evasão e repetência. Outra forma encontrada por alguns municípios foi eliminar a avaliação seletiva nas séries iniciais, como em Vitória-ES (275,2 mil hab.) e Mal. Cândido Rondon-PR (33,6 mil hab.).
* Desenvolvimento de projetos pedagógicos nas próprias escolas, para responder às necessidades da comunidade, envolvendo-a no processo educacional, com assessoria da Secretaria de Educação. Foi o caso de Belo Horizonte-MG (2.097,3 mil hab.) que, através de um Centro de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação, abriu um espaço para debate, intercâmbio de experiências, eventos e grupos de estudo. Projetos especiais, como o desenvolvimento de oficinas profissionalizantes, laboratórios, programas de educação ambiental, também contribuem para melhorar a qualidade do ensino.
PARCERIAS
O estabelecimento de parcerias, seja com outros níveis de governo (estadual/municipal), seja com a sociedade civil, é importante para o êxito das iniciativas do município em relação à Educação. Pode-se, por exemplo, buscar assessoria de instituições de nível superior, criando convênios para capacitar e reciclar professores da rede, abrindo estágios para que os alunos dessas instituições ministrem aulas ou colaborem com as atividades escolares (regulares ou especiais).
As empresas e os estabelecimentos comerciais também devem ser convocados a dar sua contribuição, que pode ser financeira, em espécie (através de doação de produtos e materiais para as escolas) ou em recursos humanos, disponibilizando pessoas com formação para alguma atividade da Secretaria de Educação. Outro auxílio é a abertura de estágios remunerados para os alunos de cursos profissionalizantes.
É importante buscar a parceria com a sociedade civil também para a democratização da gestão da Educação, inclusive da gestão das escolas, estimulando administrações colegiadas, a eleição de diretores e vice-diretores e fortalecendo as entidades de pais e de alunos. O objetivo mais importante nestas iniciativas, além de ampliar o espaço de decisão das escolas em todas as áreas (pedagógica, administrativa, financeira), é procurar envolver a comunidade no cotidiano escolar, fator fundamental para o sucesso e a qualidade do ensino.
INDICADORES
O Instituto Pólis desenvolveu uma metodologia de avaliação das políticas sociais das gestões municipais (vide a revista Pólis nº 21, Como reconhecer um bom governo). O objetivo foi chamar a atenção para o papel que os governos municipais podem exercer na melhoria da qualidade de vida. A Educação ocupa um papel importante nesse trabalho, e o índice de Educação procura medir a situação do município nessa área e o impacto das políticas locais. Trata-se de um índice ponderado, composto por quatro indicadores apurados pela Fundação Seade-SP:
1) o percentual de crianças matriculadas em pré-escolas públicas ou privadas do município em relação ao total de crianças na faixa etária de 4 a 6 anos;
2) a taxa global de evasão nas escolas públicas de 1º grau (estaduais e municipais);
3) a taxa total de retenção no ensino público de 1º grau; e
4) a proporção entre o total de matrículas nas escolas de 2º grau (públicas e privadas) e o número total de matrículas na rede do 1º grau (pública e privada). Este número reflete o formato da pirâmide escolar em cada município, revelando o nível médio de escolarização na faixa de idade entre 15 e 17 anos.
A partir desses dados, o Pólis elaborou um ranking dos 49 maiores municípios de São Paulo com relação à Educação, tomando como base o ano de 1991 __ o último ano para o qual existem dados disponíveis (veja o quadro com os dez melhores colocados).
É importante salientar as dificuldades que qualquer conjunto de indicadores têm em refletir adequadamente toda a complexidade da questão educacional. Com relação ao ensino pré-escolar, por exemplo, não estão disponíveis informações que permitam fazer uma comparação relativa à qualidade desse ensino; assim, um alto nível de cobertura num município pode estar encobrindo condições precárias de ensino (superlotação de classes, excesso de turnos, etc.). Para uma melhor avaliação da realidade da educação no município seria importante que as avaliações quantitativas fossem complementadas por dados de avaliações qualitativas.
Classificação |
Município |
Índice* |
1º |
São Caetano do Sul |
0.859 |
2º |
São Carlos |
0.720 |
3º |
Araraquara |
0.710 |
4º |
Americana |
0.682 |
5º |
São Bernardo do Campo |
0.682 |
6º |
Rio Claro |
0.680 |
7º |
Marília |
0.641 |
8º |
Araçatuba |
0.630 |
9º |
Santos |
0.623 |
10º |
Santo André |
0.605 |
* Numa escala de 1 (o melhor) a 0 (o pior)