Os incentivos fiscais à cultura favorecem o aumento da produção cultural local e podem servir de instrumento para reduzir a inadimplência.Autor: José Carlos Vaz
Consultores: Valmir de Souza e Hamilton Faria

Os incentivos fiscais à cultura favorecem o aumento da produção cultural local e podem servir de instrumento para reduzir a inadimplência.Autor: José Carlos Vaz
Consultores: Valmir de Souza e Hamilton Faria

A falta de recursos é uma das principais dificuldades enfrentadas tanto por aqueles que estão envolvidos na gestão da política cultural, quanto pelos que estão empenhados na produção cultural. Os governos enfrentam uma crônica falta de recursos para investimentos, o que impede a ampliação do orçamento das áreas de cultura como seria desejado. O setor privado é apontado como solução, mas a prática do patrocínio ou da participação de capitais privados no financiamento de produções culturais ainda é incipiente. Essas dificuldades em obter recursos atingem produções culturais de vários portes. É necessário criar formas para captar recursos que atraiam investidores e patrocinadores, dinamizando a produção cultural no município, sem provocar sobrecarga e aproveitando mais eficazmente o potencial dos produtores, sem depender, necessariamente, de verbas estaduais e federais.

O QUE FAZER

Nos últimos anos, alguns municípios iniciaram a aplicação de leis de incentivo fiscal à produção cultural. O princípio adotado é da renúncia da prefeitura de arrecadar impostos em valores correspondentes ao total ou a parcelas dos valores de investimentos ou patrocínios em produções culturais.

EXPERIÊNCIAS

Em nível federal, existe a Lei nº 8.313, de 23/12/91, que regulamenta os incentivos fiscais federais para projetos culturais. Pode-se obter informações no endereço:

Secretaria de Apoio à Cultura / Ministério da Cultura / Esplanada dos Ministérios / Bloco B – 3º andar / Telefone: (061) 224-6529 / Fax: (061) 225-9162.

Belo Horizonte- MG (2.020 mil hab.), implantou sua lei de incentivo à cultura em 1993 (Lei nº 6.498/93). Os empresários podem patrocinar projetos culturais à sua escolha, em valores equivalentes a, no máximo, 20% dos débitos mensais referentes ao Imposto Sobre Serviços (ISS). Também é possível fazer doação ao Fundo de Projetos Culturais. Este Fundo aplica seus recursos em projetos que, por seu caráter experimental ou comunitário, não tenham facilidade de conseguir patrocínio.

O endereço da Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte é:

Av. dos Andradas, 367 – 2º andar / CEP 30120-010 – Belo Horizonte-MG / Telefone: (031) 277-4659 / Fax: (031) 277-4621.

São José dos Campos-SP (470 mil hab.) também está implantando uma lei de incentivo à produção cultural. Neste ano, a lei está vigorando em caráter experimental. Pode-se entrar em contato com a Fundação Cultural Cassiano Ricardo:

R. Sebastião Humel, 268 / CEP 12210-200 – São José dos Campos / Telefone: (0123) 21-7344 / Fax: (0123) 41-8577.

Em São Paulo –SP (9.646 mil hab.) também está em vigor uma lei de incentivo à cultura, aprovada em 1990, cujo texto é apresentado a seguir. Pode-se entrar em contato com a Secretaria Municipal de Cultura de S. Paulo no endereço:

Rua da Figueira, 77 – sala 404 / São Paulo – SP / Telefone: (011) 225-9077 ramais 2291 e 2292.

EXEMPLO DE LEI

Lei nº 10.923 de 30 de dezembro de 1990.

Dispõe sobre incentivo fiscal para a realização de projetos culturais, no âmbito do Município de São Paulo.

Art. 1º – Fica instituído, no âmbito do Município de São Paulo, incentivo fiscal para a realização de projetos culturais, a ser concedido à pessoa física ou jurídica domiciliada no Município.

O incentivo fiscal referido no "caput" deste artigo corresponderá ao recebimento, por parte do empreendedor de qualquer projeto cultural no Município, seja através de doação, patrocínio ou investimento, de certificados expedidos pelo Poder Público, correspondentes ao valor do incentivo autorizado pelo Executivo.

Os portadores dos certificados poderão utilizá-los para pagamento dos Impostos Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS e Sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU, até o limite de 20% (vinte por cento) do valor devido a cada incidência dos tributos.

Para o pagamento referido no parágrafo anterior, o valor de face dos certificados sofrerá desconto de 30% (trinta por cento).

A Câmara Municipal de São Paulo fixará, anualmente, o valor que deverá ser usado como incentivo cultural, que não poderá ser inferior a 2% (dois por cento) nem superior a 5% (cinco por cento) da receita proveniente do ISS e do IPTU.

Para exercício de 1991, fica estipulada a quantia equivalente a 5% (cinco por cento) da receita proveniente do ISS e do IPTU, excluindo-se o valor destinado ao FUNTRAN.

Art. 2º – são abrangidas por esta lei as seguintes áreas:

1. música e dança
2. teatro e circo
3. cinema, fotografia e vídeo
4. literatura
5. artes plásticas, artes gráficas e filatelia
6. folclore e artesanato
7. . acervo e patrimônio histórico e cultural, museus e centros culturais.

Art. 3º – fica autorizada a criação, junto à Secretaria Municipal de Cultura, de uma Comissão, independente e autônoma, formada majoritariamente por representantes de setor cultural a serem enumerados pelo Decreto regulamentador da presente lei e por técnicos da administração municipal, que ficará incumbida da averiguação e da avaliação dos projetos culturais apresentados.

1. Os componentes da Comissão deverão ser pessoas de comprovada idoneidade e de reconhecida notoriedade na área cultural.
2. Aos membros da Comissão, que deverão ter um mandato de 1 (um) ano, podendo ser reconduzidos, não será permitida a apresentação de projetos durante o período de mandato, prevalecendo essa vedação até 2 (dois) anos após o término do mesmo.
3. A Comissão terá por finalidade analisar exclusivamente o aspecto orçamentário do projeto, sendo-lhe vedado se manifestar sobre o mérito do mesmo.
4. Terão prioridade os projetos apresentados que já contenham a intenção dos contribuintes incentivadores de participarem do mesmo.
5. O Executivo deverá fixar o limite máximo de incentivo a ser concedido por projeto, individualmente.
6. Uma parcela dos recursos a serem destinados ao incentivo deverá ser destinada para a aquisição de ingressos.

Art. 4º – Para a obtenção do incentivo referido no Artigo 1º, deverá o empreendedor apresentar à Comissão cópia do projeto cultural, explicando os objetivos e recursos financeiros e humanos envolvidos, para fins de fixação do valor do incentivo e fiscalização posterior.

Art. 5º – Aprovado o projeto, o Executivo providenciará a emissão dos respectivos certificados para a obtenção do incentivo fiscal.

Art. 6º – Os certificados referidos no Artigo 1º terão prazo de validade, para sua utilização, de 2 (dois) anos, a contar de sua expedição, corrigidos mensalmente pelos mesmos índices aplicáveis na correção do imposto.

Art. 7º
– Além das sanções penais cabíveis, será multado em 10 (dez) vezes o valor incentivado o empreendedor que não comprovar a correta aplicação desta Lei, por dolo, desvio do objetivo e/ou dos recursos.

Art. 8º – As entidades de classe representativas dos diversos segmentos da cultura poderão ter acesso, em todos os níveis, a toda documentação referente aos projetos culturais beneficiados por esta Lei.

Art. 9º – As obras resultantes dos projetos culturais beneficiados por esta lei, serão apresentadas, prioritariamente, no âmbito territorial do município, devendo constar a divulgação do apoio institucional da Prefeitura do Município de São Paulo.

Art. 10º – Fica autorizada a criação, junto à Secretaria Municipal de Cultura, do Fundo Especial de Promoção das Atividades Culturais – FEPAC.

Art. 11º – Constituirão receitas do FEPAC, além das provenientes de dotações orçamentárias e de incentivos fiscais, os preços da cessão dos Corpos Estáveis, teatros e espaços culturais municipais, suas rendas de bilheteria, quando não revertidas a título de cachês, a direitos autorais e à venda de livros ou outras publicações e trabalhos gráficos editados ou co-editados pela Secretaria Municipal de Cultura, aos patrocínios recebidos, à participação na produção de filmes e vídeos, à arrecadação de preços públicos originados na prestação de serviços pela Secretaria e das multas aplicadas em conseqüência de danos praticados a bens artísticos e culturais e a bens imóveis de valor histórico, quando não seja receita do CONPRESP, o rendimento proveniente da aplicação de seus recursos disponíveis, além de outras rendas eventuais.

Art. 12º – Caberá ao executivo a regulamentação da presente Lei no prazo de 90 (noventa) dias a contar de sua vigência.

Art. 13º – Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

RESULTADOS

O resultado mais evidente da implantação de uma lei de incentivo fiscal à produção cultural é, obviamente, o aumento da produção e do acesso dos cidadãos aos bens culturais. Deve-se observar, no entanto, que este resultado só é conseguido se houver um cuidado para que o projeto leve à produção de eventos que sejam acessíveis mesmo aos cidadãos sem condições de pagar por eles. Pode-se, diretamente no texto da lei, ou através da ação da comissão encarregada da seleção de projetos, incentivar a produção cultural local. Assim, um projeto de lei de incentivo à cultura pode ter um diferencial importante se criar formas de captar recursos para apoiar não só grandes produtores, mas também produtores com projetos menores ou mesmo produções de caráter amador ou semi-profissional.

A adoção da gestão conjunta entre governo e sociedade dos recursos destinados ao incentivo à produção cultural contribui para a democratização da gestão da cultura, pela possibilidade de discussão dos projetos culturais com um ator coletivo da sociedade, que pode ser o Conselho Municipal de Cultura ou uma comissão formada especificamente para este fim. É um desafio para o governo municipal fazer com que o processo de seleção dos projetos tenha um elevado grau de transparência, obtendo legitimidade junto à sociedade.

Deve-se ter em mente, porém, que a adoção do incentivo fiscal à produção cultural implica uma perda de arrecadação direta para o município. Entretanto, se geridos convenientemente, estes recursos tornam-se investimentos aplicados diretamente na produção cultural, sem desperdícios por conta de ineficiências da administração municipal.

Os incentivos fiscais à cultura podem servir como instrumentos para redução da inadimplência, se forem previstos mecanismos de renúncia fiscal de impostos atrasados em troca de patrocínio de produções culturais.


* Publicado originalmente como DICAS nº 43 em 1995