Direitos da mulher no Brasil profundo
Por Eleonora Menicucci
Em pleno século 21, o chamado Brasil profundo – constituído pelas áreas de campo, floresta e águas – continua gritantemente injusto com as mulheres. Impressiona saber que a violência contra elas chega ao ponto de parecer um direito hereditário do homem, passado de pai para filho, como ocorre em comunidades do Arquipélago de Marajó, segundo testemunho local, num espelho que reflete o Brasil, em maior ou menor grau. Ali, sofrem violência a avó, a mãe e a filha.
Esse foi o quadro encontrado recentemente pela Secretaria de Políticas para as mulheres da Presidência da República (SPM/PR), em viagem piloto a bordo das agências-barco da Caixa para diagnosticar a situação das marajoaras. A cultura local dominante impõe a elas, como papel principal, cuidar do lar, dos filhos e do marido. Costumam engravidar na adolescência, casar-se e abandonar a escola para cumprir essas funções.
A cultura patriarcal de dominação e desvalorização da mulher explica essa situação. E Impõe grandes dificuldades para se denunciar os agressores e fazer valer a Lei Maria da Penha. Um dos principais desafios é quebrar um fator que sustenta o ciclo de violência: a falta de autonomia econômica feminina. É relativamente comum que elas vivam em dependência quase total em relação aos homens.
É por isso que a SPM se empenha em fazer chegar às mulheres do Brasil profundo as políticas públicas federais destinadas não apenas ao combate à violência, como, também, à sua autonomia. Isso só tem sido possível mediante uma atuação transversal nos três níveis de governo e em coordenação com os demais poderes, com a sociedade civil e com lideranças locais.
O combate à violência de gênero nessas áreas passa necessariamente pela garantia e ampliação dos direitos econômicos. Nesse sentido, é parte fundamental no processo o incentivo à criação de grupos e organizações produtivas locais que possam capilarizar o acesso às políticas governamentais voltadas para as mulheres. O incentivo torna-se pedra de toque desse processo libertador. É decisivo para melhorar a qualidade da produção e possibilitar o acesso a crédito produtivo e à assistência técnica, a agregação de valor, a infraestrutura produtiva e o acesso aos mercados.
Nessa iniciativa em Marajó, a SPM conseguiu importante parceria com a Caixa para que suas agências-barco levem atendimento e informação sobre direitos humanos às populações ribeirinhas, principalmente os direitos previstos na Lei Maria da Penha. E também para poder avaliar a melhor maneira de se disponibilizar para locais distantes dos grandes centros suporte semelhante ao oferecido hoje nas regiões urbanas. Esse suporte inclui o acesso à Justiça e a direitos, à Lei Maria da Penha e aos demais serviços especializados da Rede de Atendimento a mulheres em Situação de Violência.
A viagem piloto foi apenas o primeiro passo desse projeto, que é ambicioso por levar esses serviços às ribeirinhas. No arquipélago marajoara, o barco já atende mensalmente 10 localidades na região, onde vivem cerca de 350 mil habitantes. A SPM já acertou o compartilhamento de mais duas embarcações com a Caixa para atender comunidades desse perfil na Amazônia e na Bacia do São Francisco. E outras parcerias estão sendo consideradas com a Marinha, a Assistência Social e a Saúde.
Junte-se a isso outra ação que atendeu a uma reivindicação da Marcha das Margaridas, a das unidades móveis – ônibus especialmente projetados e adaptados para rodar em condições inóspitas e, assim, poder levar ações de prevenção, assistência, apuração, investigação e enquadramentos legais ao meio rural. A SPM já entregou 34 desses ônibus, de um total de 54 (dois por estado e DF), os quais integram o programa Mulher, Viver sem Violência.
Com a inclusão no estado de direito dessas mulheres do campo, da floresta e das águas – até agora, invisíveis -, a presidente Dilma reafirma seu compromisso de transformar o Brasil num país mais justo e igualitário, no qual todas exerçam o protagonismo que lhes cabe, por mérito e direito, no desenvolvimento da nação. A presidente deixou claro a linha de governo: tolerância zero em relação à violência contra as mulheres. Qualquer pessoa pode – e deve – denunciar violências contra elas. Basta ligar para o 180, que é gratuito e funciona 24 horas por dia. Denuncie: as brasileiras não estão mais sozinhas. O Estado está com elas.
Eleonora Menicucci é ministra de Estado chefe da Secretaria de Políticas para as mulheres da Presidência da República.
Publicado originalmente no portal do PT nacional.