Em três eixos temáticos, especialistas mapearam e discutiram os avanços e desafios para o desenvolvimento local 

No 2º dia, seminário da Amazônia debate trabalho, pesquisa e integração regional 
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Nesta sexta-feira (6), ocorreu a segunda rodada de exposições do seminário “Amazônia e Mudanças Climáticas – Soberania, Sustentabilidade e Inclusão no Desenvolvimento Nacional”, promovido pelo Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas – Ciência, Tecnologia e Informação (NAPP CT&I) da Fundação Perseu Abramo. 

As mesas, divididas em três eixos temáticos, contaram com palestrantes professores da academia, técnicos de centros de pesquisa, representantes de organizações internacionais e movimentos populares especialistas na região, no mundo do trabalho e na integração entre os países amazônicos.  

“Eu fico otimista porque nós ouvimos muitas pistas para compor uma conversa de como a gente pode se posicionar para defender o desenvolvimento inclusivo, mas também um desenvolvimento que leve em consideração a preservação das nossas florestas e dos nossos povos”, disse Paulo Okamotto.

O presidente da Fundação Perseu Abramo destacou que a bancada da região Norte no Congresso ainda segue pouco sensível ao debate ambientalista e que com as sínteses do seminário é possível ampliar esse debate na sociedade. Para Okamotto, é importante que o desenvolvimento econômico da região abarque os produtos que tenham mercado consumidor, “com planejamento e foco, muita ciência e muita pesquisa para gerar empregos”, apontou o presidente da fundação. 

Um dos coordenadores do evento, Luiz Antônio Elias, que coordena o NAPP CT&I, pontuou o caráter do seminário. “Tentamos colocar questões que pudessem aprofundar o olhar, em especial, para pensar na Amazônia, não mais à margem das políticas, mas sim na centralidade de um processo estratégico, e a questão ambiental, econômica, geopolítica e civilizacional”, comenta Elias. “Foram debates de alto nível nos sete grandes eixos que propomos”, completa.  

Pedro Silva Barros, que coordena o Grupo de Trabalho da Amazônia na FPA, falou sobre a importância da capilaridade do debate no interior da região. “Existe uma concentração de discussão, principalmente pelas instituições e o envolvimento da cidade, em assuntos relacionados a Belém e ao Pará, e foi bem legal que tivemos no seminário essa presença tão forte, mas temos uma preocupação grande com os outros estados da Amazônia”, afirma. 

“As entregas ali ainda são pouco presentes e bastante desarticuladas, esse é o nosso desafio, conseguir melhorar a articulação dessas várias políticas públicas”, aponta Silva Barros. 

Os trabalhos do dia foram divididos em três eixos. O eixo 5 (Bioeconomia e Modelos de Desenvolvimento Alternativos) falou das iniciativas inovadoras de uso sustentável dos recursos naturais, o papel das cooperativas, da agricultura familiar e das cadeias produtivas locais e dos modelos de financiamento para empreendimentos sustentáveis na região. A mediação da mesa foi de Ima Vieira,  pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG).  

O eixo 6 (Trabalho e Justiça Social na Amazônia) trouxe os impactos do desmatamento e das mudanças climáticas no mercado de trabalho, as políticas de proteção social e direitos trabalhistas na bioeconomia e a inserção de comunidades tradicionais em cadeias produtivas sustentáveis. A mediação da mesa foi de João Batista, do Partido dos Trabalhadores no Pará. 

Já o eixo 7 ( Integração Pan-Amazônica e desenvolvimento fronteiriço) tratou do papel da OTCA, a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, e os desafios da integração regional multilateral, das políticas públicas para desenvolvimento social e econômico em áreas de fronteira e também da cooperação científica, tecnológica e ambiental entre os países amazônicos. A mediação foi de Pedro Silva Barros, do GT Amazônia da FPA. 

Segundo a organização, o seminário busca integrar diferentes atores, envolvidos na formulação de políticas para a região, seja no plano local ou nacional. As principais conclusões serão sistematizadas como subsídios para os debates, junto aos governos locais e  no Congresso Nacional, para a preparação dos trabalhos da COP30, além de municiar lideranças e a militância petista com informações atualizadas do assunto. 

Confira os destaques das discussões: 

Eixo 5: Bioeconomia e Modelos de Desenvolvimento Alternativos

“Trabalhamos em um mapa de localização das instituições de ensino e pesquisa no território amazônico e esse esforço foi revelando situações muito interessantes e pouco aproveitadas das iniciativas do próprio governo. É curioso porque várias dessas surpresas que vemos ao longo do tempo eram resultado da ampliação das políticas na questão do ensino, dos institutos federais, a proliferação dos campus das universidades, que dão um outro panorama pra esse tema e que merecem ainda mais políticas públicas” — Tatiana Sá, pesquisadora da Embrapa

“[sobre o novo arco de restauração da Amazônia] foi montado um cenário com duas etapas, um até 2030 e um até 2050. A conta que foi feita pela equipe do BNDES é que nós precisamos até 2050 de um investimento bastante significativo de 50 bilhões de dólares, ou seja, é um recurso que o Brasil está propondo, justamente com as discussões das COPs, então, aí entra a questão da captação de recursos para financiar esse tipo de projeto, não só no Brasil, como também em florestas tropicais na África e na Indonésia. Até 2030, a ideia é restaurar áreas prioritárias, começando pelas de menor complexidade e custo, com foco na meta de 6 milhões de hectares com um investimento de 10 bilhões de reais”Márcio Meira, assessor da presidência do BNDES 

Eixo 6: Trabalho e Justiça Social na Amazônia

“Existe essa conexão muito intrínseca do avanço da fronteira econômica, que pode trazer oportunidades, mas também traz muitos desafios na extração material, energética, que muitas vezes não se reflete em um esquema distributivo adequado aos povos e populações locais, que muitas vezes acabam ficando com uma dívida ecológica, social e ambiental, na relação da expansão dessa fronteira. Então, essa fronteira como método de desenvolvimento e como modelo, ou seja, tem a ver com a dinâmica social e com como se constituem os modelos de expansão econômica e promoção do desenvolvimento, o que traz um contraste com aquela ideia da floresta co-construída e da dimensão de um trabalho coletivo da produção da biodiversidade”Marcela Gonçalves, professora do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA

“A região recepciona um tipo de trabalho de alta vulnerabilidade, alta precariedade, mais de 60% da força de trabalho vive na informalidade, portanto, sem proteção trabalhista, social, previdenciária, e com baixíssima ou sem proteção sindical. É uma situação de dispersão no território, que dificulta qualquer tipo de ação e de organização mais ampla, pensando em uma intervenção de articulação e presença na disputa por políticas nesta região. E por outro lado um desafio enorme para o Estado de coordenar políticas públicas”Clemente Ganz Lúcio, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social

“Falando sobre trabalho decente na Amazônia nós temos alguns desafios que são importantes de ressaltar. Primeiro que a nossa visão de trabalho, a visão das populações locais, o campo de onde eu venho, vai além de uma visão de trabalho formal, é preciso destacar a inter-relação que nós temos com a natureza, onde o tempo é o da natureza, a demanda de escala se dá pela comercialização em rede, o formato do trabalho é o formato coletivo, solidário. Isso é importante trazer porque do contrário a gente não compreende essa realidade”Dione Torquato, Conselho Nacional de Populações Extrativistas

Eixo 7: Integração Pan-Amazônica e desenvolvimento fronteiriço

“Nenhum processo de integração da América do Sul pode ignorar a importância da região amazônica. 40% do território da América do Sul é Amazônia, em alguns países são mais de 50% de seus territórios. Então, como nós podemos pensar em integração se essa extensa zona dos oito países da bacia amazônica não é considerada como algo fundamental?”— Rosalia Arteaga, ex-vice-presidente do Equador

“Acontece em todos os países que compõem a OTCA, há uma diferença entre o processo de desenvolvimento de qualidade de vida, de acesso aos serviços públicos daqueles que vivem na Amazônia em relação às demais regiões. E isso mostra, desde já, que é preciso que os países adotem políticas diferenciadas porque se adotar políticas iguais acabamos aprofundando as diferenças, e o que nós precisamos fazer é saber como a gente avança na busca por igualdade maior entre as regiões”  Vanessa Grazziotin, diretora executiva OTCA

“Os fatores críticos são: gente, talentos, pessoas capacitadas, colaboração intensiva e conexões, aí a gente começa a entender como podemos, na região amazônica, ter de um lado a formação de talentos como fundamental, em qualquer ecossistema, em qualquer área, a colaboração entre os atores locais, nacionais e também internacionais, ou seja, o conjunto de universidades que podem e devem apoiar a OTCA de uma forma articulada. Mas, para isso acontecer precisa política, estratégia e investimento”Jorge Audy, superintendente de inovação e professor da pós-graduação em Ciência da Computação da PUC do Rio Grande do Sul