Não cabe ao Judiciário negar direito assegurado em lei

O NAPP – Mulher repudia a cruel condução da Justiça de Santa Catarina no caso da menina que, vítima de estupro aos dez anos de idade, veio a engravidar. Sabendo da indesejada gestação na 22ª semana, a mãe levou a menina ao hospital para interrupção autorizada pela lei. No entanto, o hospital se negou ao procedimento alegando idade gestacional acima de 20 semanas. O caso então chegou à juíza Joana Ribeiro Zimmer que, a pedido do Ministério Público de SC, determinou o Acolhimento Institucional, retirando a menina abruptamente da família e a colocou em um abrigo, onde está até o momento. Mas as violências não pararam aí.

Em audiência realizada em flagrante desrespeito à lei nº 13.431 e aos protocolos do Conselho Nacional de Justiça, CNJ, a criança foi inquirida diretamente pela Juíza, em ato totalmente irregular e com participação da Promotora. Os vídeos estampam cenas de grave crueldade à menina vítima de violência e à mãe que autorizava o aborto, com tentativas de indução a que a gravidez fosse mantida e o bebê entregue à adoção. Uma dessas crueldades foi a afirmação de que a interrupção seria um homicídio1.

A Atenção Humanizada ao Abortamento é direito das mulheres vítimas de violência sexual, independente de quaisquer manifestações do Poder Judiciário. O Código Penal brasileiro autoriza essa interrupção e, em nenhum momento, a condiciona ao tempo da gestação.

No caso da menina em questão, a situação é ainda mais delicada. Antes de completar 16 anos, a adolescente ou a criança são representadas pelo representante legal, no caso, a mãe desejosa do aborto. Mesmo assim, a Juíza e a Promotora, como os vídeos demonstram, desrespeitaram a proteção da lei. Não houve a inquirição especial, mas intimidação direta e manipuladora. De resto, o comportamento da Juíza viola os direitos humanos da menina, grávida aos 10 anos em decorrência de estupro, fato em nenhum momento questionado.

A retirada dos cuidados da mãe e Acolhimento Institucional, é igualmente ato, além de perverso, irregular, sendo, para tanto, essencial parecer técnico social, assinado por profissional com Registro no Conselho de Serviço Social. E, segundo as notícias veiculadas pela mídia, uma das justificativas dessa retirada foi proteger a menina de outras violências, esquecendo que a maior violência foi o estupro e a gravidez decorrente e de que quem deveria ser retirado do convívio da menina é o autor da violência, e não o contrário. Não se admite que a Justiça, instada a tanto, não tenha autorizado a interrupção desejada pela menina e autorizada pela mãe ao invés disto tenha constrangido a criança e aumentado ainda mais o seu trauma.

Trata-se de medida altamente discriminatória, ilegal, abusiva e prejudicial à criança e, ademais, violadora da integridade pessoal e atentatória à dignidade humana, cometida contra uma criança que deve ser protegida pelos sistemas de saúde e de Justiça.

Diante dessas violências e do evidente abuso de poder, além de nos solidarizamos com a menina e com a mãe, exigimos punição dessa Juíza e dos que, integrantes do sistema de justiça, violaram o direito legal de interrupção da gravidez e desejada pela menina e pela mãe! Também exigimos uma revisão dos protocolos dos serviços de aborto legal quando estão em desacordo com a norma legal e sua atualização para a garantia de direitos assegurados a todas.

Até porque não cabe ao Judiciário negar direito assegurado em lei.

São Paulo, 21 de junho de 2022

`