Ciclo aborda desdobramentos regionais com viés político; próxima edição será em Olinda, dia 8 de maio

No auditório da Assembleia Legislativa do Pará, em Belém, foi realizada a terceira edição do ciclo de debates “Ditadura Nunca Mais”, que discute as consequências em de 21 anos dos militares no poder em diferentes regiões do país. O evento, que contou com a participação de diversas gerações, ocorreu nesta quarta-feira (24).

Com o deputado Carlos Bordalo, do PT, a professora Edilza Fontes e o escritor Gilney Viana como convidados, a mediação das falas foi de Naiara Torres, liderança política paraense.

O político petista leu as principais recomendações de um documento, com três volumes, produzido a partir dos trabalhos da Comissão Estadual da Verdade. O nome do relatório é Paulo Fonteles Filho, relator do texto, morto em 2017 por complicações de saúde. Bordalo destacou que houve forte resistência regional ao golpe de 64 já no dia seguinte, com mais de 300 presos em Belém, entre estudantes, sindicalistas e outros militantes. Sobre o contexto nacional, ele lembrou que 377 pessoas foram responsabilizadas pela Comissão Nacional da Verdade, mas nenhuma delas responde criminalmente pelas torturas e outros crimes cometidos.

“O nosso relatório mostrou que o que sofremos hoje na Amazônia foi aberto pelo ciclo da ditadura militar, até então a Amazônia e o Pará se concentravam em atividades que pouco agrediam a natureza”, pontua Bordalo. O deputado afirma ainda que “o regime militar impôs para a Amazônia a abertura de pastos e o financiamento para o controle territorial, com o nascimento dos latifúndios”.

Edilza Fontes relembrou o período a partir de propagandas da época que traziam a ideia de uma região ligada ao progresso sem relação com as florestas, em chamadas como “A Amazônia já era” e “Para unir os brasileiros, nós rasgamos o inferno verde”. Edilza pontuou a importância da questão agrária e como o desenvolvimento rodoviário na região colaborou para o aumento das migrações de nordestinos e sudestinos.

Para a professora, a imagem de um progresso sem a utilização de maneira consciente dos recursos da Amazônia, com a floresta “atrapalhando”, ficou arraigada no imaginário nacional pós-ditadura. E o modelo de ocupação do território que antes era vinculado às beiras dos rios passou a ser nas beiras das estradas.

“Ainda não temos a dimensão do nosso potencial econômico, não temos estabelecidos um parque industrial de fármacos, de cosméticos, de doces, uma produção forte do pescado, tudo relacionado a nossa Amazônia, porque ela sempre foi tratada pelos governos militares como algo que deveria ser destruído”, opina.

O ex-deputado federal, escritor e político Gilney Viana é um estudioso do período, além de ter participado da resistência como militante, e deu seu depoimento baseado também em suas vivências. Para ele, falar sobre ditadura é “um debate mais do que oportuno, é necessário”.

“Essa justiça de transição do Brasil é um papo meio furado, é parcial, é restritiva, é limitada, é uma reprodução da limitação que a ditadura impôs sobre a leitura do passado”, opina.

Viana questiona a anistia ter vindo para os torturadores de maneira desigual em relação aos presos políticos. Além disso, ele dialogou com as falas dos outros palestrantes e aprofundou o tema da violência contra os camponeses em diferentes territórios da região.


A edição de Belém (PA) e as anteriores do ciclo “Ditadura Nunca Mais” estão disponíveis no canal do youtube da Fundação Perseu Abramo, que organiza o evento.

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