O planejamento integrado entre transportes, trânsito e sistema viário permite à Prefeitura melhorar a qualidade de vida dos cidadãos ao diminuir o tempo e os custos do deslocamentos e aumentar a acessibilidade aos equipamentos urbanos.Autor: Roberto Moreira

O planejamento integrado entre transportes, trânsito e sistema viário permite à Prefeitura melhorar a qualidade de vida dos cidadãos ao diminuir o tempo e os custos do deslocamentos e aumentar a acessibilidade aos equipamentos urbanos.Autor: Roberto Moreira

O transporte coletivo é um serviço essencial e influencia diretamente a qualidade de vida da população das cidades. Faz parte do cotidiano da maioria das pessoas que se deslocam para trabalhar, estudar, etc. Por outro lado, o transporte participa da dinâmica de desenvolvimento da cidade, e interfere concretamente em sua organização espacial e social.

Assim , o transporte, entendido como a necessidade de deslocamentos do cidadão, deve ser tratado como processo que envolve todos os aspectos relativos à circulação, e sua gestão deve ser integrada com a gestão do trânsito e do sistema viário.

Para uma ação planejada na área de transportes é necessário que seja estruturado um Plano Municipal de Transportes, que definam as políticas setoriais para transporte coletivo, trânsito e vias públicas, de maneira integrada, e as ações devem ser planejadas em termos de tempo e de recursos.

ASPECTOS GERAIS DO PLANO

A melhoria da qualidade de vida da população urbana deve ser o principal eixo da política definida no Plano de Transportes. As condições em que o cidadão realiza seus deslocamentos na cidade, e a acessibilidade aos equipamentos urbanos tem peso significativo nesta qualidade.

a) prioridade para o transporte coletivo e o pedestre

Historicamente o automóvel tem sido privilegiado na utilização do sistema viário. A cultura do automóvel, visto como símbolo de status, e como única alternativa de deslocamento para as pessoas com melhores condições financeiras, justificou políticas que buscavam viabilizar a cidade para a circulação dos carros, em detrimento do transporte coletivo, produzindo as atuais situações caóticas de congestionamentos e poluição. Um Plano de Transportes, portanto, deve buscar a inversão desta lógica, priorizando o transporte coletivo e as áreas destinadas aos pedestres, áreas de circulação e em especial, as calçadas.

b) estrutura organizacional

Para um efetivo gerenciamento do transporte, é fundamental que a estrutura da gestão seja bem montada. Uma experiência bem sucedida em algumas cidades é a criação de uma secretaria de transportes abrangendo as áreas de transporte, trânsito e vias públicas. O fato das três áreas estarem sob o mesmo comando facilita a ação articulada nos projetos comuns.

A criação de uma empresa pública operadora de transporte coletivo, testada em alguns lugares, teve resultados bastante diversos e polêmicos. No entanto, a estruturação de uma empresa pública com atribuições de gestão dá ao Poder Público maior agilidade e eficiência na administração do transporte, além de ampliar a capacidade de intervenção quando ocorrem problemas com as empresas privadas.

TRANSPORTE COLETIVO

O Plano deve apontar diretrizes que fortaleçam a gestão do transporte e o controle do sistema, para o planejamento e a política tarifária.

a) o modelo de gestão

Entende-se por modelo de gestão o conjunto de regras que definem a atuação do Poder Público na área de transporte, particularmente na relação com os operadores, públicos ou privados. Este modelo determina, inclusive, como se processam as atividades de planejamento, fiscalização, remuneração dos operadores, política tarifária, etc.

Na relação com os operadores, o modelo adotado na maioria das cidades brasileiras, é a "permissão" ou "concessão" do serviço. Neste modelo, o operador é remunerado pela tarifa, o que o leva a encontrar uma equação econômico-financeira satisfatória para a empresa, manipulando o nível de serviço oferecido à população.

Alguns modelos alternativos foram testados nos últimos anos demonstrando êxitos: a câmara de compensação e a contratação por serviço prestado, mais conhecido como municipalização.

Na câmara de compensação o equilíbrio econômico-financeiro das empresas é garantido através de um mecanismo de compensação entre linhas mais rentáveis e as deficitárias. O modelo continua sendo a "permissão "ou "concessão".

Na contratação por serviço prestado as empresas operadoras são contratadas e remuneradas por serviço prestado (quilômetro rodado, por exemplo). Neste modelo, a autoridade do Poder Público sobre o sistema de transporte aumenta bastante, principalmente pelo controle exercido sobre a receita, que passa a ser da prefeitura.. Para a implantação deste modelo é necessário que o órgão gestor esteja efetivamente capacitado para exercer as funções de controle do sistema (oferta e demanda), de especificação da oferta e da administração da receita do sistema.

b) política tarifária

A planilha tarifária utilizada pela prefeitura deve ser verificada e confrontada com planilhas adotadas em outras cidades. As recomendações da ANTP – Associação Nacional de Transporte Público, que tem coordenado em nível nacional as discussões sobre o tema, merecem atenção especial.

As indicações sobre a política tarifária, contidas no Plano de Transportes, devem evitar a adoção de gratuidades, uma vez que este mecanismo, amplamente utilizado nas cidades brasileiras, tende a distorcer o valor da tarifa. A isenção para uma parcela de usuários, sem a entrada adicional de recursos no sistema, aumenta a tarifa paga pelo restante da população.

c) estrutura de planejamento e fiscalização

Na definição da estrutura de gestão do sistema, deve-se prever uma estrutura eficiente de planejamento, com equipe, recursos e a utilização de técnicas modernas. O planejamento do transporte deve garantir que os recursos (ônibus, pessoal, etc.) sejam utilizados da melhor forma possível.. Para garantir que o serviço especificado pelo planejamento será cumprido, é indispensável uma boa estrutura de fiscalização e controle. Existem equipamentos de custo relativamente baixo, que podem auxiliar nessa tarefa.

d) medidas concretas

Após a definição de linhas gerais, o Plano deve conter indicações de ações concretas para a melhoria do transporte na cidade, como por exemplo: a criação de novas linhas e alterações das já existentes; integração em terminais ou através de bilhetagem automática; implantação de abrigos no pontos de parada e aumento e renovação da frota..

TRÂNSITO E CIRCULAÇÃO

Os problemas de trânsito e circulação deixaram de ser uma exclusividade das cidades grandes. Assim, um Plano de Transporte, independente do porte do município, deve conter indicações para o tratamento destas questões.

O órgão de gestão do trânsito deve estar preparado para fazer o planejamento da circulação na cidade, ter equipes de operação para os corredores mais problemáticos e manter programas de educação para o trânsito, particularmente para as crianças.

Apesar das questões de circulação serem demandas eminentemente municipais, a Constituição Federal define como atribuição exclusiva da União legislar sobre trânsito, o que faz principalmente através do Código Nacional de Trânsito. Este, por sua vez, atribui a responsabilidade da fiscalização do trânsito ao Estado, através dos Detrans e Polícia Militar.

O município fica, portanto, restrito na sua atuação sobre os problemas de circulação na cidade. Alguns municípios em convênio com o Governo do Estado, assumem as atribuições de fiscalização do trânsito e recebem recursos arrecadados com multas. Este processo conhecido como municipalização é uma forma de prover o município de poder e recursos para uma atuação mais eficaz na gestão do trânsito.

O Plano deve estabelecer diretrizes para segurança e educação no trânsito, sinalização, operação de corredores, passagens de pedestres, manutenção de vias e construção de novas vias.

PARTICIPAÇÃO POPULAR E CONTROLE SOCIAL

É importante que a sociedade participe na elaboração do Plano de Transporte, para garantir que as questões sejam analisadas do ponto de vista dos vários atores envolvidos. Na ausência de mecanismos institucionais, deve-se incorporar, na discussão, os representantes de setores organizados como o sindical, popular, empresarial, e outros.

O Plano de Transporte deve discutir a implantação de mecanismos de participação que permitam o controle social sobre as ações do Poder Público. Mecanismos como o Conselho de Transporte e a inclusão de membros da sociedade em Conselhos de Administração de empresas públicas, garante que sejam levadas em conta as demandas da sociedade, e dão maior legitimidade às ações do Poder Público.

ETAPAS DE FORMULAÇÃO

a) Diagnóstico – O primeiro passo para a definição do Plano é realizar um diagnóstico mínimo sobre a situação do setor de transportes na cidade. Podemos citar algumas questões importantes: estrutura atual de gestão do transporte (incluindo trânsito e vias públicas); modelo de gestão vigente; forma de relação entre o Poder Público e os empresários do transporte coletivo; legislação municipal para o assunto; opinião dos cidadãos sobre o preço e a qualidade dos serviços; mobilização popular existente, mecanismos de participação popular, relevância dos problemas de trânsito e circulação em relação ao transporte coletivo, tendências de expansão urbana.

Este diagnóstico deverá ser aprofundado nos aspectos específicos de cada município.

b) Identificação de propostas existentes – As propostas existentes para a cidade devem ser levantadas junto aos setores organizados da sociedade. O conteúdo dessas propostas deve ser analisado e discutido com os proponentes.

c) Formulação de novas propostas – Após a elaboração do diagnóstico e do levantamento das propostas já existentes, passa-se para a discussão e a elaboração das novas propostas.

Estas podem ser elaboradas em caráter preliminar, sem necessidade, ainda, de detalhamento completo, e sem se estar preso a minúcias técnicas.

d) Discussão com setores envolvidos – Nesta fase, discute-se com os setores da sociedade envolvidos na elaboração do Plano, para que se consolidem as propostas elaboradas. É importante que a discussão incorpore o máximo de setores, incluindo aqueles diretamente ligados ao tema (trabalhadores, empresários, técnicos e usuários do transporte coletivo) e representantes de outros setores sociais ligados diretamente ao tema, procurando incorporar o máximo de contribuições.

e) Redação do Plano e apresentação à Câmara Municipal – encerrada a etapa de discussão, pode-se elaborar o documento final, a ser apresentado à Câmara Municipal.. Nesta etapa, é importante o apoio de técnicos para que o detalhamento e a redação final das propostas sejam fiéis às discussões e não dêem margens a dúvidas.

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* Publicado originalmente como DICAS nº 60 em 1996

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