Do que trata o texto: O texto trata da experiência da PORTOSOL, instituição de crédito voltada para empreendimentos excluídos do mercado financeiro convencional ajuda a gerar emprego e renda no município e a promover o desenvolvimento local.

Do que trata o texto: O texto trata da experiência da PORTOSOL, instituição de crédito voltada para empreendimentos excluídos do mercado financeiro convencional ajuda a gerar emprego e renda no município e a promover o desenvolvimento local.

Disponível em: Publicado originalmente como DICAS nº 112
Fonte: Instituto Pólis
Autor:
Guilherme Henrique de Paula e Silva a partir de documentos oficiais do programa.
Data de publicação: 1998


As microempresas e atividades informais quase sempre têm dificuldade de acesso aos operadores de crédito convencionais por dois motivos: pela impossibilidade de atenderem às exigências de garantias reais e pela burocracia excessivamente complexa diante de empreendimentos que em geral são individuais ou, quando muito, familiares.

Numa época em que o desemprego é cada vez maior, são os governos municipais que primeiro se deparam com o crescimento do mercado informal e com a necessidade de criar alternativas de emprego e renda. Enquanto o poder público prioriza financiamentos de projetos que exigem grandes volumes de investimentos para a criação de relativamente poucos empregos diretos, ou políticas que privilegiam os micro e pequenos empresários, mas sem se preocupar com sua abrangência ou continuidade, o problema não se resolve.

Para financiamentos voltados especialmente para os pequenos negócios, buscando promover a geração de emprego e a distribuição de renda, a prefeitura de Porto Alegre-RS (1.288 mil hab.) criou, em 1996, a Instituição Comunitária de Crédito – Portosol, em parceria com o governo estadual e a sociedade civil representada pela Federação das Associações Comerciais do Estado e pela Associação dos Jovens Empresários de Porto Alegre.

IMPLANTAÇÃO

Esta agência de desenvolvimento com forma de agência de crédito nasceu em Porto Alegre, baseada em estudos que visavam a criação de um Banco Municipal, quando a cidade tinha 12% da população economicamente ativa desempregada.

A idéia de um banco do município e para o município existia desde 1993 quando foi aprovada lei que autorizava sua criação pela prefeitura. No entanto, as consultas feitas ao Banco Central e ao Tribunal de Contas do Estado do RS mostraram que a viabilidade de um projeto desta natureza, oferecendo créditos aos micro e pequenos empresários, formais ou informais, estaria comprometida no caso de um banco que atendesse às exigências legais para captação e empréstimo de recursos de terceiros, ou seja, recursos da prefeitura.

A possibilidade de uma agência de economia mista ou um fundo de recursos públicos também foi deixada de lado pelas implicações legais apontadas pelo TCE-RS. A saída estava na participação do poder municipal na criação de uma associação civil, e na doação de recursos não como capital, mas como contribuição social. Segundo o Banco Central, não havendo captação de recursos do público (ou públicos), a associação civil não seria considerada financeira e, portanto, não ficaria sob a sua fiscalização.

A configuração da Instituição Comunitária de Crédito – PORTOSOL se completou com a ajuda de consultoria externa, através da Sociedade Alemã de Cooperação Técnica – GTZ. Até então, em todo o mundo havia poucas experiências similares.

ESTRUTURA
Para alcançar seu objetivo de facilitar a criação, o crescimento e a consolidação de empreendimentos de pequeno porte, formais e informais, associados ou não, dirigidos por pessoas de baixa renda e prioritariamente por mulheres, a fim de fomentar o desenvolvimento sócio-econômico equilibrado do município, a Portosol assumiu alguns pressupostos operacionais:

a) Ter caráter não-assistencialista;

b) ser auto-suficiente, isto é, manter-se com o giro dos recursos próprios;

c) ter máxima simplicidade de operação, tanto no que respeita à burocracia envolvida como ao local físico das operações;

d) adotar uma forma de operação ativa, não esperando o cliente mas pelo contrário, procurando-o através de agentes volantes de crédito.

A responsabilidade pela direção do novo organismo foi dada a um Conselho de Administração de oito membros: duas cadeiras para a Prefeitura, uma para o Estado, uma para a Associação dos Jovens Empresários de Porto Alegre e quatro cadeiras para a participação da sociedade civil (três delas ocupadas por pessoas de representatividade relevante no setor econômico local – dois acadêmicos e um empresário – e uma ocupada por um representante do Orçamento Participativo – processo de discussão comunitária da destinação dos recursos para investimentos públicos).

O caráter auto-suficiente da instituição obrigou a uma composição criteriosa e "enxuta" do corpo de funcionários, optando-se por pessoas que tivessem afinidade com a idéia. São 23 funcionários e os serviços de consultoria, auditoria externa, elaboração de sistemas, cobrança após 30 dias e contabilidade são terceirizados.

A necessidade de se chegar à auto-suficiência também obrigou a Portosol a ter um sistema de cobrança de máxima eficiência, reduzindo a inadimplência a um mínimo, sem comprometer os objetivos de simplicidade. Estuda-se a viabilidade de cada cliente, caso a caso e, na falta de garantias reais, aceita-se uma garantia solidária (as pessoas se organizam em grupos de três a cinco indivíduos e assumem coletivamente o empréstimo).

Cuidou-se de manter o aspecto visual da sede da Portosol próximo da clientela potencial (sem mármores, granitos ou grandes vãos de vidro temperado) de maneira que a agência fosse vista como um prolongamento natural do cotidiano vivido, com conforto e sem luxo.

Os recursos iniciais, cerca de R$ 1,5 milhão, para as operações de crédito vieram do município, do Governo do Estado, da GTZ e da IAF – Interamerican Foundation.

Estes recursos formaram o fundo rotativo que foi gerido de forma a alimentar as operações iniciais de crédito e manter a administração da Instituição em seus primeiros passos.

A PRÁTICA DA OPERAÇÃO

O modo de operação é simples, objetivo e sem paternalismos, caracterizando-se pelo empréstimo seguido de cobrança. Pode-se obter crédito para matéria-prima, mercadorias, ferramentas, equipamentos, máquinas, melhoria e ampliação das instalações e ainda conserto de máquinas, equipamentos e veículos utilitários.

Para capital de giro os créditos não podem ultrapassar 5 mil reais e para capital fixo, 10 mil reais. As prestações são fixas e não há descontos antecipados ou taxas de abertura de crédito. O valor e a data das parcelas são negociadas com o cliente, obedecendo à sazonalidade e às peculiaridades do seu negócio, começando com pequenos valores e prazos curtos mas que, pela pontualidade nos pagamentos e crescimento da sua atividade, o tomador pode ir conquistando renovações de créditos com maiores valores e prazos.

A burocracia é mínima. Os tomadores de crédito precisam comprovar pelo menos seis meses de atuação na atividade em Porto Alegre (podendo ter empresa registrada ou não), possuir um ativo inferior ou igual a 50 mil reais, sem ultrapassar dez empregados. Os documentos exigidos são: CPF, RG, comprovante de residência e, no caso de empresas, contrato social e CGC. Para os ambulantes, pede-se o cadastro na Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio e, para quem faz artesanato, o número de inscrição na Casa do Artesão.

Para chegar à concretização do empréstimo ao cliente, a ICC tem as seguintes etapas:

a) Divulgação – Propaganda convencional e direta através dos agentes volantes.

b) Informação – O processo de informação sobre a Instituição já se reveste de um caráter de pré-seleção do cliente potencial, que fica sabendo dos critérios para concessão do crédito e se preenche, ou não, os requisitos para se habilitar.

c) Solicitação – O candidato ao crédito dá as informações básicas através de um cadastro e, se não preenche os requisitos, é informado imediatamente de seu não enquadramento nos critérios da Instituição.

d) Levantamento socioeconômico – É realizada uma visita ao local de trabalho do cliente, na qual é feita uma avaliação técnica minuciosa e elaborado um relatório da situação encontrada e dos bens alienáveis existentes.

e) Análise – O relatório do agente é julgado por um comitê (formado pela diretora e pelos coordenadores financeiro, administrativo e operacional), que liberará, ou não, o total ou apenas uma parte do crédito solicitado.

f) Liberação – O ato liberatório consta de um rito burocrático sumário: procede-se à leitura do contrato de crédito (frisando as datas de reembolso), assinaturas, oficialização das garantias apresentadas e, finalmente, a entrega do cheque.

A partir deste ato, inicia-se um ciclo, repetido com freqüência, que consta de cobrança, amortização e renovação de créditos para mais investimentos, criando-se um movimento direcionado para o crescimento da atividade econômica do cliente.

Esta simplicidade da operação permitiu à Portosol, em um ano e meio de funcionamento, oferecer 2.961 créditos a pequenos e microempresários dos mais diversos setores, com predominância do setor comercial sobre os serviços e produção. Foram investidos R$ 4,7 milhões, resultando numa média de R$ 1.600,00 por empréstimo, com prazos médios de devolução de 5,8 meses. E o índice de inadimplência (atrasos maiores que 30 dias) é de apenas 3% da carteira ativa.

RESULTADOS
A criação de uma instituição de popularização do crédito, nos moldes da Portosol, permite consolidar empregos informais precários já existentes e multiplicar os investimentos em atividades absorvedoras de mão-de-obra. E, ao financiar parcelas da população ativa que estavam alijadas das relações econômicas, permite redistribuir a renda, melhorando as condições gerais de existência da população.

O programa, ao valorizar todas as atividades econômicas desenvolvidas pelos tomadores de empréstimo, ajuda a resgatar a dignidade do trabalhador informal, além de contribuir para diminuição dos níveis de desemprego, financiando atividades que já existiam mas que sempre se ressentiram da falta de apoio, adaptando o crédito ao porte e característica da economia informal.

Envolver o cliente na negociação das prestações do empréstimo permite a ele executar seus projetos sem os constrangimentos de pagamentos elevados ou prazos que sufocam o empreendimento e impedem o crescimento.

As políticas de geração de renda como esta, têm efetividade muito maior que aquelas de complementação por atingirem a raiz da questão estabelecendo um vínculo, geralmente estável, entre o ingresso de renda e a atividade desenvolvida pela população.

Além disso, o acesso ao crédito proporcionado pela Portosol estabelece uma relação educativa mútua: o poder público reorienta suas políticas de aplicação dos recursos – que são públicos – em áreas de alto retorno social, e a população exerce sua cidadania.

A Portosol é hoje indicada como referência nacional, tendo sido a primeira instituição a receber verbas do Programa de Crédito Produtivo Popular, do BNDES, cujo objetivo é dar maior poder aos fundos rotativos das ONGs voltadas para esta modalidade de crédito.

A ICC Portosol foi classificada entre as 20 experiências finalistas do ciclo de premiação de 1997 do Programa Gestão Pública e Cidadania, iniciativa conjunta da Fundação Getúlio Vargas e da Fundação Ford.

CRÉDITOS

atividade

distr_garantias


Fonte: ICC Portosol