Disputa política de narrativas, planejamento governamental, finanças públicas, gestão democrática, enfrentamento ao liberal-autoritarismo e mesmo ao proto-fascismo nacional são abordados no livro ‘Ousadia e transformação: apostas para incrementar as capacidades’.

O novo lançamento da editora da Fundação Perseu Abramo em parceria com a editora Contra Corrente tem organização de José Celso Cardoso Jr e Leandro Freitas Couto e o prefácio assinado por Marcio Pochmann, ex-presidente da FPA e atual presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Entre os autores estão Frederico Barbosa, Gilberto Maringoni, Jackson De Toni, José Celso Cardoso Jr., osé Flávio Albernaz Mundim, Leandro Freitas Couto, Rafael Neto, Roberto Rocha C. Pires, Ronaldo Coutinho Garcia e Tatiana Lemos Sandim.

Nesta rápida conversa, José Celso explica melhor os objetivos e temas do livro. José Celso Cardoso Jr. é doutor em economia pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE-Unicamp). Pesquisador do Ipea desde 1997, atua em temas ligados ao mundo do trabalho e proteção social no Brasil; Estado, planejamento e gestão pública. Ocupou vários cargos de direção no governo federal durante governos de Lula e Dilma. Atualmente ocupa o cargo de Secretário de Gestão de Pessoas no Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos.

A publicação pode ser acessada em sua íntegra aqui.

O que motivou os organizadores a elaborar o livro?

José Celso: Este livro é um somatório de textos e temas que vem compondo desde 2009 uma das agendas de pesquisa e assessoramento governamental mais importantes do Ipea, em torno dos campos do planejamento estratégico, das finanças e da gestão pública no Brasil.

Como na tradição atual, as publicações são praticamente todas isoladas umas das outras e muito efêmeras, temos adotado também, desde 2009 a prática de consolidar esses trabalhos e blocos temáticos na forma de livros.

Assim feito, esse tipo de publicação cumpre ao menos dois papéis muito importantes. Primeiro, promove verdadeiro registro histórico de documentos que de outra maneira se perderiam na pressa do cotidiano. Segundo, vistos assim em conjunto, possuem um poder explicativo muito maior – abrangente e aprofundado – que a mera soma das partes que as compõem.

Livros assim são, portanto, um belo e importante instrumento de disputa política de narrativas, cujas ideias não se esvanecem com o tempo.

Quais as expectativas dos organizadores quanto ao aproveitamento do livro no atual momento, pós governo Bolsonaro?

José Celso: Este livro cumpre papel primordial no debate atualmente em curso no Brasil, justamente porque faz a crítica dos modelos dominantes e disfuncionais de planejamento, orçamentação e gestão, ao mesmo tempo que sugere alternativas críveis às formas de organização e funcionamento dessas funções governamentais indispensáveis ao processo de governar.

Na parte sobre planejamento público, o livro resgata sua centralidade política e o requalifica como a função governamental mais importante para o enfrentamento das vicissitudes do presente, bem como para a reconstrução do futuro. Afinal, planejamento é a arte da boa política, é função intrínseca ao processo complexo e dinâmico de governar.

Na parte do livro sobre finanças públicas, fazemos uma crítica contundente ao modelo que se vem cristalizando no Brasil, que prioriza o rentismo para os ricos e o fiscalismo para os pobres. Diz que é preciso superar essa armadilha imposta pela aliança entre a tecnoburocracia incrustrada na área econômica de governo e a ideologia liberal-autoritária do mercado. Há alternativas, e elas passam por processos de desfinanceirização predatória da economia, ao mesmo tempo que de desprivatização das finanças públicas.

Na opinião dos organizadores, é possível haver um fortalecimento de um Estado democrático?

José Celso: Claro que sim! Porém, neste nosso país, nada parece ser rápido, fácil ou barato. Significa que para enfrentarmos o liberal-autoritarismo e mesmo o proto-fascismo aqui latente, é preciso coragem e perseverança dos setores progressista e populares da sociedade.

É preciso fortalecer e mobilizar as capacidades governativas do Estado nacional, dentre as quais as trabalhadas neste livro – o planejamento governamental, as finanças públicas e a gestão democrática – , de modo que elas ajudem o atual governo a governar, ou seja, a formular e implementar o plano de governo vencedor das eleições de 2022.

Apenas se os resultados pretendidos com este plano eleito democraticamente se efetivarem é que a política – como forma de organização e resolução dos conflitos – e a própria democracia – como forma de expressão da vontade popular – poderão voltar a se legitimar junto às pessoas que a praticam e que nela acreditam.

Deste modo, enfatizamos nesse livro que sim, há formas de fortalecer a democracia em nosso país, e elas também passam pelo fortalecimento e redirecionamento das capacidades e instrumentos de planejamento, orçamento e gestão. Essas funções governamentais não são e não podem ser vistas como meras funções burocráticas. Muito ao contrário, elas são o cerne e o veio por meio de onde a transformação positiva da sociedade pode se realizar.

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