O que as pesquisas recentes nos dizem
A divulgação das mais recentes pesquisas do Datafolha, da AtlasIntel e da CNT/MDA trouxe questionamentos acerca do patamar de aprovação e reprovação do terceiro governo Lula, que completou nove meses de mandato. Um aumento da avaliação negativa na ordem de quatro pontos percentuais na DataFolha acendeu um sinal amarelo sobre a opinião dos brasileiros sobre o novo governo.
As pesquisas do mês de agosto e do início do mês de setembro, realizadas respectivamente pelos institutos Quaest e IPEC, mostraram um aumento da aprovação do governo Lula (Gráfico 1). IPEC mostrou aumento de 3 pontos percentuais (p.p.) na aprovação e Quaest de 5 p.p. (de 37% a 42%). Esta melhora foi percebida, inclusive nos segmentos mais próximos ao bolsonarismo (evangélicos e os eleitores e eleitoras que votaram em Bolsonaro no segundo turno das eleições presidenciais de 2022).
A avaliação positiva, de acordo com ambos os levantamentos, poderia ter sido impulsionada por uma melhora da economia. Segundo a Quaest, por exemplo, havia aumentado de 51% para 59%, entre abril e agosto, a expectativa de que a economia iria melhorar, e de 23% para 34% a sensação de que a economia melhorou nos últimos 12 meses. Segundo o IPEC, 42% consideram que houve melhora na economia nos últimos seis meses, enquanto 27% não viram mudança e 29% consideram que houve piora.
GRÁFICO 1
As últimas pesquisas publicadas, no entanto, mostraram um cenário um pouco diferente com sutil aumento da reprovação no último período (Gráfico 2). Segundo o Datafolha, a avaliação negativa (soma dos que consideram o governo ruim ou péssimo) subiu de 27% para 31% de junho a setembro – no limite da margem de erro, que é de 2 pontos percentuais (p.p.) para mais e para menos. Segundo o Instituto Atlas, o mesmo índice aumentou de 40% para 42%, dentro da margem de erro. Já na pesquisa CNT/MDA, houve aumento de 2,6 p.p. na avaliação negativa (de 24,6% para 27,2%) e queda de 2,5 p.p. na positiva (de 43,1% para 40,6%) – a margem de erro é de 2,2 p.p. para mais e para menos.
Antes de seguir, uma nota metodológica. Como se pode notar nos gráficos, a pesquisa Atlas – quando comparada a outros institutos – traz patamares mais elevados de aprovação e reprovação do governo. Como consequência, o patamar da avaliação regular fica no patamar dos 13%. Datafolha (com metodologia de coleta presencial via ponto de fluxo) indica que seriam 30% da população aqueles que consideram o governo regular, e a IPEC (com coleta presencial domiciliar) traz um total de 32%. Isso pode ter justificativa no método de coleta escolhido pelo instituto Atlas. Pesquisa feita por internet, a Atlas tende a trazer números mais polarizados e pouco espaço para um “meio do caminho” – que indica uma amostra mais “engajada”.
Mas, voltando à análise da avaliação negativa. Como se nota, as curvas ao longos dos meses de fevereiro a setembro podem ser bastante angulosas – o que indicaria variações significativas mês a mês. Porém, se pudermos olhar a curva do período como o todo (ou seja, do começo do ano até setembro), o que se nota é uma manutenção dos patamares, com um possível aumento da avaliação negativa (seria o início de uma tendência? A ser verificada nas próximas pesquisas). Vejamos, com exceção da Quaest que apresenta variação maior de 20% a 24% (de fevereiro a setembro), os outros institutos variam pouco ou nada ao longo do período todo. DataFolha de 29% a 31% (variação de 2 p.p. dentro da margem de erro); IPEC de 24% a 25% (variação de 1p.p. dentro da margem de erro); Atlas (manteve em 42%), CNT/MDA de 24,6% para 27,2% (variação dentro do limite da margem de erro). Ou seja, é possível afirmar que o governo Lula até agora é marcado mais por estabilidade do que por variação no que diz respeito à opinião pública da população geral.
GRÁFICO 2
Façamos o mesmo exercício num segmento importante, o de renda familiar mensal de 2 a 5 salários mínimos (Gráfico 3). Do começo do ano até setembro, já se nota um sutil, mas aparentemente consistente aumento da reprovação de fevereiro a setembro. Quaest mostra um aumento mais significativo (vai de 22% a 26%, aumento de 4p.p.); enquanto o IPEC mostra uma subida de 3 p.p. (de 27% para 30%) e DataFolha de apenas 1p.p. (de 36 para 37).
GRÁFICO 3
Na faixa de renda mais baixa, até 2 salários mínimos, a tendência é de ainda menos variação, ou seja, mais estabilidade. Nas rendas mais altas, as pesquisas divergem: IPEC apontou uma queda de 8 p.p. na avaliação positiva no segmento com renda maior que 5 salários mínimos (de 38% pra 30%), enquanto o Atlas trouxe uma variação de apenas 1 p.p. (de 35% para 34%).
Este cenário de pouca variação/estabilidade não se reproduz em dois segmentos regionais: Nordeste e Sul. Enquanto no Nordeste houve uma ligeira queda da avaliação positiva, de 62% para 56%, segundo a Quaest (no comparativo de fevereiro a agosto); de 53% para 48% segundo a IPEC (comparando março a setembro); e de 53% pra 49% segundo o Datafolha (de abril a setembro). No Sul houve um aumento da reprovação, nos mesmos períodos, de 23% para 26% segundo a Quaest, de 28% pra 35% segundo o IPEC e de 34% pra 39% segundo o Datafolha.
Ainda, há importantes discrepância entre as pesquisas: entre as mulheres, por exemplo, o IPEC aponta uma estabilidade nos patamares de avaliação negativa (era 22% em março e foi 23% em setembro). Já o Datafolha aponta um aumento de 4 p.p. de abril a setembro (de 26% pra 30%). Na avaliação positiva, nos mesmos períodos, é mais notório: IPEC demonstra um aumento de 3 p.p. (de 41% pra 44%) e o Datafolha uma queda de 5 p.p. (de 42% para 37%). Entre os mais jovens, o IPEC detectou uma queda na avaliação negativa de 22% pra 18%, e o Datafolha apontou um aumento de 17% pra 23%.
Vale ressaltar, também, que Datafolha e Quaest não divulgaram recortes importantes da população. Não houve divulgação, no relatório de tabelas, do recorte de religião em nenhuma das duas – logo, só temos os dados da IPEC sobre Católicos e Evangélicos. O Datafolha também não fez qualquer recorte utilizando a declaração de voto nas eleições de 2022, ou perfil atitudinal – como fez em outras pesquisas identificando os mais próximos do petismo e os mais próximos do bolsonarismo.
As pesquisas demonstram uma relativa estabilidade desde o começo do ano, mas com sinais de que isso pode estar em mudança – e somente as próximas pesquisas poderão indicar se há tal tendência. O Noppe seguirá acompanhando os próximos levantamentos, com o exercício de entender a razão das diferenças entre os institutos; bem como apontar tendências e caminhos que estão percorrendo a opinião pública.
Desde 2020, o Noppe (Núcleo de Opinião Pública, Pesquisas e Estudos) da Fundação Perseu Abramo faz um acompanhamento sistemático das pesquisas divulgadas pelos principais institutos, sob o pano de fundo de um acúmulo sobre as metodologias de coleta e análise e como considerar tal questão nas avaliações.
Jordana Dias Pereira é socióloga e coordenadora do Noppe e Matheus Tancredo Toledo é cientista político e analista do Noppe