“Quem é, afinal, este guerreiro do ABC que se transforma em pacifista para tentar mudar um país tradicionalmente conservador?”

Lula: paz, amor e mão firme perto do ‘sonho impossível’

Por João Máximo

Lula chega ao comitê do PT, na Vila Mariana, em São Paulo, e surpreende assessores no meio de acalorada discussão sobre o resultado das pesquisas. Aproxima-se do grupo, estende o braço, exibe a mão firme e, lembrando que daí a pouco estará às voltas com mais um debate na televisão, conclama:

— Vejam se o candidato está nervoso…

Não está. Na verdade, nervoso, mesmo, só fica quando alguém pensa em marcar entrevistas ou debates sem sua aprovação.

— Quer saber de um fato histórico? Este bobo aqui é o único candidato que, estando na liderança das pesquisas, aceita participar de debates.

O gesto da mão firme e a fala sobre os debates são repetidos em outras ocasiões, como se para deixar bem marcado seu momento atual. Bobo ou não, ele sabe que os debates são uma forma de mostrar ao país quem é, realmente, Luiz Inácio Lula da Silva, candidato pela quarta vez à Presidência do Brasil e líder nas intenções de voto.

Despreparado ou com programa?

E quem é ele, realmente? O despreparado que os adversários apontam ou o candidato armado do “mais completo projeto de governo da História da República”, como diz? O campeão da rejeição ou o salvador da pátria? O barbudo feroz com cara de grevista ou o candidato que acaba de descobrir a importância do bom humor? O ex-sindicalista escondendo o velho desejo de comunizar o Brasil ou o candidato que, pés no chão, empunha a bandeira do equilíbrio? O eterno perdedor ou um líder a um passo da vitória? Um retirante nordestino que não reconhece o seu lugar ou prova viva de que uma sociedade elitista acaba de se tornar justa o bastante para permitir que um homem do povo seja seu presidente? Um defensor da bomba atômica ou o “Lulinha paz e amor”? Quem é, afinal, este guerreiro do ABC que se transforma em pacifista para tentar mudar um país tradicionalmente conservador?

O que o brasileiro pensa de Lula será dito nas urnas domingo. Ou, caso de um segundo turno, dia 27. Os ligados em números, coincidências e desígnios astrológicos anotem: são duas datas para ele comemorar seu 57 aniversário, 6 de outubro pela certidão de nascimento e 27 como o dia em que realmente veio ao mundo.

Campeão de rejeição? Não mais. O próprio Lula, porém, sabe que a incômoda primazia o perseguia desde 1989:

— Só não é rejeitado quem não é conhecido. Quanto mais nítida a cara do candidato, quanto mais claras suas propostas, maior a rejeição. E maior, também, a aprovação.

O que explica, em parte, a tranqüilidade. Os que têm acompanhado por dentro suas tentativas para chegar à Presidência dizem que ele nunca esteve tão perto justamente por ter mudado, ou melhor, por ter amadurecido politicamente. Sua carreira é de fato um longo processo de amadurecimento. O lado humano — o do retirante pobre que já se vê subindo a rampa do Planalto — é o que seus correligionários gostam de ressaltar, história de sucesso que contrasta com a das seguidas derrotas nas urnas. No entanto, é justamente por essas derrotas que Lula chega amadurecido, e favorito, a estas eleições.

Primeiro, a história do retirante. Nascido em Vargem Grande, atual município de Caetés, mas na época um distrito de Garanhuns, Lula viveu uma infância que já foi comparada à de um personagem de Dickens. O pai, Aristides Inácio da Silva, deixou a cidade semanas antes de nascer Luiz, o caçula de sete filhos. Foi quando a mãe, Eurídice Ferreira de Mello, a dona Lindu, começou a se transformar no símbolo da nordestina pobre, excluída, mas resistente e heróica, à qual Lula dedicaria pela vida afora um misto de admiração e afeto. A própria ida de Aristides para Santos é parte disso. Lá ele se uniu a uma garota de 16 anos, a Mocinha, prima de dona Lindu, que tirara de Garanhuns a propósito de ajudá-lo no serviço de casa. Com a nova mulher, Aristides teria mais oito filhos. E, numa visita à antiga casa, engravidou mais uma vez dona Lindu. Voltou para São Paulo com o filho mais velho, Jaime, que um dia, sem que o pai soubesse, chamou dona Lindu e os irmãos para se juntar a eles. Dona Lin du vendeu tudo o que tinha em Garanhuns e embarcou num pau-de-arara com a filharada. Durante os 13 dias de viagem, finda no Brás paulistano, de onde seguiram de carro para Santos, animou-a apenas a esperança de refazer a família. Lula tinha 7 anos.

As humilhações da infância

Forçado pela situação criada por Jaime, Aristides dividiu-se por algum tempo entre as duas mulheres, cada uma numa casa em Santos. Dona Lindu ficou grávida pela última vez (dois gêmeos que morreriam pouco depois) e passou ali, até fins de 1953, os piores tempos de sua vida. Uma sucessão de maus-tratos marca Lula para sempre, na admiração pela mãe e nos ressentimentos em relação pai. A história do picolé, que Aristides comprou para os filhos do segundo casamento mas negou a Lula (“Você ainda não sabe tomar sorvete”), pode ter-se incrustado para sempre no coração do futuro líder, mas é quase nada comparada à brutalidade, às humilhações, aos padecimentos impostos a toda a família: surras nos filhos, a proibição de que estudassem, a tentativa de agredir dona Lindu, o que acabaria levando-a a abandonar o marido para criar os filhos sozinha, agora em São Paulo, num pequeno quarto-e-cozinha no fundo de um botequim em Vila Carioca. Embora Lula diga já ter perdoado o pai, que morreu de alcoolismo em 1978 (“Devo a ele pelo menos o espermatozóide que me gerou”), não deve ser desprezado o que defende Eliane Brum ao contar essa história em detalhes na revista Época: “O legado do pai padrasto é a chave para compreender a gênese do homem carismático, de gestos generosos e comportamento acolhedor, que quer ser presidente do Brasil. Ausente na história, a memória do pai é tão onipresente quanto o dedo decepado de Lula.”

O dedo, esmagado sob a prensa transversal que um colega sonolento operou mal, foi perdido em 1963, quando ele trabalhava na Metalúrgica Independência, também em Vila Carioca. Isso depois de, menino ainda, ajudar a mãe como vendedor de amendoim, tapioca, cocada, laranja ou como engraxate e entregador de roupa para tinturaria. Só começou a se alfabetizar aos 10 anos, completando o primário em 1956 e logo se inscrevendo no curso de torneiro mecânico no Senai. No primeiro emprego, não demoraria a passar de office-boy a operário aprendiz da Fábrica de Parafusos Marte, cujo dono, Miguel Serrano, de 84 anos, é seu eleitor até hoje. Seguiram-se o trabalho na Fris Moldu Car, os seis meses de desemprego em 1966, com a família já morando em São Bernardo do Campo, a contratação como torneiro da Metalúrgica Villares, onde, incentivado pelo irmão José, mais conhecido por Frei Chico, integrou-se ao movimento sindical. Tornar-se líder desse movimento, em menos de dez anos, foi apenas uma conseqüência de seu temperamento inquieto, brigão, carismático, inconformado com os problemas da classe. Ganharia duas eleições para a presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, em 75 e 78. Em plena ditadura, liderou greves e acabou preso por 31 dias em 1980.

— No sindicato, ele nunca entrava pela porta da frente — lembra um assessor.

— Fazia questão de passar no meio da peãozada para saber o que estavam pensando. Não se pode tirar greve sem que o companheiro acredite nela — completa Lula.

Na prisão, experimentou na pele o preconceito elitista da Justiça no Brasil:

— Junto comigo foram presos um juiz e um advogado. Foram os dois para prisão especial, enquanto eu, na época a figura mais importante da vida sindical brasileira, fui jogado no fundo de uma cela.

Certamente ainda não tinha na cabeça a frase do celerado Lampião, hoje uma das que mais gosta de citar: “No Brasil, quem tem 20 contos de réis não é preso”. Mas ele foi. E processado. E condenado a 30 meses de cadeia, pena revogada pelo Superior Tribunal Militar. Entre os companheiros, a experiência foi a de uma classe subjugada, a maioria sequer sabendo de seus direitos mais elementares.

Democracia escrita com gente

A prisão, de certo modo, foi uma vitória. A intervenção federal no sindicato em greve levou milhares de operários a se reunirem na Praça da Matriz de São Bernardo. Lula, o líder, foi o primeiro a chegar. Às sete da noite, a multidão já estava a caminho do Paço Municipal. Uma tropa de choque da PM tentou dispersar os manifestantes, Lula à frente. Foi quando alguém teve a idéia de escrever no chão a palavra democracia. O que se seguiu é contado, em entrevista de 1994, pelo operário João da Luz:

“Foi uma coisa inesperada. Não tínhamos tinta ou qualquer outra coisa para escrever, quando um nordestino, que chamávamos de Baiano, um sujeito de pouca conversa e que muitos consideravam alienado, sugeriu: ‘Vamos escrever com gente’”.

E os operários realmente escreveram democracia, com o próprio corpo, no chão de pedra do Paço Municipal. Estavam no último A quando a tropa de choque tornou-se violenta, dispersando a multidão a cassetetes. Foi uma vitória porque, a partir dali, Lula, que já era um nome nacional na luta sindical, passou a ser um nome nacional na política.

A fundação do Partido dos Trabalhadores, em fevereiro de 1980, foi outra conseqüência. Consta que a ascensão de Lula contou com o surpreendente apoio de um poderoso adversário: Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil. Teria sido uma tática para dividir a esquerda. Segundo o general, o governo militar deveria preferir que Lula crescesse em vez de Leonel Brizola, já de volta do exílio e pensando, no mínimo, em se eleger governador do Estado do Rio. Por isso e por outros fatores, o PT entrou em cena como uma espécie de sonho impossível.

— Não tínhamos um programa, mas um prontuário — lembra Lula. — Na verdade, não éramos um partido, mas uma quadrilha, quase todo mundo carregando nas costas 20, 30, 50 anos de condenação por crimes políticos. Orgulho-me de saber que, hoje, somos muito mais do que um partido: somos a esperança.

Em 1982, em sua primeira disputa fora do meio sindical, Lula ficou em quarto lugar nas eleições que fizeram de Franco Montoro o governador de São Paulo (foi quando o Lula, apelido dado por dona Lindu, tornou-se oficialmente parte de seu nome). Em 1986, foi o deputado federal constituinte mais votado em todo o país: 650.134 votos. E em 1989 sofreu a primeira das três derrotas em eleições para presidente da República. Primeira e, nas circunstâncias em que ocorreu, a mais dolorosa. Lula chegou a sentir a vitória nas mãos, ao superar Brizola na briga para enfrentar Fernando Collor no segundo turno. Mas a Presidência escapou-lhe no último momento.

Nessa eleição, pela primeira vez, e de forma inesperada e contundente, sua vida pessoal veio a público.

E o que havia nessa vida pessoal que pudesse lhe custar preciosos votos na hora da decisão? Até então a biografia familiar de Lula parecia exemplar. Não só pela infância sofrida, mas também pelos dois casamentos, o primeiro dos quais, com a tecelã Maria de Lourdes, teve desfecho comovedor: em 1970, durante o parto do que seria o primeiro filho dos dois, Maria de Lourdes e a criança morreram. Por isso, e por combinar tão bem com o perfil do candidato dos trabalhadores, o caso Luriam foi explorado por Collor. O segundo casamento, com Marisa Letícia, deu-se em 1974, ela também viúva, de Marcos, assassinado num assalto quando a mulher estava grávida de quatro meses. Lula adotaria o filho de Marisa, Marcos Cláudio, hoje com 31 anos (o menino tinha 9 quando pediu ao padrasto que lhe desse o nome, passando a se chamar Marcos Cláudio Lula da Silva). Enfim, era difícil imaginar história tão capaz de tocar o coração de qualquer eleitor. Só que Lula já estava casado com Marisa quando nasceu, do romance com Miriam Cordeiro, a menina a que foi dado o nome de Luriam (a primeira sílaba de Luiz e as últimas de Miriam), hoje uma jornalista de 28 anos. Foi o ponto de partida para “o caso Miriam”. Em vez de defender-se firmemente das acusações, Lula mergulhou em profunda depressão. Contam os mais próximos que ele foi aconselhado a reagir com energia, de preferência levando Luriam ao horário eleitoral para dar entrevista defendendo-o dos ataques de Miriam. Lula teria ficado horas trancado com a moça numa sala e, ao sair, dito decididamente:

— Filha minha não vai para a televisão falar mal da mãe.

Mas ficou claro que a derrota não levaria Lula a desistir. Pelo contrário, a partir dela assumiu o papel de candidato permanente à Presidência. Não quis concorrer novamente a outro cargo eletivo, passando a viver do salário do PT para que pudesse manter-se enquanto tentasse eleger-se presidente mais uma, duas, três vezes. Em 1994 e 1998, outras duas derrotas, ambas para Fernando Henrique Cardoso, ambas menos dolorosas do que a primeira.

Assim, Luiz Inácio Lula da Silva chega às eleições de 2002. Nelas, o amadurecimento traduz-se não só na busca de planos de governo elaborados por técnicos, mas sobretudo na estratégia de campanha. Lula recorda que, em 1982, quando tentou eleger-se governador de São Paulo, apoiou-se em slogan que achava simplesmente genial: “Luiz Inácio Lula da Silva, ex-retirante, ex-engraxate, ex-tintureiro, ex-operário, ex-preso político… um brasileiro igual a você!”. Resultado: quarto lugar.

— Aprendi que o brasileiro não quer ser ex em nada — diz hoje. — O brasileiro quer ser alguma coisa na vida, um vencedor, e não quem foi e não é mais. Nossas cabeças reagem de acordo com o chão que nossos pés pisam.

Até onde Duda teve influência?

Grande parte da estratégia realmente se deve ao homem de marketing Duda Mendonça, que já serviu a Paulo Maluf. É o lado mais profissional de uma campanha que, talvez pela primeira vez, o PT adota “para ganhar”. Se Lula realmente pinta a barba para torná-la respeitavelmente grisalha, se mudou o corte do cabelo, se se veste com roupa de grife, se capricha na gravata, pode ou não ser obra de Duda. Mas foi certamente este quem descobriu um lado que o candidato escondia dos eleitores: o do bom humor.

— Na intimidade — conta Ricardo Kotscho, assessor de imprensa e dos mais chegados amigos de Lula — ele é um homem bem-humorado, cheio de tiradas engraçadas… É dos caras mais agradáveis para se ficar conversando durante horas. Duda percebeu esse lado de Lula e não fez por menos: aconselhou-o a trocar a cara zangada dos comícios pela do sujeito afável, risonho, bem-humorado, da intimidade. E deu certo.

Lula reconhece isso:

— Quando eu era sindicalista, usava um boné de marinheiro e uma camisa que parecia ter escrito no peito: “Estou com raiva”. Hoje já não posso usar o boné. E na camisa estaria escrito: “Estou de bem com a vida”.

Mas se a política é a arte do acordo, é também uma permanente fonte de contradições. Nos acordos feitos por Lula para estas eleições, contrariando a ala mais radical do PT, estão algumas de suas contradições. Se essas não chegam a ser pedras em seu caminho, os acordos, com todos os prós e contras, também já deixaram de preocupar. Afinal, ele sequer corre o risco de se tornar vulnerável ao ataque dos adversários, todos com telhado de vidro.

— Apoio eu aceito até do Maluf — admite Lula, cuidando para estabelecer diferença entre apoio e aliança, esta implicando compromisso.

Apoio, por exemplo, de José Sarney, a cuja “falta de palavra, incompetência e desgoverno” Lula aludiu quando o atual senador era o presidente da República (presidente cujo prestígio político o mesmo Lula resumiu numa frase: “Se disputasse uma eleição, os votos do Sarney não dariam para encher um penico”). Apoio também de Orestes Quércia, a quem, logo no primeiro comício pelas diretas, em 1987, Lula não poupou: “Quércia está usando métodos semelhantes aos utilizados pela Gestapo.” Apoio de banqueiros, empresários, fazendeiros, criadores de gado, com os quais a experiência ensinou ser preciso, mais do que antagonismo, diálogo. De um lado, impõe-se contar com o sim do MST e da Contag, que suspenderam as ocupações para não prejudicar a campanha de Lula; e do outro, a convicção do candidato: “Sou o único em condições de segurar os sem-terra”. Apoio, principalmente, de alguns empresários vitoriosos que antes o temiam, não fosse o milionário mineiro José Alencar o candidato a vice de sua chapa.

— Foi paixão à primeira vista — confessou durante jantar com grã-finos petistas da Barra da Tijuca (os quais, creiam, existem), relatando assim seu primeiro encontro com José Alencar. — Quando ouvi sua história, de um homem que tinha tudo para dar errado e deu certo, a ponto de faturar um bilhão por ano e de empregar 16 mil pessoas, vi ali o modelo do empresário que o Brasil precisa. E disse para mim mesmo: “Com esse, eu me caso”.

Se ainda acredita no socialismo, já fala num socialismo com mercado. Se em 1984 citava Cuba como exemplo de democracia, “onde há pobreza, mas não miséria, e o povo tem ampla participação”, sete anos depois já falava no equívoco de Fidel: “Deveria convocar eleições diretas para presidente e abrir o movimento sindical.” Se um dia viu na globalização uma força a serviço mais do capital do que do trabalho, hoje pensa num modo de inserir o Brasil nela, criando-se uma secretaria de comércio exterior de modo a fazer com que nossas embaixadas procedam “como verdadeiros mascates”, aprendendo a vender o que o Brasil tem de bom para vender. Se já lhe passou pela cabeça o não pagamento da dívida externa, o candidato de agora só pensa em respeitar os acordos já assinados e, no futuro, negociar com mais respeito à soberania do país. E se já afirmou ser “preciso acabar com o monopólio da Rede Globo”, hoje reconhece isenção da mesma Globo neste processo eleitoral e confessa estar sendo do GLOBO , desde 1998, a melhor cobertura jornalística das eleições presidenciais. Elogios à ditadura militar? Bomba atômica? Não perde o bom humor ao ver suas palavras exploradas pelos adversários. Nem vê elogio em reconhecer que apenas três governos — o de Vargas, o de JK e o de Geisel — trabalharam sobre algum planejamento, nem considera defesa da bomba atômica querer que o Brasil tenha os mesmos direitos das superpotências que não respeitam os acordos nucleares.

Tranqüilo, Lula vive seu melhor momento. Nunca teve o apoio de tantos intelectuais, artistas, pensadores ilustres da vida brasileira. Nunca esteve tão afastado do primeiro lugar dos rejeitados. Nunca tantos votam nele pela primeira vez. Das eleições anteriores para cá, mudou muito. Amadureceu e trocou alguns hábitos. Ainda come e bebe com prazer. Ainda mantém o peso em torno dos 90 quilos, bem acima do que pedem seus 1,71m. Aderiu às cigarrilhas, que fuma tragando, não mais do que uma caixa por dia.

Quanto às demais questões levantadas no começo deste perfil, Lula certamente acredita incluir-se sempre nas segundas hipóteses. Nem despreparado, nem rejeitado, nem feroz, nem comunista camuflado, nem perdedor, muito menos um retirante que não reconhece o seu lugar.

A última chance de um final feliz

Ele sabe, melhor do que ninguém, que uma quarta derrota seria o seu adeus definitivo à Presidência. Diz que não, mas talvez tema, lá no íntimo, que seu partido levaria tempo para se recuperar do golpe. E mais: uma quarta derrota seria a quase certeza de que o Brasil não quer um presidente com o seu perfil. Já a vitória, pelo contrário, seria a confirmação daquela prova viva, o final feliz de uma história de sucesso como só se vê nos filmes. Ou em realidades com jeito de lenda, como a daquele lenhador, nascido numa cabana do Kentucky, que se tornou presidente dos Estados Unidos. Lula nunca esqueceu as lágrimas de orgulho de dona Lindu ao saber que ele se diplomara como torneiro mecânico pelo Senai. Pode-se imaginar como seria se um dia ela visse o filho com a faixa presidencial no peito.