Sindicalismo de Resultados e Corporativismo
Por Fernando Nogueira da Costa
As reformas implementadas por Deng Xiaoping, entre 1979 e 1989, adotando o Socialismo de Mercado com investimento direto estrangeiro, formação de quadros técnicos no exterior e transferência de tecnologia, levaram ao ressurgimento da antiga potência econômica: a China. A sociedade ocidental de consumo em massa forneceu ao Leste Asiático (e não à ex-URSS) não só um modelo a ser seguido, como também um mercado mundial para seus bens de consumo baratos. O paradoxal foi o Socialismo Realmente Existe, isto é, o Socialismo de Mercado, ter propiciado a revolução mundial na Sociedade de Consumo!
A inclusão em massa nesse mercado global é uma conquista social e não deve ser menosprezada. A luta dos trabalhadores ocidentais parece ter priorizado, justamente, o acesso à sociedade de consumo e à democracia da casa própria. Isto aparenta ser um fracasso face às reivindicações dos marxistas ortodoxos: extinção da herança; estatização do crédito; propriedade estatal de todos os meios de produção. Na prática dos regimes totalitários, extrapolou-se para a abolição da propriedade privada, inclusive de bens de consumo duráveis como automóveis e moradias!
No entanto, as reivindicações dos sindicalistas e partidos socialdemocratas europeus foram mais bem sucedidas: governo constitucional (inclusive Monarquia Parlamentarista); liberdade de expressão, de imprensa e de associação; representação político-partidária mais ampla por meio da reforma eleitoral; autodeterminação nacional ou autogoverno.
Nos Estados Unidos, houve a conciliação entre o consumo padronizado e o individualismo libertário. As melhores oportunidades de educação para os soldados norte-americanos que voltavam da II Guerra Mundial, associadas com uma onda de construção de casas nos subúrbios, se traduziram em uma significativa melhoria na qualidade de vida nos Estados Unidos. Os pais dos baby boomers foram a primeira geração a ter acesso significativo ao crédito ao consumidor. Eles compraram casa no subúrbio a prazo, seu carro a prazo, e seus eletrodomésticos a prazo.
A sociedade afluente é o termo consagrado por John Kenneth Galbraith em The Affluent Society, publicado em 1958, para caracterizar esse estágio de desenvolvimento econômico, cujo o objetivo já não deveria ser o da produção de mais bens de consumo, mas antes o do aperfeiçoamento dos serviços públicos. Analisando o modelo norte-americano no pós-guerra, o consumismo leva a tal produção de mercadorias que as pessoas já morrem não por comer de menos, mas por comer demais, isto é, devido à obesidade.
Quando à abundância privada se contrapõe a miséria pública, devido ao fato de que, estimulando-se a produção de bens privados se restringe a produção de bens públicos (como transporte coletivo, educação gratuita e saúde pública), ao mesmo tempo em que a publicidade provoca uma criação artificial de necessidades, potenciada pela concessão de facilidades de crédito, gera-se a chamada sociedade de consumo em massa. Deste modo, em vez de se satisfazerem necessidades fundamentais, gasta-se dinheiro em necessidades triviais, por exemplo, no consumo suntuário de luxo.
Os Cinco Cês da Classe C são Carro, Casa, Casar, Cruzar (Criar Crianças), Consumir. Se quiséssemos ampliar o mnemônico, que serve para facilitar a memorização, de modo jocoso, diríamos “Ceis” (com C) “Çonhos” (com C cedilha) da Classe C, isto é, da típica Classe Média, são aqueles acrescentados de Cruzeiro como símbolo do status de viajar. Mas isso poderia ser visto como esnobismo, porque professor acha que “passaporte não é diploma”. Ele tenta valorizar e cobrar dos outros o que, pretensamente, possui: Cultura. Este seria o sétimo Cê, mas custa muito conseguir… Tem ainda de se incentivar o oitavo Cê: Complementar Previdência.
Niall Ferguson defende a hipótese de que a supremacia da Civilização Ocidental sobre a Oriental deu-se por conta de o capitalismo, a liberdade e/ou a democracia. Ela se manifestou através de seis apps ou aplicativos decisivos:
1. Competição: uma descentralização da vida política e econômica, que criou as condições para o surgimento dos Estados-nação e do capitalismo.
2. Ciência: uma forma de estudar, entender e, finalmente, transformar o mundo natural, que deu ao Ocidente, entre outras coisas, uma importante vantagem militar sobre o restante.
3. Direitos de propriedade: o controle da lei como um meio de proteger os proprietários privados e solucionar, pacificamente, as disputas entre eles, que assentou a base para a forma mais estável de governo representativo.
4. Medicina: um ramo da ciência que possibilitou uma importante melhoria na saúde e na expectativa de vida, inicialmente nas sociedades ocidentais, mas também em suas colônias.
5. Sociedade de consumo: um modo de vida materialista em que a produção e a compra de roupas e outros bens de consumo, em grande escala, desempenham um papel econômico central, e sem o qual a Revolução Industrial teria sido insustentável.
6. Ética do trabalho: um sistema moral e um modo de atividade derivados do cristianismo protestante, entre outras fontes, que fornece a coesão à sociedade dinâmica e potencialmente instável criada pelos itens anteriores.
No entanto, o que estamos observando, aqui e agora, com a busca desenfreada do alpinismo social, é a ascensão do individualismo e/ou do corporativismo no pior sentido. Este é defesa exclusiva dos próprios interesses profissionais por parte de uma categoria funcional contra o bem-estar do restante da sociedade. O espírito de corpo ou de grupo predomina no “sindicalismo de resultados”, quando o único resultado almejado é a mobilidade social do indivíduo.
Fernando Nogueira da Costa é economista