Por Joaquim Soriano

Marina entra na eleição para tentar cumprir o papel que Campos se colocou quando rompeu com o governo: atrair para uma “terceira via” o bloco da classe dominante antagonista à Dilma e desconfiada que Aécio não decola. Para tanto, promete a atração dos votos do descontentamento difuso – que estavam se abstendo – e uma mudança programática que já realizara com seus novos parceiros, neoliberais de carteirinha. Mas não está claro que possa realizar todas essas façanhas ao mesmo tempo.

Marina é candidata à presidência da República. Candidaturas expressam determinados perfis de lideranças políticas, construídas de forma rápida e midiática, como Collor de Melo, em 1989, ou já com um longo percurso dado pela sua própria história, como Marina Silva.

No Brasil de hoje, candidaturas presidenciais expressam principalmente alianças políticas e sociais, isto é, são de partidos políticos e de forças sociais organizadas, sejam dos de baixo ou dos de cima, em torno de um projeto para o Brasil. Desde Collor/Itamar, as eleições foram polarizadas entre PT e PSDB. Entre o projeto que dá curso à revolução democrática e o projeto orgânico aos centros imperialistas e ao capital financeiro internacional, desta feita encabeçado por Aécio Neves, com seu programa anti-povo e anti-nação.

Nestes anos, o povo brasileiro que vota a cada dois anos, aprendeu a votar com base em argumentos. Sólidos argumentos.

Em 2010, Marina, sozinha com o PV, fez 20% dos votos nacionais, chegando a 30% dos votos em várias capitais. Ajudou muito o PSDB ir ao segundo turno.

As eleições de 2012 demonstraram, no primeiro turno, que em várias capitais manteve-se este eleitorado confuso, difuso, mas que demonstra um certo descontentamento com a política, os políticos e o sistema de representação.

Depois de junho de 2013, a maioria dos governantes caiu, segundo todas as pesquisas, nos índices de aprovação. As candidaturas sofreram grandes turbulências. Dilma recuperou-se desde então. Mas quem cresceu no período foi Marina.

Marina cresceu porque desde 2010 era ela com quem este eleitorado difuso mais se identifica. Marina é mais forte eleitoralmente quanto mais difusa for. Marina é forte quando é um espectro. A linguagem que Marina usa, “uma nova política”, “um novo estado” agrega votos vindos de diferentes vertentes. Foi assim em 2010 quando venceu em várias capitais no primeiro turno e no segundo turno seus votos se dividiram e em várias Dilma venceu.

É muito difícil para Marina combinar fundamentalismo religioso (contra o aborto, contra a união homoafetiva, obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas) com plataforma econômica neoliberal (seus principais assessores são André Lara Resende e Eduardo Giannetti, que estavam com os tucanos) com sua imagem de ecologista e defensora do meio ambiente. Além disso, em 2014, aparece como substituta de uma candidatura que não foi organizada por ela.

Campos foi o arquiteto, o engenheiro e o pedreiro da construção de sua candidatura. Como em uma peça, montou o cenário e o figurino. Tinha Marina de vice e o apoio de uma grande parte do PSB que nos seus estados é tucana, como o vice de Alckmin em São Paulo ou mesmo os que vieram da direita direto para o PSB, como os Bornhausen de Santa Catarina. A candidatura de Campos não foi bem sucedida em buscar este voto difuso, mesmo com Marina de vice, as pesquisas não demonstraram que ele chegasse perto do potencial de Marina. Campos, de largada, disputou o lugar de Aécio, passou o chapéu no andar de cima, badalou o programa querido dos banqueiros com a defesa da independência do Banco Central.

Marina ocupará o lugar de Campos, mas muito dificilmente liderará a aliança política e social que lhe dava sustentação. Muda o protagonista, mas o cenário e o figurino continuam o mesmo, e daí nada se ajusta mais.

A aliança política e social que sustenta Aécio, o PSDB e os rentistas, os banqueiros, os meios empresariais de comunicação criaram nos últimos dias, em torno da comoção que a tragédia do acidente e consequente morte de Campos provoca, a elevação de Marina à condição de principal protagonista da disputa eleitoral. Não nos enganemos, a candidatura principal é a de Aécio e Marina continua a ser importante para eles enquanto ajuda a levá-lo para o segundo turno.

A disputa presidencial continua polarizada entre o nosso projeto e duas outras afinadas com plataformas neoliberais, claramente o PSDB e também o PSB – antes com Campos e agora com Marina. Campos não foi bem sucedido em se firmar como uma “terceira via”, mesmo tendo no eleitorado um desconforto a ser conquistado. Marina entra no lugar de Campos e o mais provável é que crie turbulência na aliança montada e dirigida por ele e que ela imbuída das responsabilidades assumidas por Campos não consiga cativar tão bem este eleitorado difuso e confuso que a admira por ela ser assim mesmo.

De imediato, discórdia e disputa do lado opositor para ver quem reúne melhores condições para nos derrotar. Do nosso lado, toda a atenção para esta candidatura nova que de imediato arrastou tantos indecisos para o seu lado.

Hoje inicia a propaganda eleitoral na TV e no rádio, um espaço democrático para defender os argumentos de que a continuidade do nosso projeto é o melhor para o nosso povo e para o país.

Joaquim Soriano é membro do Grupo de Trabalho Nacional da Democracia Socialista, tendência interna do PT, e diretor da Fundação Perseu Abramo
Publicado originalmente em www.democraciasocialista.org.br